POR Maria Luiza Piccoli
Já diz o ditado: não é dos mortos que se deve ter medo, e sim dos vivos. Ainda mais nas adjacências do Cemitério Municipal do Água Verde, em Curitiba. A quadra arborizada de 97.827 metros quadrados parece tranquila à primeira vista. Dos portões do cemitério para dentro, 82.946 sepultados descansam sob jazigos e mausoléus bem preservados. Dos muros para fora, floriculturas, bancas de revistas e uma pista de corrida de 1,5 mil metros na qual moradores do bairro praticam exercícios e passeiam. O cenário seria ideal, não fosse pela falta de segurança na região.
Há quase dois anos sem policiamento, comerciantes e moradores das cercanias do cemitério têm sofrido com a ação de bandidos que se aproveitam da movimentação no local para praticar roubos e furtos, em plena luz do dia. Mulheres desacompanhadas e idosos são os alvos prediletos dos criminosos, e nos últimos meses, nem mesmo quem “já se foi” tem sido poupado. “Os bandidos violam os túmulos para roubar peças de bronze, crucifixos, potes de barro. É um desrespeito com as famílias e com a memória dos falecidos”, afirma o presidente do Conseg Água Verde, Mauro Callegari.
Quem busca as capelas do cemitério para rezar ou prestar homenagens aos finados também sofre com a violência. Segundo Mauro, os assaltos acontecem a qualquer momento, às vezes em plena luz do dia, e o cemitério é usado – principalmente no período noturno – como rota de fuga ou esconderijo para os bandidos.
Cansados da falta de segurança, lojistas evitam falar. A situação chegou ao limite quando, há cerca de um mês, três estabelecimentos comerciais foram invadidos e furtados no mesmo dia. A vendedora Sueli Godoy, 50, trabalha há dez anos em uma banca de revistas localizada na parte externa do cemitério. Na manhã do dia 5 de agosto – um sábado – ela levou um susto ao chegar ao trabalho. “Quando abri a porta estava tudo revirado. Eles entraram pela janela e derrubaram as prateleiras, reviraram as gavetas, fizeram uma bagunça. Levaram dinheiro do caixa e alguns produtos. A sensação de medo foi horrível”, lembra.
O mesmo aconteceu com a floricultura ao lado, que teve a porta arrombada e os vidros quebrados na mesma manhã. Diante da insegurança, a saída encontrada pelos lojistas do perímetro foi unir forças para se proteger. “Quase todo mundo que trabalha por aqui é mulher, e a gente se sente vulnerável. O jeito foi combinar os horários de chegada e saída do trabalho. Assim estamos sempre acompanhadas e nos sentimos um pouco mais protegidas. O pior é levar esses sustos e ver que nada tem sido feito. A sensação é de total abandono por parte das autoridades”, explica a florista Maria Regina Bedin, 50.
Módulo vira mocó
De acordo com o consultor de segurança pública do Conseg Água Verde, Paulo Roberto Goldbaum Santos, nem sempre foi assim. Durante quinze anos um módulo fixo da Polícia Militar fazia a segurança de toda a região do cemitério. O ponto, que ficava na esquina das ruas Bento Viana e Avenida Água Verde, foi desativado após a instalação de um módulo da Guarda Municipal na parte interna do cemitério. “Depois que a Guarda Municipal entrou, a Polícia Militar retirou o contingente daqui porque julgou desnecessário manter o módulo. O problema é que a Guarda Municipal também suspendeu o policiamento. Com isso, a região ficou abandonada e os bandidos se aproveitaram disso”, afirma.
Abandonada, a unidade policial que antes garantia a tranquilidade da população, ainda está lá, mas agora serve como dormitório para moradores de rua e ponto de encontro para usuários de drogas. Quem frequenta o comércio vizinho, seja a pé ou de carro, se sente ameaçado com as constantes abordagens de flanelinhas e pedintes. De acordo com Paulo Roberto, o número mensal de ocorrências registradas na região passou de cem nos últimos quatro meses.
Preocupados com tanta violência, os diretores do Conseg realizaram uma assembleia com moradores no último dia 15 de setembro. Um ofício foi encaminhado à Guarda Municipal, junto com um abaixo-assinado direcionado ao secretário da defesa social e trânsito, Guilherme Rangel. No pedido, a solicitação urgente por policiamento, e a reativação do módulo de segurança, o mais breve o possível.
A resposta veio, porém como medida paliativa. “Um módulo móvel da Guarda Municipal começou a operar na semana passada, mas só por um período do dia. A previsão é de que eles fiquem aqui só por dez dias. Depois disso, tudo vai voltar como estava. Ajudou, mas não resolveu nosso problema”, afirma Paulo Roberto.
Rondas e unidades móveis
Por meio de nota, a Guarda Municipal informa que, além do módulo móvel, rondas têm sido realizadas nos arredores do Cemitério Municipal do Água Verde. A GM também diz que há presença de efetivo noturno no local. No entanto, de acordo com o presidente do Conseg, apenas um guarda permanece no cemitério durante a noite – o que não tem sido suficiente para garantir a segurança. “Seria necessário integrar os trabalhos da Guarda Municipal e da Polícia Militar, com mais policiamento. Além da instalação de câmeras de monitoramento, para uma vigia efetiva dos criminosos que atuam no perímetro”, ressalta.
Também em nota, a PM cita que o Comando do 12º Batalhão (unidade responsável pela região) tem realizado o policiamento comunitário feito semanalmente no bairro, juntamente com as equipes de motos da 5ª Companhia da Rondas Ostensivas Tático Móvel (Rotam), e da Rondas Ostensivas Com Apoio de Motocicletas (Rocam) – que patrulham e fazem abordagens preventivas a fim de coibir crimes como furtos e roubos na área diariamente.
Segundo a PM, as atividades foram reforçadas recentemente com a aquisição de novas viaturas e os policiais têm participado das reuniões do Conseg do bairro para saber as demandas da comunidade e atuar da melhor maneira possível. Sobre a modalidade atual de policiamento, a corporação alega que também escolheu a unidade móvel pois “estes equipamentos possibilitam policiamento em mais ruas, e outras alternativas, se comparadas ao módulo fixo”.