Você já parou para pensar como ou quando surgiu o forno a lenha? Bem, como toda e qualquer “engenhoca”, veio da necessidade e da evolução da alimentação. Os métodos e processos de assar os alimentos no forno aquecido com toras de madeira, incialmente usados para preparar pães, datam de, pelo menos, 3.000 anos antes de Cristo, com registro iniciais na região da Mesopotâmia.
“Esses fornos já tinham o tradicional formato de ânfora. Apesar de terem sido aprimorados ao longo dos últimos cinco mil anos, desempenham a mesma função: fornecer calor intenso e seco para assar”, explica Bee Wilson, autor do livro Pense no Garfo! Uma história da cozinha e de como comemos.
A versão comunitária do forno a lenha recebe esse nome justamente por ter o caráter de partilha, muito comum, especialmente, em tempos de vacas magras. No Alentejo, como em outras tantas regiões de Portugal e do mundo, era comum o aproveitamento máximo do calor produzido pelo do equipamento para preparar o a maior quantidade de refeições possível.
Então, quando o fogo era aceso, várias famílias que viviam próximas aproveitavam o calor para fazer de pães a preparos de proteína, como cabritos. E isso que nem se falava, lá atrás, do conceito de sustentabilidade, tão em voga nos dias atuais. Quer coisa mais sustentável?
Inspirado pelo caráter emblemático do forno a lenha, wine hotel Torre de Palma criou o projeto Casa do Forno, que reúne chefs sob o espírito comunitário para fazer almoços com aquele toque defumado que só um autêntico forno a lenha pode dar. Com pitadas de chefs com estrelas Michelin, os preparos ganharam nuances ainda mais especiais.
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O Viagem Gastronômica testemunhou, diretamente de Monforte, em Portugal, o corre-corre ao redor do grande astro do dia, pelas mãos habilidosas do trio Miguel Laffan, o chef titular da casa e que conquistou a primeira estrela Michelin do Alentejo na sua antiga casa, o L`And, Alexandre Silva (restaurantes Loco – uma estrela Michelin – e Fogo, de Lisboa) e André Ribeiro (restaurante Callum, em Castelo Branco).
Alexandre Silva revelou que, pasme, são necessários três dias para deixar o forno a lenha comunitário na temperatura ideal.
“Esse forno com séculos de história era usado para alimentar aldeias inteiras e, por sua grande dimensão, é preciso muito tempo para deixá-lo na temperatura ideal”.
Chef Alexandre Silva
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De acordo com o chef, o processo de aquecimento começa com um tipo de madeira mais comum, como o eucalipto, que faz o trabalho de aquecimento inicial do tijolo que reveste o forno. “Depois, entramos com madeiras mais aromáticas e de queima mais lenta, como a azinheira, que também solta um aroma especial, assim como a esteva, que também entra no processo”, explica. A esteva, cabe explicar, é uma planta rasteira de onde se extraí o adoçante natural estévia, bastante consumido em dietas.
O anfitrião da celebração em torno do forno a lenha, Miguel Laffan, revela que o equipamento é super versátil. Antigamente, por exemplo, o forno comunitário era usado para assar o pão que durava uma semana e alimentava dezenas de pessoas.
“Em regra geral, o forno a lenha é ideal para preparos de cozedura lenta e que requerem uma camada mais crocante. É o caso do cabrito, do borrego ou do peixe”.
Chef Miguel Laffan
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O cabrito, aliás, foi uma das atrações do menu servido no almoço da quinta edição da Casa do Forno do Torre de Palma, apresentado com arroz de miúdos e couves da região com broa de milho, sob a batuta do chef André Ribeiro. “O aroma exalado pela queima da madeira no forno a lenha dá um toque especial à carne e potencializa o sabor da marinada, que é feita com 24 horas de antecedência e leva vinho e ervas”, ensina.
Para Ribeiro, o preparo no forno comunitário tem enorme significado, que vai muito além da simples questão técnica de preparação de alimentos.
“Na terra onde morava, o forno a lenha era mesmo um ritual. As pessoas se reuniam em torno dele para partilhar comida e histórias”.
Chef André Ribeiro
Para comprovar a versatilidade e potencial do forno a lenha comunitário, o menu servido na Casa do Forno começou com sopa de peixe de Setúbal (na divisa com o Alentejo) cozido a lenha, por Miguel Laffan. Depois, dois preparos de Alexandre Silva: steak tartare (tártaro, para os portugueses) de carne com tutano servido no osso e feijoada de sames (nadadeiras) de bacalhau.
Na sequência, cabrito com arroz de miúdos e couves da aldeia com broa de milho. Para fechar, pera rocha (um produto de Indicação Geográfica de Portugal) em calda de especiarias com nougat de pinhão (sim, há pinhão em terras lusitanas!) e sorvete de lichia, preparado por Márcia Dias.
Na harmonização, foram servidos vinhos produzidos na propriedade: Torre de Palma Magnum Arinto-Alvarinho 2021, Torre de Palma Magnum Blend Branco 2019, Torre de Palma Magnum Blend Tinto 2020 e Torre de Palma Late Harvest 2020.
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