Do brega ao chic

DivulgaçãoGostar de música é fácil, mas admitir que gosta de música brega é coisa que poucos se arriscam. Só mesmo sendo muito eclético – ou muito desencanado – para misturar jazz, clássico, MPB e brega numa mesma discoteca e, sem pudor, alternar esses estilos numa noite de reunião com amigos.

E é exatamente isso que faz o paulista Antonio Carlos Cabrera. O ex-DJ, psicólogo, webdesigner e pesquisador de desenhos e séries antigas revirou os sebos atrás de LPs e histórias da música brasileira. Encontrou um filão bem popular, pouco explorado e com tantas histórias curiosas que fez um livro: o Almanaque da música brega (Matrix Editora, R$ 29,00).

Na hora da divulgação veio a maior surpresa. ?Você não imagina quanta gente gosta desse estilo fora das classes D e E. No Pânico (programa de rádio), depois de duas horas de conversa e músicas, eles pediram pra ficar com o CD?, orgulha-se Cabrera.

No programa, antes mesmo do autor oferecer, o apresentador já estava pedindo uma. ?Vamos ouvir Barros de Alencar….eu gosto!!… vocês podem rir?, disparou Emílio, surpreendendo todos.

Cabrera nem estranhou. Segundo ele, até os mais preconceituosos estão se rendendo. ?O termo brega deixou de ser pejorativo para virar uma espécie de subgênero de todos os ritmos. Hoje tem samba brega, rock brega, funk brega, techno brega. E o que era brega nos anos 70 e 80, voltou e é cult?, analisa o pesquisador.

Ele exemplifica com o sucesso recente de Caetano cantando a música Sozinho, de Peninha. E a tese dele é que esse fenômeno é mundial. ?Cada país tem os seus bregas que depois de um tempo viram cults. Olha só o John Travolta, nos Estados Unidos?, provoca.

Pensando assim dá pra imaginar que a Banda Calypso terá vida longa. ?Eles misturam influência da Jovem Guarda e de músicas latinas. O Calypso é tipicamente brega e o público gosta.?

E como diz Odair José no prefácio do Almanaque: ?Qualidade se discute, gosto não?.

Mono

Luis Roberto Gambine Moreira precisou de laudo médico e cirurgia na Inglaterra para ganhar fama. Como Roberta Close posou para revistas e gravou um disco em 1988. Pouca gente se interessou pela música. A história do transsexual era muito melhor.


Possante

Almir Rogério passou dois anos tentando emplacar um sucesso que só apareceu em 1980 com Fuscão Preto (Me disseram que ela foi vista com outro/num fuscão preto na cidade a rodar…). Virou até filme, em 1983, com Xuxa no elenco e deu início a uma saga rodoviária. Depois de Fuscão, Almir gravou Motoqueiro e Charrete Azul.


Quem te viu…

Em 1989 esse era o visual de Alexandre Pires, que estreava como cantor do grupo Só Pra Contrariar (Toda vez que eu chego em casa/a barata da vizinha tá na minha cama…). O sucesso mudou seu estilo. Ele deixou Minas Gerais para morar em Miami, canta só e sempre de cabelo bem curto e terno de grife.

Quem te vê

Os comerciais de tevê descobriram Sidney Magal em 2005 e ele voltou com força total. Regravou Sandra Rosa Madalena, que lhe valeu o apelido de cigano, e virou celebridade cult. Está na Caras mostrando a casa na Bahia, falando de amor, filhos e música.



Ave Maria

Agnaldo Rayol já perdeu a conta de quantas vezes cantou em cerimônias religiosas. Começou aos 13 anos, na escola em Natal (RN), e hoje, com 50 anos de carreira, virou um dos poucos especialistas no gênero. Contratos para cantar em casamento nunca faltam, mas na próxima missa ele vai de graça. No dia 11 de maio, em São Paulo, Rayol interpretará Ave Maria de Gounod na missa que o papa Bento XVI celebrará. Católico fervoroso, Agnaldo se sentiu honrado com o convite que atesta sua imensa popularidade.

Sua excelência

O ?cãozinho dos teclados? – agora sua excelência, o deputado Frank Aguiar (PTB-SP) – deixou mesmo pra trás o passado humilde no Piauí. Seu novo show, dia 25 em Brasília, é para um público bem de vida: seus novos colegas, os políticos. O preço dos ingressos, de R$ 200 a R$ 2.000 (mesa), está na propaganda que Aguiar mandou para os 513 deputados e 35 ministros. Para Lula ele mandou dois convites, que se forem aceitos podem virar notícia. É que o presidente do PTB, Roberto Jefferson (RJ), já comprou seu ingresso. Se Lula aceitar os ingressos gratis, poderá se encontrar com Jefferson – o primeiro desde que o petebista denunciou o escândalo do mensalão.

Atores também caem na tentação

Segundo Odair José, um dos mais bem sucedidos músicos desse estilo, o compositor brega é um cronista do simples e é essa característica que permite a identificação com o público. Já o autor do Almanaque, o psicólogo e editor do site mofolândia, Antônio Cabrera, diz que o brega é popular e todo artista quer ser popular, por isso não é incomum ver gente do rock, da MPB, do samba e até de outras áreas artísticas caindo nessa tentação.

Caetano Veloso, Fafá de Belém, Gal Costa, Kid Abelha, Paulo Ricardo, Sandy e Junior e Roberto Carlos já apareceram ?flertando? com a música brega. Caetano, ao lado de Odair José, participou do festival Phono 73, interpretando junto com ele a música Vou tirar você deste lugar (… eu vou tirar você deste lugar / eu vou levar você para ficar comigo / e não me interessa / o que os outros vão pensar…).

O público não perdoou e a dupla saiu do palco sob vaias.

Atores também caem nessa tentação. Que o diga Francisco Cuoco, Myrian Rios, Mario Gomes e Maurício Mattar. Eles também não escaparam do fracasso de público e crítica. Não tocam nem em festa trash e seus poucos discos são raridades de sebos.

Almanaque do brega

Se você acha que Absyntho é nome de bebida alcoólica, Melindrosa é fantasia de Carnaval, Angra é parte do Rio de Janeiro, Banana Split um sorvete, Baby Face um mafioso italiano, e nem desconfia quem é Uday Veloso, Clemilda ou Frankislene Freitas, precisa de ajuda especializada em música bem popular.

E ela vem em forma de um livro divertidíssimo: o Almanaque da Música Brega (Matrix Editora, R$ 29,00), do psicólogo e editor do site mofolândia, Antônio Carlos Cabrera. Ele, que adora séries e desenhos antigos, se debruçou sobre esse estilo musical que todo mundo reconhece e ninguém gosta de dizer que ouve.

?Brega é o simples. Aquela música de rima fácil e refrão que gruda na cabeça?, define o autor. Segundo Cabrera, o Brasil tem exemplos de sobra desse gênero: de Odair José a Sandy e Junior, de Benito de Paula (que na verdade é Uday Veloso), Nahim (ou Baby Face, no início da carreira), Clemilda (seu delegado prenda o Tadeu/ele pegou a minha irmã e ó…) e Miss Lene (porque Frankislene não combinava com o som de discoteca que ela cantava), a atualíssima Banda Calypso.

No livro a pesquisa é dividida por cantores, em ordem alfabética e com história e discografia deles. Nas primeiras páginas aparece o grupo Absyntho, que lançou em 1983 aquele sucesso que toca nas festas trash e faz todo mundo se divertir: Meu Ursinho Blau Blau. E mais: que o pobre cantor -Sylvinho – nunca conseguiu se recuperar do sucesso. Até rasgou um urso de pelúcia junto com o roqueiro Sergei no palco do Rock in Rio 3 na tentativa de se livrar dele. Hoje, resignado, ele incorporou o apelido Blau Blau ao nome e faz shows pelo Brasil, tendo a música como carro-chefe.

Gretchen e Sula Miranda cantando cantigas de roda em ritmo disco. Foi na década de 70 que as irmãs apareceram no melhor estilo ?dancin days? – de meias brilhosas, sandálias e saia de franja no joelho – na capa do LP As Melindrosas. Elas se separaram, mas o estilo popular permaneceu.

Sula virou cantora sertaneja e Gretchen apareceu com sucessos rebolativos que Angra, em 1982, tentou imitar, mas não passou de um compacto. Ninguém sabe ao certo o motivo: se a rejeição do público ou o ciúme do marido. Angra era esposa de Amado Batista (no hospital/na sala de cirurgia/pela vidraça eu via/ você sofrendo a sorrir…).

As Melindrosas serviram de inspiração para que Gugu Liberato lançasse o Banana Split, um grupo de misses (Rio, Santa Catarina e São Paulo) cantantes que também dançavam. O ano era 1990 e lambada era o ritmo do verão. Foi nesse grupo que surgiu Eliana – ela substituiu a miss catarinense e virou apresentadora de tevê.

Uma trajetória impressionante para quem nasceu numa família humilde – o pai dela era zelador -, mas comum a muitos ídolos bregas que começaram a aparecer na década de 70 nos programas Sílvio Santos, Chacrinha e Bolinha.

Vida difícil

O maior sucesso do cantor e compositor gaúcho Victor Mateus Teixeira – o Teixeirinha – é Coração de Luto, que vendeu mais de 1 milhão de cópias. É a história da perda da mãe aos nove anos, queimada. O Almanaque mostra que a história é verídica. Teixeirinha tinha nove anos quando sua mãe teve um ataque epilético e caiu sobre uma fogueira.

Evaldo Braga nunca conheceu os pais e foi abandonado no lixo pela mãe prostituta. Fez sucesso com a música Sorria (… sorria, meu bem, sorria…). Sofria de depressão e morreu aos 25 anos, em um acidente de automóvel, em 1973.

Waldick Soriano (eu não sou cachorro não…) foi lavrador, peão de boiadeiro, garimpeiro e motorista na Bahia. Foi para São Paulo ser cantor, mas só conseguiu emprego de engraxate e durante dez anos insistiu até gravar a música que virou sucesso.

Wanderley Alves dos Reis, o Wando, foi feirante e ajudante de caminhoneiro. Odair José dormiu na rua e trabalhou em inferninhos no Rio de Janeiro antes de cair nas graças do público. Especializou-se em narrar as mazelas dos desafortunados e ganhou o apelido de ?terror das empregadas domésticas? por se engajar na luta delas pela regulamentação da profissão.

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