Infiltrados

Fiquei feliz por reencontrar Fabrício. Fiquei feliz por ele estar vivo.

Seu acidente havia acontecido há meses e agora ele entrava, todo esbaforido, com sua cadeira de rodas no consultório. As sequelas eram graves, mas isso não o impediu de sair de casa com o seu melhor sorriso.

Eu estava de plantão na noite do acidente, quando um carro atravessou a preferencial sem sequer reduzir, acertando com tudo a sua motocicleta. Na chegada ao pronto-socorro, um dos bombeiros compartilhou conosco algo surpreendente. Ao conversar com o motorista infrator, ele descobriu que o cara não tinha a menor ideia do que seria uma placa de preferencial.

Graças a criminosos como ele, Fabrício agora era paciente vitalício da ortopedia, neurologia, cirurgia, urologia, psicologia e fisioterapia.
É lamentável, mas nossas ruas estão repletas de condutores sem carteira de habilitação. Como verdadeiros analfabetos da linguagem do trânsito, eles circulam infiltrados pela cidade, se somando a bêbados e apressadinhos para engrossar a completa insegurança de todos.

Segundo um levantamento realizado pelo projeto Vida no Trânsito, dez por cento das mortes nas ruas de Curitiba são provocados por ’desabilitados’. Estima-se, claro, que eles participem de muitas outras barbaridades ao volante.

Olho para Fabrício e sinto um desgosto. Todos os dias, cerca de 1.600 brasileiros recebem o mesmo diagnóstico: invalidez permanente.
Mas tenho certeza, um dia a gente aprende.

Nem que precise se matricular em alguma autoescola.