Eduarda e Eduardo

Era o fim de uma semana em que tudo chegaria ao fim.

Felizmente o fim.

Eduarda estava cansada de tantas brigas, de tanto ciúme besta e agressividade. Eduardo, ao contrário, simplesmente não cogitava qualquer possibilidade de separação.

Era noite de sábado e as pessoas próximas ao casal sabiam que aquilo não tinha como acabar bem.
Finalmente o fim.

Após mais uma tentativa de reconciliação seguida por mais uma violenta discussão, Eduardo subiu aturdido em sua moto de 1.250 cilindradas…

(E aqui vai um parênteses de quem vos escreve para uma pergunta infantil: como diabos é possível a circulação de um veículo com a potência de propulsão de um míssil, dentro de uma cidade e fora de um autódromo?)

… acelerando a 190 km/h na inacabável Rua João Bettega.

Sim, ele estava convencido que já tivera provado sofrimento suficiente desta vida. Seu coração estava dilacerado. Sem Eduarda não havia mais direção ou sentido.

Resumindo o boletim de ocorrência, Eduardo achou que conseguiria atravessar a barreira do som, desmaterializar-se ou qualquer coisa assim.

Tudo, claro, em nome do amor.

Infelizmente a cena final não foi tão romântica.

Na verdade, ele subitamente perdeu o controle do seu foguete e, ao invés de ir pra lua, acabou sofrendo uma queda impressionante, sendo prensado e arrastado por quase 50 metros pela própria moto de 300 quilos.

Não me pergunte como ele chegou vivo aqui no hospital, nem como ele sobreviveu. Sei apenas que durante várias semanas ele lutou para salvar seu braço esquerdo, todo esmigalhado e moído pelas ferragens da moto. No final das contas, a amputação cirúrgica era inevitável.

Na correria da emergência, a gente até esquece como são comuns as tragédias provocadas pelo amor incondicional e pela falta total de amor próprio.

Como diriam os neurologistas, a pior parte do cérebro é o coração.

Hoje Eduarda está feliz sem Eduardo.

Eduardo não. Ele sente falta do seu braço.