Tudo parecia bonito e promissor naquelas manhãs de domingo

Eu acordei num domingo com a sensação de ter feito muitas descobertas nas manhãs de domingo. Algumas nocivas, como fumar escondido da família com apenas treze anos. Eu levantava cedo, ia para a missa, depois para o Bar Cinelândia que vendia cigarros sem perguntar a idade de quem comprava, ainda que fosse, como eu, criança. Mas eu não era o único. Naquele tempo quase todo mundo fumava e achava natural. Claro, não fumava todos os dias, sempre nas manhãs de domingo e depois distribuía os cigarros para os amigos para não ser flagrado em casa com o maço e punido.

Com dezesseis anos, ia ao bar do clube do bairro comprar cigarros importados. Havia sempre um limite a ser rompido. Por isso fumei cachimbo e depois charuto no chamado rito de passagem para a adolescência até que enjoei e como era natural descobri o chope. Havia festas de chope. Eu também ia à missa com o coração em chamas para ver garotas bonitas, acompanhadas de suas mães. Nas manhãs de domingo elas colocavam saias escocesas, camisas brancas e eram mais bonitas que nos dias de semana quando usavam uniformes de colegiais. Aprendi a gostar de futebol primeiro olhando partidas nas manhãs de domingo e depois jogando, quando ficou evidente que eu não era craque.

As matinés também eram nas manhãs de domingo, assim como o ritual de trocar gibis diante do cinema. Comprei livros de bolso na Banca do Massao nas manhãs de domingo e depois detonei protetores do limpador do para-brisa dos Fuscas para fazer brucutus. Andei pelas ruas do bairro embalado por “Silence is Golden”, de 1967, assim como “Sunday Morning”. Não tinha nada nos bolsos e nas mãos, apenas sonhos na cabeça. E tinha a esperança de encontrar uma bela garota. Como eram estimulantes as garotas daquelas manhãs de domingo.

Acho que as últimas belas manhãs de domingo aconteceram em Curitiba, quando me mudei e apreciei ir à Feira do Largo, onde encontrava amigos, muitos dos quais hoje mortos. Eu acho que uma das formas de a gente perceber que envelheceu é chegar às manhãs de domingo sem a ansiedade de descobrir algo novo que preencha a nossa vida com uma luz, uma cor ou odor agradável. No entanto há este consolo de ter colecionado tantas belas manhãs de domingo que não deixa de ser um exercício prazeroso recordá-las. 

“Sunday morning” é uma música da banda The Velvet Underground com a cantora alemã Nico, composta por Lou Reed e John Cale em 1967. É uma bela música. Se quiser conferir, basta acessar o link abaixo.