O Carnaval acabou. Divulgamos para o mundo a imagem de povo alegre, bonito, afetuoso e cantante. Eu acho o Carnaval uma histeria turística com fins meramente monetários. O povo divertia-se mais nos carnavais de antanho, quando a festa era em clubes e não uma demonstração de luxuria visual, ostentação, num país cheio de problemas que não consegue resolver. A cada dia os problemas aumentam. Agora que a gandaia acabou e o ano real começa, seria bom refletir sobre os problemas crônicos do país. E não me refiro ao da Petrobrás, resultado de corrupção crônica. Que por sua vez resulta de péssima educação: pessoas realmente cultas e educadas são ou deveriam ser imunes à corrupção. E não se envolverem em suas variadas ramificações como o nepotismo e a busca desesperada por sinecuras.

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Há muitos problemas no Brasil. A mobilidade urbana, a péssima administração dos recursos hídricos, a violência no trânsito, a questão ambiental, dos índios, da terra, sem contar, claro, a educação a cada ano sucateada e desdenhada. Inclusive em nosso estado. E tem mais. Muito mais. Eu li um artigo enviado por Luiz Flávio Gomes, professor e jurista, que aponta o contraste entre o que aconteceu há dias em Nova York e o que acontece sempre no Brasil. A populosa cidade norte-americana de 10 milhões de habitantes acumulou dia 12 saldo de dez dias sem assassinatos. Nova York era violenta nos anos 90, com índices altos de criminalidade e homicídios. E chegou a este registro que pode ser considerado histórico: dez dias sem ninguém matar o outro num universo de 10 milhões de pessoas. E não é caso isolado: durante o ano de 2014 a cidade registrou 328 homicídios, ou seja, menos de um por dia, contra um total de 2.245 em 1990. O que isto tem a ver com o Brasil? Tudo.

O mesmo professor informa que no Brasil mata-se uma pessoa a cada 10 minutos. E por ano registra-se 57 mil assassinatos. Isto, claro, sem contar os muitos casos de mortes que ocorreram e que não tiveram causas definidas e que podem se tratar de assassinatos. Então o patamar eleva-se muito mais. O Brasil está em 12o lugar entre os países com esta anormalidade social – 29 mortes para cada grupo de 100 mil pessoas. E ainda registramos um recorde vergonhoso: colocamos 19 cidades no ranking mundial das 50 que mais assassinam em todo o planeta. Uma cidade como São Paulo que registra um dos mais baixos índices de assassinatos no Brasil (10 para cada grupo de 100 mil pessoas) está bem abaixo de Nova York (3 mortos para cada grupo de 100 mil pessoas).

O quadro fica ainda mais vergonhoso se compararmos Nova York, que dá show em São Paulo, cidade em que se mata relativamente menos que outras brasileiras, com os índices nos países escandinavos, como Dinamarca, Suécia, Noruega, Finlândia e Islândia. Lá registra apenas uma morte em cada grupo de 100 mil pessoas. A carnificina que produzimos todos os anos em nossas cidades deve nos apresentar diante dos escandinavos como um bando de bárbaros ensandecidos, sanguinários e criminosos, que mata por bobagem, por criminalidade e outros motivos civilizadamente inaceitáveis, alguns banais e outros ilegais. Mas é o que acontece na realidade. Somos isto.

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E por que ocorre isto? O professor diz que o Brasil ignora o sistema que dá certo nos países escandinavos, onde se dá prioridade à prevenção primária (excelentes condições socioeconômicas e boa educação, uma sociedade mais equilibrada), sem descuidar da secundária (obstáculos para ocorrência do crime) e lá também se investe na certeza de que os criminosos serão punidos. Os Estados Unidos investem na secundária e o Brasil nem liga para a terciária que consiste na ressocialização do preso. Não temos nada. O Brasil não tem política de prevenção ao crime, aplicamos a política reativa (depois do crime vamos ver como é que fica) e não a preventiva. Pior, uma política reativa que não funciona. Com baixo índice de certeza de castigo. Aí, meu amigo, a impunidade corre solta: quem vai cometer um homicídio sabe que em 98% dos casos vai sair livre. O sistema não funciona e quem tem dinheiro dá as cartas e faz o jogo.