O nome do sujeito era Damião. O nome da moça era Iolanda. E o nome do Macaco era Cambalache. Damião trabalhava no posto de gasolina Bandeira 2 que tinha lanchonete de conveniência chamada Feijão com Arroz. Como a lanchonete não servia almoço, as pessoas achavam que o nome foi escolhido para rimar com o nome do posto. Uma propaganda subliminar. Dois rima com arroz. Iolanda frequentava a lanchonete com os amigos. E os amigos de Damião perceberam que o sujeito estava caído de paixão por ela. Para zoar dele, disseram: “Você não vai conseguir nada com a garota. Ela é bonita e você é feio”. Era verdade. Mas é o tipo de comentário que embora seja correto, magoa. Ser feio não é ruim. Mas quando a feiura interfere nas conquistas amorosas, o bicho pega.

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E mágoa é combustível de revolta. Um amigo disse que toda desgraça da Segunda Guerra Mundial aconteceu porque Adolf Hitler tinha apenas um testículo e não fazia direito o que os outros pelo menos faziam, ainda que mais ou menos. Se aquilo não ficava ereto, ele esticou o braço. Foi assim que nasceu a saudação nazista: na cabeça de Hitler, alguma coisa tinha que ficar ereta no corpo dele para o povo ver. E foi o braço. Damião estava magoado. Ele queria se vingar e achava que esticar o braço ao lado da bomba no posto de gasolina ia dar em nada. Ele ainda não estava na fase do rancor. Mas entrou nela no dia em que viu Iolanda chegar à lanchonete com um macaco no ombro. Se fosse um iguana, tudo bem. Ou pelo menos, uma calopsita cantante. Um papagaio dava para tolerar. Mas um macaco soou provocação para Damião. Que era feio feito um bugio.

O macaco não se apresentou, mas Damião descobriu que seu nome era Cambalache. O macaco alheio ao drama em que sem querer se meteu, ficava com aquela cara de safado desconfiado. A galera de Iolanda adorou Cambalache. E fez festa. Os amigos de Damião trataram de envenenar um espírito já intumescido de ódio e rancor. Porfírio Rubirossa, nanico abusado que trocava o óleo, disse: “Damião, você está perdendo a parada para um macaco? Isto é ridículo”. Foi naquele momento que Damião cogitou pela primeira vez em matar o macaco, já que não podia matar Iolanda e acabar com a humanidade. Ele rangeu os dentes e disse: “Alguém tem que morrer!” Este alguém, claro, era o macaco Cambalache, que não tinha nada a ver com a história e só tentava se equilibrar no ombro de Iolanda enquanto ela andava.

Numa tarde especialmente quente como as tardes deste janeiro, Iolanda deixou a sua motocicleta na calçada e foi para a lanchonete Feijão com Arroz, conversar com os amigos. Cambalache estava assustado em seus ombros, tentando se equilibrar. Damião murmurou: “É hoje que eu faço burrada. Eu me vingo deste macaco”. Ele pegou um machado e o deixou próximo de uma bomba de gasolina. Algum tempo depois, quando Iolanda deixou a companhia dos amigos na lanchonete, com o macaco em seu ombro, e se encaminhava para a sua motocicleta, Damião correu até ela com o machado, desferiu um golpe no macaco que estava no ombro da garota. No entanto, quando ele vibrou o machado, acertou o corpo do macaco, que caiu na calçada – mas também o pescoço de Iolanda que caiu no outro lado.

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Foi um rebuliço. O macaco caiu morto. Iolanda ficou gravemente ferida. Damião, quando viu a garota imóvel, quis sair correndo. O nanico Porfirio Rubirossa foi mais rápido e colocou a perna na frente do homicida e ele se esborrachou na calçada e foi dominado. Um sujeito levou Iolanda de carro para o hospital, aonde chegou sem vida. O macaco foi enterrado num terreno baldio, depois de uma autoridade sanitária assinar o competente atestado de óbito. Quanto a Damião, ficou louco. Está agora num manicômio onde não diz palavra sensata e fica com os olhos eternamente vidrados como eles estivessem contemplando as lavas do vulcão que devoraram o seu espírito e deixaram o seu corpo vazio. Uma alma destruída pelo ciúme de um macaco. Ou, talvez, pelo amor não correspondido de Iolanda. Quem me contou esta história foi uma amiga lésbica chamada Verona