Ele brigava com atores, tinha temperamento forte e ditatorial e deixava estúdios em crise de nervos porque estourava orçamento e fazia filmes para durar nove horas – quase sempre o demitiam na metade, quando tinha rodado o dobro disso. Erich Stroheim era doidão. Até na aparência.

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O pai, fabricante de chapéus em Viena, capital do império Austro-Húngaro, era judeu praticante assim como a mãe. Stroheim virou católico. Com 24 anos, em 1909, foi para os Estados Unidos onde se apresentou como o Conde Erich Oswald Hans Carl Maria Von Stroheim und Nordenwall. Não demorou a descobrirem que era plebeu metido a besta.

Mas era esperto e apareceu em Hollywood. Trabalhou com D. W. Griffith. E foi o primeiro diretor a estourar a barreira de um milhão de dólares numa produção, maior parte consumida em cenários destruídos por tempestade. “Esposas ingênuas”, de 1922, foi um choque porque chutou o romantismo e apresentou um conde amoral que seduz mulheres ricas para aplicar golpes financeiros e fazer chantagens.

Esta talvez a principal contribuição de Stroheim. Ele quebrou a vidraça. Em “Coração da Humanidade”, de 1918, o personagem interpretado por ele, Mr. Stowell, estupra a enfermeira da Cruz Vermelha vivida por Dorothy Phillips. Durante a cena, ele arranca os botões  do uniforme da moça com os dentes e quando o choro de um bebê no quarto o perturba, ele o atira furiosamente pela janela.

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Stroheim era obcecado pelas relações matrimoniais, enfatizando o lado sexual e social dos personagens em seus filmes. Ele desconfiava do maniqueísmo mocinho e bandido e enfiava o dedo na alma humana, em sua natureza perversa, amoral e cínica, recheada com forte dose de erotismo e sensualidade. O cinema era arma para criticar a sociedade de seu tempo que julgava decadente.

Recorria a amantes corcundas e a príncipes decadentes, intimados a casarem com burguesas ricas. Uma delas, além de feia, era aleijada de uma perna. O príncipe prefere uma pobretona bonitinha que sofre tentativa de estupro num açougue. No último filme que ia dirigir, produção da atriz Gloria Swanson, a sinopse é de arrepiar: jovem freira é seduzida por aristocrata de casamento marcado com rainha. Ela é expulsa do país e vai para a África onde vira dona de bordel.

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Os estúdios achavam Stroheim genial, mas pararam de dar filmes para ele, para não perder dinheiro. Para sobreviver, ele virou ator. Talvez tenha sido sempre. Pelo menos atuou ao lado de uma diva eterna, Greta Garbo. Não é para qualquer um. E foi passar seus últimos dias na França onde era considerado um gênio.