O pai de Mandioca fugiu com a mãe da Margarida

Mandioca era um vacilão. Mas vacilão diferente, porque botava os outros em fria e escapava. Era o vacilão-agulha, adaptação do malandro-agulha, que se julga esperto e só se ferra. O primeiro não era esperto, mas ferrava com os amigos. E assim, botando os outros em fria, Mandioca foi levando a vida. Quando a batata quente caía na sua mão, o seu pai, o Sr. Genoviano, quebrava o galho do filho, a pedido da mãe, a Dona Olímpia. E Mandioca foi crescendo vacilão até conhecer Margarida. Os pais da moça, Sr. Juracy e Dona Modesta foram contra o casamento. Mas mudaram de ideia quando Mandioca engravidou Margarida e a filha ficou em casa com a barriga enorme. Os pais da moça se apavoraram e os pais de Mandioca, mais uma vez, quebraram o galho: pagaram o casamento e ainda construíram puxado no fundo do terreno no Boa Vista, com quarto, sala, cozinha e banheiro.

Aí ficou maneiro. Mandioca continuou levando a vida sem responsabilidade. Trabalhou em supermercado e caiu fora, foi cobrador de ônibus e saiu de banda, agitou bandeira nas esquinas da cidade no período eleitoral, nada que durasse muito, mas também nada que durasse muito pouco. Dona Modesta, mãe de Margarida, assim como o Sr. Genoviano, o pai de Mandioca, faziam o gênero de pais protetores. Os outros dois, Sr. Juracy e Dona Olímpia, depois que os filhos casaram, achavam que os dois deviam se virar sozinhos: ou tomavam jeito ou iam quebrar a cara até aprender a ter responsabilidade. Opinião não compartilhada pelo Sr. Genoviano e Dona Modesta. Que estavam sempre na casa de Mandioca e de Margarida para ver se faltava alguma coisa – e se faltava, eles providenciavam. Mandioca e Margarida ficaram até meio viciados na proteção. E pensaram que a coisa ia ser para sempre.

Estavam enganados. Ninguém sabe quem ficou mais estarrecido com a notícia, se foi o jovem casal vacilão ou se foram o Sr. Juracy e a Dona Olímpia, que vacilaram na jogada e ficaram com cara de televisão com antenas internas. O certo é que nas idas e vindas à casa dos filhos, o Sr. Genoviano e Dona Modesta descobriram que tinham mais em comum que o amor pelos filhos. E na ausência deles passaram a usar a cama do jovem casal para o conluio carnal. Até que chegaram à conclusão de que não podiam mais viver um sem o outro. Aquilo era paixão para mais de metro. Era quente que nem lava de vulcão. E só tinha uma solução: eles fugiram para viver um grande amor. Deixaram atônitos os que ficaram para trás, incluindo a mulher do Sr. Genoviano, a Dona Olímpia, e o marido da Dona Modesta, o Sr. Juracy.

Quando soube do acontecido, Mandioca teve diarreia porque soube ao, mesmo tempo, que a Margarida estava esperando o segundo filho, que ela encomendou na confiança de que a mãe e o sogro iam segurar a barra. O Sr. Juracy ficou catatônico: nunca passou pela sua cabeça que um dia seria traído pela fiel, honesta, boa e discreta Dona Modesta. Dona Olímpia entrou em depressão: depois de trinta e cinco anos de casamento, achava que o jogo estava no controle e ia até o fim da vida com o velho marido. Caiu na velha armadilha de time que acha que a vitória está no papo e leva gol nos acréscimos e perde tudo. Pior situação foi a de Mandioca. A ficha dele caiu: ele ia ter que se virar, coisa que nunca fez. O sujeito descobriu algo que fazia tempo que não se lembrava: o choro. Ele chorava porque não sabia o que tinha que fazer, mas não sabia como.

O golpe foi tão profundo que ninguém na família falava nada e também não sabia o que ia acontecer. Os vizinhos especulavam mais que torcedores na véspera de Atletiba decisivo. Rigoleto, amigo do Sr. Juracy, deu uma de treinador de boxe vendo o pugilista arregaçado no banquinho. Tentou a tática do estímulo psicológico: “Estas coisas acontecem. Agora é ter cabeça fria e reagir”. E emendou: “Eu acho que você devia se casar com a Dona Olímpia. É uma mulher boa. Pelo menos parte do estrago fica reparado”. Rigoleto não disse, mas ele achava que o Sr. Juracy e Dona Olimpia teriam que segurar a barra de Mandioca, porque o cara não ia fazer nada além de chorar. “Nesta hora tem que pensar no neto que está aí e no outro que vai vir”, sentenciou Rigoleto.

Mas estav,a difícil. O Sr. Juracy morria de vergonha do abandono, sentimento que também invadiu o espírito de Dona Olímpia. Os dois se consideravam cornos juramentados e sem disposição para novo relacionamento, ainda que fosse entre eles. Mesmo que tivessem algum afeto um pelo outro, achavam que a união seria prêmio de consolação. Como a coisa não evoluiu, Mandioca começou a brigar com Margarida: “A assanhada da tua mãe tinha que se envolver com o meu pai?”. Margarida não se apertou e devolveu: “O Sr. Genoviano, com aquela cara de santo, era um tarado e a culpa é da minha mãe?”. A briga acabou porque o filho chorou e o da barriga começou a chutar. A última frase de Mandioca foi patética: “E agora, o que eu vou fazer da vida?”. Ele não sabia. Mas o bebê que estava vindo cobrava atitude na base do pontapé. Os próximos capítulos serão emocionantes. E vai ter muito choro. Do Mandioca. E do bebê.