O mistério do afamado e abandonado Palácio do Pinho

Uma sensação de tristeza tomou conta de Sandoval Portela diante do Palácio do Pinho, a imponente mansão de madeira que um dia pertenceu à família Xavier de Miranda e que agora estava abandonada na Floresta Nacional de Irati. O acesso ao local foi tranquilo. Portela chegou por volta das 18 horas quando a luz do sol esmaecia e a noite avizinhava. Não era um bom horário para visitar um lugar com maus presságios e onde pessoas juravam ter ouvido gritos lancinantes cuja origem a polícia não descobriu. A proximidade da noite e a inexistência de alguém por perto o deixaram num estado letárgico. Portela hesitou entre voltar com o velho Escort ou ficar sem saber o que fazer. Além disso, não tinha onde se alojar. O palácio estava fechado e se estivesse aberto não abrigava ninguém porque se encontrava em ruínas.

O visitante deu dois passos e ficou diante do pórtico que se apoiava sobre duas colunas. Portela observava a porta envidraçada de madeira entre duas janelas. Havia ainda outras dez janelas distribuídas pela mansão. No pavimento superior, ficava o sótão com três mansardas que davam à edificação em ruínas uma pálida dimensão da imponência de seus anos de esplendor, onde reinaram aristocratas da madeira e da erva-mate. Impressionado, Portela entoou palavras um dia escritas por Alan Poe: “No mais verde de nossos vales, habitado por anjos bons, antigamente um belo e imponente palácio – um palácio radiante – se erguia nos domínios do rei Pensamento, lá se achava ele”. Elas caiam como luva no palácio construído em 1912.

Ele riu. Mas em seguida trocou o riso por expressão de assombro. A figura inefável de uma garota ao lado da coluna, como miragem, apareceu e sorriu. Embora os lábios não movessem ele ouviu a interjeição austera: “Caluda!”. Ele ficou quieto. A voz prosseguiu: “Quando mamãe veio morar aqui com os primeiros filhos ainda pequeninos, foi que papai a construiu. Ela era uma bela casa como fosse no centro de uma cidade grande. Tinha cercas de cimento imitando galhos de árvores. Foram os operários alemães que a fizeram”. A voz ordenou: “Feche os olhos e abra o coração!”. Portela semicerrou os olhos e a voz prosseguiu: “Eram três andares mais o porão, onde ficava a adega. O pórtico solene e as seis colunas jônicas impressionavam os viajantes”.

E como estivesse de olhos abertos, Portela viu a casa não decaída, mas a do tempo em que pontificou na região verdejante dos Campos Gerais. Mulheres bem vestidas passavam pelos corredores, homens com violinos e bandolins entravam pela porta ignorando a presença dele. Portela os acompanhou. Ele subiu as escadas de madeira com seus corrimões de imbuia maciça entalhada. Nas paredes havia desenhos bonitos. Os balaústres das escadas eram entalhados bem como os topos das colunas. Os salões eram revestidos de lambris à maneira europeia do século 19. Madeiras de lei decoravam a parte inferior das paredes enquanto a parte superior era ornada com pinturas. No teto lustres em arte déco. Portela subiu até o último pavimento.

No andar superior ele abriu a janela da mansarda. Ela rangeu, um vento frio entrou no ambiente. E do alto Portela viu os arredores com vegetação abundante e iluminada pela luz da lua, o chafariz que terminava na pequena gruta e mais, viu o vale verde, “o mais verde de nossos vales”, que a noite próxima envolvia numa tonalidade difusa. De repente abriu os olhos. Estava outra vez no solo diante do pórtico do palácio em ruínas. A penumbra e o frio o fizeram estremecer. A menina ao lado da coluna. Ela e o sorriso enigmático enquanto as palavras caiam sobre Portela como sons de sino invisível. Ela disse: “Você viu o que deveria ver. Não entre. Está tudo entregue às traças. Os cupins tomam conta e as abelhas zumbem raivosas no interior. Quando um dia olharem para nós, não haverá mais nada”. Depois que disse, ela desapareceu. Portela olhou para cima, em uma janela de mansarda uma mulher observava-o com censura. Ele compreendeu que era hora de ir embora. Antes de ser devorado pelo abandono e pela decadência do lugar.

A foto da casa foi feita por Nego Miranda e faz parte de seu livro sobre casas de madeira no Paraná.<,/em>