O homem da penitenciária está sempre atacando pelo telefone

Eu liguei para uma amiga, disse alô e ela desligou o telefone. Achei desaforo. Até onde sabia, ela não estava de bronca. Liguei de novo e antes de dizer alô, ela debulhou o milho: “Não adianta encher o saco que não vou cair na tua lábia. Vai pegar outro otário porque comigo não funciona”. E desligou o telefone. Fiquei assustado. A voz era dela e do lado de cá quem falava era eu. Liguei de novo e perguntei: “Você ficou maluca? Aconteceu alguma coisa?”. Ela perguntou: “É o homem da penitenciária?”. Eu disse que era eu e não estava na penitenciária. Ela ficou aliviada: “Esta semana recebi três ligações dos caras da penitenciária, dizendo que sequestraram minha filha. Pode? E nem filha eu tenho”.

Estava esclarecido. Minha tia se apavorou três vezes com avisos de sequestro, que acabaria se ela fosse a um banco depositar dois mil reais numa conta. Agora a velha debulha o milho se não for gente conhecida. Um amigo meu atendeu ao telefone, uma garota disse alô e ele caiu na besteira de perguntar se era a filha dele. E disse o nome da garota. Um cara tomou o telefone no outro lado, disse que estava com ela e se ele fizesse tudo certo, ninguém seria machucado. Claro que meu amigo teria que enfiar a mão na carteira e correr a uma agência bancária o mais rápido. Ele entrou em parafuso. Uma amiga entrou na jogada e acalmou o sujeito: “Acho que é o homem da penitenciária”. Ela ligou para o celular da garota, que mora em Minas com a ex-mulher deste amigo e a garota atendeu. Estava bem. Era golpe.

Não sei como pode isso. Mas caras na penitenciária tem acesso a celulares, conseguem informações e ligam para o Brasil inteiro dando golpes. Muita gente cai, porque a coisa assusta quem está tranquilo em casa. A primeira reação é salvar a vida do “ameaçado”. A existência do negócio mostra a esculhambação do sistema prisional brasileiro. A cadeia já foi universidade do crime; agora virou fábrica de golpes. Eles são variados. Na penitenciária de Aparecida de Goiânia um sujeito levantou informações de carros roubados, com placas, chassis, números de motor e até telefones dos proprietários dos veículos. Ele usava os dados, ligava para as vítimas, pedia para elas depositarem grana numa conta, que o carro ia estar no dia seguinte na frente da casa do sujeito. Muitos fizeram depósito. E passaram o dia seguinte inteiro esperando o carro roubado que não apareceu. É muita esculhambação.