O dia em que General morreu depois da coleta na paróquia

Luiz Roberto da Silva, o Luizinho, também conhecido na juventude como General, por comandar batalhões de amigos boêmios rumo aos lupanares do baixo meretrício da cidade, levou vida dissoluta, pecaminosa e luxuriosa por anos, até acontecer um problema de saúde que mostrou que a vida é breve e a morte chega para todos. “Aquilo foi um choque tão grande na minha vida que eu fui direto da zona para a igreja”, me confessou General com os olhos mais arregalados que os de Coruja Diabo depois de ouvir tiro de bacamarte. Durante anos Luiz Roberto foi de dia o Luizinho bacana que atendia todo mundo no escritório, admirado por amigos e conhecidos por sua presteza e esperteza. De noite virava o cão do avesso. Era o General comandando mais uma investida aos redutos pecaminosos da cidade.

O sujeito mudava do dia para a noite e, depois, naturalmente, da noite para o dia. “Eu era um cara muito sem-vergonha. Eu fazia qualquer coisa e não enjeitava nada. Era um putanheiro”, me segredou, até meio envergonhado, porque agora tomou jeito. Eu pensei que este “não enjeitava nada” fosse força de expressão. No entanto, no dia em que ele contou que quando moço, na flor da idade, um sodomita o abordou na fila do cinema e propôs pagar a entrada e dar um bom troco se ele permitisse algumas sacanagens lá dentro, eu percebi que a coisa era brava. As sacanagens eram deixar o sujeito fazer carícias no órgão reprodutor de General enquanto ele via a fita. Ele topou na hora e sem arrependimento.

Na realidade, depois, ele se arrependeu de uma coisa. De não ter anotado o telefone do sujeito para uma emergência. O sodomita deu a grana e caiu fora antes de a fita terminar. General pegou a grana no escuro enfiou no bolso, viu o filme e quando foi conferir, “era uma nota preta”. Ele levou um susto: “Fiquei com vontade de ir atrás do cara para pegar o telefone. Afinal, tem hora que a gente se aperta e faz qualquer negócio para levantar um troco”. General era fogo na roupa. Era o bicho. Até que teve o troço no coração e foi parar na UTI. Ele disse que viu tudo, o outro lado, as portas do inferno, o capeta fungando e coisa e tal. A primeira coisa que pensou foi: “É castigo divino porque eu sou um sem-vergonha”. Entre a vida e a morte, prometeu: “Se escapar desta, nunca mais vou ser putanheiro”. E mais: “Eu vou direto para a igreja”. Escapou. E foi para a igreja.

Quando General chegou à igreja a tropa do bem levou um susto. Afinal, o que a mulher dele, Dona Merlinda, fez de promessa para endireitar o marido, não estava no gibi. Todo mundo na paróquia conhecia a fama dele. Mas quem achou que a mudança seria efêmera se enganou. General virou soldado do Senhor. De participar de comissões disto e daquilo. O tempo passou e numa reunião das comissões, os velhinhos disseram que precisavam de alguém de confiança para recolher donativos. Ninguém se apresentou e General ergueu o dedo: “Podem contar comigo”. Os velhinhos aprovaram o nome do novo chefe das finanças, mas ressabiados. “No primeiro dia que eu coletei o dinheiro, levei um susto”, contou General. “Tinha três notas de 100. Tinindo de novinhas. Eu olhei aquilo e pensei: o pessoal daqui tem muita grana! Eu até pensei, se uma destas sumir, ninguém vai sentir falta”, contou.

General pegou as três notas de 100 e olhou com carinho, estavam cheirando de novas. Foi com o coração apertando que colocou as três com as outras, relatou as doações e fez anotação no livro. Quando terminou, o mais velho dos velhos da comissão se apresentou para conferir o trabalho de General. “Ele olhou, conferiu e sorriu satisfeito”, disse ele. Foi então que percebeu a armadilha dos velhinhos. As três notas de 100 não eram doações de ninguém, eram iscas para saber se General realmente se transformou em novo sujeito e não tinha mais resquícios do sem-vergonha que fazia qualquer coisa por sexo e dinheiro. “Foi ali que eu percebi que eles me reconheceram como um novo homem”, disse. E naquele dia General morreu. Luiz Roberto da Silva passou a ser apenas o Luizinho. Até hoje amado na paróquia.