O caso da casa de Dorothy e o japonês bacana que era mafioso

Mingo Peltrinelli gostava da casa, mas a mulher Dorothy Lammur de Souza dava as cartas na área. Ela achava a casa pequena. E tinha argumento bem feminino e indefensável: o Jardim Social subia de nível e a casa em que moravam destoava na paisagem. Mingo prometeu casa dos sonhos para Doroty, que não era besta de ficar discutindo. Mulher tem razão mesmo quanto não tem. Ele pediu paciência para educar os filhos – prioridade número 1. Depois de os filhos formados, ele investiu na construção de uma casa tipo Hollywood, fachada bonita e resto funcional e sem exageros arquitetônicos. Quando a mansão de fachada ficou pronta, Dorothy Lammur morreu. Mais: os filhos casaram e foram embora. Mingo Peltrinelli ficou com a mansão de fachada. Um elefante branco no Jardim Social.

A saudade é um prego e o coração é um martelo, fere o peito e dói na alma e vai virando um flagelo. Mingo deu um chego pra lá na saudade, arrumou uma viúva jeitosa e casou seis meses depois. E decidiu alugar a mansão de Dorothy para morar num apartamento do Juvevê. Ia botar a casa na Imobiliária Coisa Nossa. Mas não colocou. Toshiro Yamashita, o Rei dos Pastéis, que era seu amigo, disse que ele tinha um chapa bacana na parada, gente fina, que precisava de mansão no estilo da casa do Jardim Social. Chique por fora e funcional por dentro. O nome do cara era Fumio Matsumata. Yamashita bancou Matsumata e Mingo Peltrinelli topou a parada. Além de ganhar mais que o aluguel avaliado pela imobiliária, ia economizar a comissão da imobiliária. Jogo perfeito.

Mas quando o cara quer ser muito esperto o destino joga casca de banana na frente e ele escorrega. Foi o que aconteceu a Mingo Peltrinelli. Matsumata parecia bacana. Mas morava sozinho, não tinha mulher, nem cachorro. E não era homossexual. Ninguém é sozinho sem guardar um grande segredo. O dinheiro entrava na conta e Mingo não ficava tranquilo. Até que a verdade surgiu nua como playmate no pôster desdobrável da revista Playboy. Em grande estilo: um belo dia um batalhão da Polícia Federal invadiu a mansão do Jardim Social com helicóptero e tudo e levou Fumio Matsumata em cana. Sobrou para Mingo Peltrinelli explicar porque sua casa serviu de abrigo para um notório integrante da máfia japonesa. A temida Yakuza, também conhecida como Gokudô.

Mingo ficou boquiaberto. E chegou na defensiva para depor: “Eu nem sabia que tinha máfia no Japão!”. Não sabia, mas tem. O PF disse: “Ela é terrível, vou te contar”. O PF contou: “A polícia japonesa chama os caras de bôryokudan. Grupo de violência”. Aquilo deixou Mingo preocupado. O PF acrescentou: “Eles se chamam entre si de Ninkyô dantai”. Mingo não sabia o que era, mas não devia ser coisa boa. O PF disse mais: “Eles costumam cortar os dedos de quem não gostam. Isso se chama yubitsume”. Mingo ficou impressionado e olhou para os próprios dedos. Ele pediu para falar em particular com Fumio Matsumata. Quando chegou à cela, o japonês estava de calção. O dorso do corpo parecia tapete oriental de tão tatuado. Ele estava impassível. Mingo tentou o impossível. Ele disse: “Eu quero que o senhor saiba que não acusei ninguém de pertencer à Yakuza”.

O mafioso riu um diabólico riso nipônico e disse: “Eu sei. Quem me traiu foi Yamashita. Eu vou matar aquele cara. Se depender de mim não vai ter mais pastel em Curitiba”. A frase livrava Mingo de qualquer hostilidade no segmento nipônico do submundo do crime, mas deixava a capital paranaense sob a ameaça de ficar sem pastel produzido por imigrantes orientais. No entanto este já não era mais um problema de Mingo Peltrinelli. Ele saiu da cela e foi para a sala do policial. O PF disse que ele estava limpo na jogada. Acertadas as contas com o mafioso japonês e com a polícia brasileira, Mingo foi para casa revoltado com a mulher morta: “Tudo começou quando Dorothy Lammur não se conformou com uma casa de padrão médio no Jardim Social e invocou com mansão tipo Hollywood”. Bem, ele ia colocar a casa na Imobiliária Coisa Nossa para alugar. E esperava não ter mais dores de cabeça com este assunto.