O caminho dos jardins que se bifurcam

Rosinha não lembra quando Fernando mudou para a vizinhança no Bom Retiro, mas lembra de quando o conheceu: ela estava na casa de Rosicléia e ele apareceu para chamar Eduardo para jogar futebol de salão. Fernando não era bom de bola, mas ele formou o time e tinha lugar cativo entre os titulares. Ele tinha jeito para liderar, embora sua liderança nem sempre fosse pacífica. Quando Rosinha e Fernando tinham catorze anos, eles começaram a namorar. Ele disse para Rosinha que o amor deles era para sempre e pediu uma verdadeira prova de amor. Ela confiou. Os dois não tinham pressa porque acreditavam que tinham uma vida pela frente – um caminho para dois.

A carreira de jogador de Fernando morreu no ninho. Ele não quis ser bancário, nem engenheiro e tampouco médico – as duas últimas profissões davam prestígio, mas não era para qualquer um passar no vestibular de Medicina, principalmente para a Universidade Federal do Paraná. Aquilo era maratona e ele não era grego. Ele botou na cabeça que ia ser diretor de teatro. O raciocínio que o levou a esta decisão é simples: as moças bonitas queriam ser atrizes e para conseguir precisavam aprovação do diretor. Rosinha, talvez por prudência, disse que ia ser atriz. Genoveva, tia de Rosinha, não acredita que foi aí que começaram as divergências.

Ela achava que Rosinha e Fernando formavam um casal perfeito. Genoveva tinha uma teoria estranha: não foram as opções profissionais dos dois que os impediram de ficar juntos. Ela compartilhava a ideia de que há uma bruxa em todo lugar e Domitilia, uma solteirona rancorosa, era a bruxa do Bom Retiro. Genoveva disse que os jovens formavam um par perfeito e Domitilia disse que um dia eles iam se separar, porque todo mundo se separa ou vive infeliz para sempre. Rosinha e Fernando entraram para o curso de Teatro na FAP. Quando se formaram, Fernando conseguiu verba do governo para a primeira peça. Ele era o diretor. Rosinha o ajudou a fazer o projeto da lei de incentivo.

Fernando fez teste para escolher a atriz principal. Ele escolheu a moça mais bonita. O nome dela era Matilde. A peça não fez sucesso. Fernando prestou contas do projeto ao poder público e ainda ficou com dinheiro no banco e novas idéias na cabeça. Além de uma noticia para Rosinha: “Estou com a Matilde. Não seria justo esconder isso de você”. Fernando disse: “Você é uma garota inteligente. Não vai fazer drama e tenho certeza de que vai arrumar alguém melhor do que deu”. Ela disse: “Eu tenho certeza de qualquer um será melhor que você”. Fernando achou que ela ficou ressentida, mas era o mínimo na circunstância. Deu de ombros e levou adiante a vida com Matilde. Agora Fernando era diretor de teatro e tinha namorada bonita.

Para esquecer Fernando, Rosinha viajou de mochila para a Bahia onde conheceu Hernan, psicólogo argentino, que dormia na barraca ao lado no camping. Dois dias depois estavam na mesma barraca. Ela se apaixonou por Hernan, que se apaixonou por ela. Ela voltou para Curitiba e avisou a mãe que ia morar em Buenos Aires. Dois anos depois Hernan estava deprimido e quis morar no Brasil. Mas, antes, viajou pela Europa. Rosinha achou o máximo. Eles passaram um mês em Portugal e depois foram para a França. Quando chegou a Paris, Rosinha se encantou com as luzes da cidade. Ela só tinha visto aquilo em filmes.

Finalmente estava no lugar certo, na hora certa e tomou a decisão que julgava certa. Ela disse para Hernan: “Amei a cidade. Eu vou ficar”. Hernan disse: “Você não pode fazer isso comigo!”. Ela disse: “Eu acho que você vai achar alguém melhor do que eu”. Ele foi embora. Foi morar no Rio de Janeiro, onde agora está feliz. Genoveva ainda mora no Bom Retiro. Quando soube que Rosinha despachou Hernan depois de ser despachada por Fernando, ela disse: “Foi praga da Domitilia. Todo mundo sabe que ela é uma bruxa”. A mãe de Rosinha não deu importância: não podia ser praga porque todo mundo estava feliz. Pior se não se separassem pelo caminho, mas estivessem infelizes em seus jardins em saída.