Eu não conheço quem acompanha novela hoje em dia a sério, sem perder capítulo. Passadinha de olho não vale. As novelas ficaram repetitivas, previsíveis e banais, embora os autores se esgoelem até a bizarrice para sair da mesmice. Isto não chega a ser novidade. Novelas ruins sempre existiram. O que não acontece hoje em dia é aparecer uma novela que arrebente a boca do balão, como antes com “O Direito de Nascer”, “Beto Rockfeller”, “Os Irmãos Coragem”, “Gabriela”, “O Bem Amado”, “Saramandaia”, “Que Rei sou eu”, “Roque Santeiro”, “O Rei do Gado”, “Dona Beja” e “Pantanal”. Como se vê, a lista é longa. Estas novelas tinham algo em comum: elas magnetizavam o público. Claro que mais uma e outra merecem entrar aí. Mas fica de fora muita coisa.

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A novela “Os Irmãos Coragem” foi um marco. Primeiro porque os capítulos não atrasavam, eram rigorosamente em dia, um atrás do outro, horário e grades impecáveis. Virou padrão. Antes havia atrasos, alguns dias tinham capítulos a mais e outros a menos. A novela de Janete Clair apresentada de 8 de junho de 1970 a 12 de junho de 1971 foi um produto assustador: pontual, bem formatado, dramaturgia ousada para a época, misturando coronéis brasileiros com bangue-bangue americano. Empatia total com o telespectador. Foi um sucesso que mudou a vida do velho Ladislau. Depois de certa idade ele ficou com preguiça de tomar banho. Se dependesse dele tomava um banho por semana e olhe lá. O diacho é que andava o dia inteiro e ficava com odor fétido de suor.

Como era o patriarca da família, ninguém reclamava, mas ninguém também chegava perto ao fim do dia. Ele tomava banho antes de dormir e quando caia na cama, Josefina já estava no terceiro sono. Ele acordava antes dela. Mas um dia apareceu João Coragem (Tarciso Meira) na casa dele. E Ladislau passou a tomar banho todos os dias antes do jantar que era por volta das 19 horas, porque não queria ver a novela às 20 horas, sujo, fedorento e desarrumado. Josefina segredou para mim que Ladislau achava que por ver os personagens da novela, ele também era visto por eles. Ele não queria ser visto sujo, fedido e desarrumado. Quando perguntei ainda nos anos 70 para Ladislau, ele me deu outra resposta: “João Coragem sou eu”. Gustave Flaubert deve ter levado um belo susto no cemitério de Rouen.

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