O futebol de Israel não é dos melhores do mundo, o que não significa que a paixão pelo futebol por lá seja menor que em qualquer outro lugar onde o esporte é praticado. Um observador deste esporte, que não tem a pretensão de ver seu país despontar como uma potência futebolística mundial por pelo menos nos próximos doze anos (afinal a palavra nunca é imprópria em quaisquer circunstâncias), gosta de observar uma partida de futebol para fazer comparações com o homem, com o mundo, com a guerra, enfim, com todas as coisas. O sujeito é Issur Stulberg, jornalista, escritor e que frequenta o Café Telegraph de Tel Aviv-Yafo. Quem o encontrou por lá e conversou com ele foi o meu amigo J. Bressan que voltou impressionado.

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A última de Stulberg sobre o futebol foi essa: “Uma partida contém em 90 minutos as principais reações de uma vida. Eu diria que futebol é a vida com todos os seus elementos”. É assim que começam as suas dissertações. Com uma epígrafe, a partir da qual ele defende a tese, que não consome mais de 40 minutos, embora nunca seja inferior a 35 minutos. “Uma tensão enorme precede uma partida como no nascimento de uma criança. E quando os dois times entram em campo, os primeiros minutos transcorrem, quase sempre, sem novidades. Como na vida de uma criança. Como tem criança que se arrebenta nos primeiros anos de vida, tem time que já de cara vai levando bucha”, diz ele.

“Quando o primeiro tempo termina, o time que está perdendo tem esperança de ganhar, de virar o resultado. E o time que vence não tem certeza da conquista e sabe que aquele resultado pode ser efêmero”, diz ele. Stulberg compara os últimos minutos do primeiro tempo e os primeiros do segundo com a idade adulta. Ainda há tempo para fazer muita coisa. Quanto aos últimos, eles se parecem com a velhice. Todos estão cansados, mas a bola ainda está rolando. E enquanto ela rola, há sempre um pingo de esperança. “E muitas vezes este pingo de esperança se transforma num mar de alegria”, diz ele, gastando um pouco de poesia. O nosso amigo diz que os jogadores transpiram todos os sentimentos, qualidades e defeitos do homem.

“O jogador de futebol é um mentiroso por excelência, pois se não for será vítima do outro que pode ser ou do juiz que pode estar mal intencionado. A mentira no futebol é um mecanismo de defesa”, diz ele. “O jogador cai, mas não foi derrubado. Ele grita, mas não sente dor. E quando sente dor, ele chora. O choro está presente na derrota e na vitória, na alegria e na dor e o choro talvez seja a única coisa verdadeira numa partida de futebol”, acrescenta. Stulberg elenca uma série de outros elementos numa partida de futebol. Mas ele chama atenção para o medo. “Pouca gente fala, mas não tem esporte em que o medo de perder é tão evidente quanto no futebol. É um medo que começa no campo com os jogadores e se amplia na arquibancada e fica estampado na cara do torcedor”, afirma.

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“A hipocrisia também corre solta no futebol: jogador arrebenta o adversário e diz que foi sem querer. Beija a camisa do time, diz que é amor e dois meses depois está beijando a de outro clube”, diz ele. Os técnicos são os personagens mais complexos. “Eles são os Hamlets. São os que mais sofrem, se angustiam, ficam irados e são os que ficam menos tempo no emprego. Se o time ganha, o mérito é dos jogadores; se perde a culpa é do técnico”, diz. “Mas os técnicos também são diabólicos. São os Mefistófeles do esporte. Maliciosos, ardilosos, verdadeiros demônios capazes de vender a alma por uma vitória”, diz Stulberg. A vitória é tão importante que a gama de procedimentos que envolvem uma partida de futebol talvez só seja comparável a uma guerra. “As manobras interesseiras que existem por trás de uma partida, as malas pretas, as malas brancas, as sacolas, enfim, vale tudo quando estão em jogos estes valores abstratos pelos quais todos lutam: os três pontos”, diz ele. Futebol é tudo isto. E, também, claro, é amor.

Porque sem amor do torcedor pelo seu time não existe futebol. E q,uem não ama e sofre por seu time, na alegria e na dor? Mas no futebol o amor do torcedor é mais autêntico: dura toda a vida.

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