Emanoele quis fazer programa diferente e chamou as amigas para ir a um baile em Joinville. Divorciada, filhos criados, aos 48 anos ela botou na cabeça que ia arrumar namorado. As duas amigas na mesma faixa de idade ficaram excitadas, mas recusaram. “Uma coisa é pensar em alguém; outra é encontrar alguém”, disse Isabel, a mais prática das três. Valquíria, cuja estima repousava mais baixo que o petróleo da plataforma de Campos, suspirou e disse: “Eu nem vou gastar dinheiro com esta bobagem. Na nossa idade, amiga, só aparece tranqueira”. Emanoele andou vendo vídeos luxuriosos escondida e talvez por isso andava otimista. “Pois fiquem vendo novelas que eu vou para a minha aventura”, disse ela. Disse e foi.

continua após a publicidade

Foi numa sexta-feira e voltou na segunda-feira. Na quarta-feira encontrou-se com as amigas e veio com uma história estranha. Primeiro que ela foi ao baile à noite e colocou óculos escuros. Segundo que era morena e pintou o cabelo de loiro – ficou um negócio meio alvoroçado. Ela disse que estava chique: usava blusa azul claro, saia leve azul claro e sapatos brancos. E terceiro que pela descrição que fez para as duas amigas, ela entrou no baile com cara de madama endinheirada caçando parceiro do sexo masculino. E achou. Helmut Schäfer tinha nome alemão, mas tinha cara de italiano e topava qualquer parada. Usava terno azul escuro, camisa branca e gravata e sapatos marrom. Usava ainda chapéu negro e óculos escuros. Idade desconhecida. Qualquer coisa entre 45 e 65 anos. Entusiasmo de um garoto de 20 anos.

Ele olhava Emanoele o tempo todo com a cabeça virada, como fizesse charme. De óculos escuros Emanoele não tirou os olhos de Helmut. Ela contou para Isabel: “Ele tinha um jeito tão especial de ficar olhando para mim, que não resisti”. O sujeito se aproximou, convidou-a para dançar. Ela pensou: “Estou de óculos escuros e ninguém me conhece. Vou em frente”. Ela suspirou e disse para Isabel: “Ele era atencioso e dançava tão bem!”. Na segunda ou terceira música e já programando cair fora dali com o sujeito, Emanoele perguntou por que ele não ficava com o pescoço reto, como todo mundo, e não parava de olhar para ela com aquele jeitinho todo especial e cheio de charme, com a cabeça pendendo para o lado direito do ombro.

Helmut Schäfer respondeu: “Eu tive um problema de saúde na infância e o músculo do lado direito de meu pescoço ficou frágil e não suporta o peso da cabeça. Por isso ela fica caída sobre o ombro direito”. Ele respondeu de forma tranquila e calma, tão encantadora, que Emanoele achou apenas um mero detalhe. Valquíria perguntou: “Quem manca da perna é perneta. E quem manca do pescoço?”. Isabel encolheu os ombros e disse: “Não sei. Acho que isso não tem importância”. Emanoele não se incomodou com os comentários. As duas amigas também esqueceram porque tinham coisa mais importante para perguntar. Valquíria perguntou: “Você por acaso foi para o hotel com um sujeito desconhecido e do pescoço mole?”. Emanoele respondeu sem cerimônia: “Com pescoço mole ou não eu tive uma noite maravilhosa”.

continua após a publicidade

Isabel, sempre pragmática, tinha mais uma pergunta: “Vocês beberam alguma coisa?”. Emanoele disse que sim. “Por que você pergunta?”, quis saber. Isabel, com seu eterno senso pragmático, comentou pensativa: “Mas se ele tinha o pescoço torto, a boca devia estar torta. Ele não derramava nada?”. Emanoele respondeu curto e grosso: “Não derramava nada. Nenhuma uma gota”. Isabel murmurou: “Impressionante”. Nestas alturas, Valquíria estava numa espécie de torpor com a ousadia e desembaraço da amiga – e não tinha mais perguntas a fazer. Como as duas ficaram caladas, Emanoele anunciou a última novidade: “Sabe meninas, o Helmut telefonou hoje de manhã para dizer que está pensando em se mudar para Curitiba para ficar mais tempo comigo”. Foi assim que Isabel e Valquíria perceberam que acabaram de perder uma amiga.