Começou a agonia. O tempo esquentou e a coisa está apenas no princípio. Encontrei o Juvenal Klockner e contei para ele que no verão passado eu me senti mal e que na hora que o bicho pegou, não tinha ventilador em lugar nenhum. “Juvenal, eu virei um picolé, eu me derreti, rapaz”, disse para ele. Aliás, até loja de leque andou faturando grana de tão quente que ficou. Juvenal disse que ele também se ferrou e que no verão deste ano não vai se ferrar. Ele providenciou para cair fora de Curitiba e do Brasil e só vai voltar em abril do ano que vem que ele não tem vocação para iguana. Ele disse de chofre: “Meu negócio é agora com Akureyri”. Eu fiquei pensando quem era o sujeito. Com este nome devia ser mágico armênio. Ele continuou: “Gostei do lugar. Bonitinho. Eu vou para lá no começo de novembro”.

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Era uma cidade. Que Juvenal descreveu assim: “Se você juntar os melhores pontos de Morretes, colocar um lago suíço na frente, ao fundo a Cordilheira dos Andes, um mar do tipo norueguês frio, azul e calmo (pelo menos nas fotos que eu vi), casinhas baixas, sem grandes edifícios, uma gente bacana, então nós temos uma descrição aproximada de Akureyri”. Ele falava como se o lugar fosse o paraíso: “Eu comecei a pensar em Akureyri no último verão. Por causa do calor. Que está de volta. Ainda não se impôs, mas já deu mostra de que será no mínimo igual ao do ano passado entre os meses de dezembro e abril. Será que você se lembra do calor? Aquilo foi de rachar o bico, de fritar ovo no asfalto e de fazer lava de vulcão parecer sorvete Kibon numa sorveteria da Rua XV. Eu não vou esperar. Eu vou fechar o apartamento e vou para Akureyri”.

Ele pode fazer isto porque ficou viúvo, criou os filhos e não faz nada depois que se aposentou como procurador de tribunal. Eu quis saber onde ficava Akureyri. Juvenal explicou: “Fica no norte da Islândia, na província de Norouland eystra”. Ele disse que foi de lá que saíram as primeiras famílias islandesas em 1863 em direção do Paraná. Juvenal pelo jeito foi fundo na pesquisa: “Um pequeno paraíso frio de 17 mil habitantes com o qual temos uma irmandade.” Eu não entendi o negócio da irmandade e ele disse que Curitiba e Akureyri são cidades irmãs desde o ano passado. “E como você sabe, irmão é para hora da precisão. Eu vou estar em casa”, disse, todo cheio de otimismo. Juvenal programou tudo para fugir do calor. Vai passar o verão no Hemisfério Norte, onde agora é outono e depois vem o inverno.

Ele disse que quase morreu no ano passado. Ele fez da seguinte forma a descrição da cidade que é a quarta maior do país: “Temperatura média de 4o centigrados. A temperatura média no inverno é 1,5o negativo. No verão a temperatura média é de 11o. Umidade relativa do ar em torno de 86%. O que você acha?”. Eu não sabia o que achava. Juvenal tem aposentadoria que permite a ele viver em qualquer lugar do mundo. Até no norte da Islândia, que por falar nisso, acabou de instalar um consulado em Curitiba. Mas lançar um olhar na internet sobre a cidade e conferir esta geladeira no local são duas coisas diferentes. Eu respondi: “Faça o seguinte, vá para lá e depois me diga. Eu não tenho opinião formada sobre Akureyri. Se for bacana, no ano que vem eu também vou”.

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Ele me olhou e disse com uma cara de escárnio: “O mundo está ficando louco. Os homens estão transformando o planeta numa estufa. Curitiba vai virar uma Marrakech sem beduíno. Anote o que eu estou falando e me diga quando eu voltar. Os vendedores de lojas de eletrodomésticos da Rua Marechal Deodoro já estão esfregando as mãos. Vão vender ventiladores às pencas”. Isto era verdade. No ano passado faltaram ventiladores nas lojas, nas fábricas e pior de tudo, nas casas. Com o aquecimento global, as temperaturas estão cada vez maiores. Até em Curitiba, uma cidade que tradicionalmente não era tão quente. É aí que Akureyri vira sonho de uma noite de verão. Eu não sei se Juvenal foi irônico, mas ele disse que ia levar m,eus livros para a Islândia. “Vou ter tempo e temperatura ideal para uma longa prospecção literária”, disse.