O deputado Ataulfo Beltrão estava com setenta anos, sete mandatos, um metro e setenta de altura, sete arrobas de peso, tinha sete filhos, sete netos e passou férias em praias maravilhosas dos sete mares. Os seus dois nomes tinham cada um sete letras. Com tantos números sete na vida, ele agora se preocupava com os sete palmos debaixo da terra porque não era gato que tem sete vidas. Ele perguntou para a esposa que entendia de numerologia: “Querida, você acha que eu vou durar muito?”.
Dulcinéia Beltrão respondeu cruel feita mexicana ofendida: “Olha Beltrão, deputado pode ser gatuno, mas não é gato para ter sete vidas. Você tem medo de ir para o inferno?”. Beltrão levou susto: “Claro que não, eu não fiz nada”. Dulcinéia deu riso de mexicana fatal: “Conta outra Beltrão! Tua sorte é que você tem cobertura”. Ela não se referia ao apartamento em Camboriú.
Beltrão ficou lívido: “Quantos anos você acha que eu ainda tenho?” Mulher quando quer, sabe ser cruel. Dulcinéia fez cara de desprezo e respondeu: “Como vou saber? Não tenho bola de cristal”. Beltrão encrespou esquecendo que estava em casa, terreno de Dulcinéia: “Alguém andou falando alguma coisa de mim para você?”.
Dulcinéia olhou-o com desprezo e disse: “Quem deve teme, não é Beltrão? Ninguém falou, mas você acabou de confessar”. Beltrão não gostou. A mulher fez mais uma vez cara de desprezo e disse: “Não se preocupe. Eu passei da idade de fazer cenas de ciúmes. Mas você parece que esqueceu que o tempo passou. Aposto que anda forrando a carteira de alguma vigarista”.
A conversa degringolou de um jeito que Beltrão fez pausa para retomar o curso anterior. Ele pensou: “Caramba, nem duas centenas de deputados são mais complicados que uma mulher. Onde eu estava mesmo?”. Ele se lembrou: “Querida, eu estou cabreiro com o número sete, entendeu?”. A mulher suspirou: “O número sete é mágico. Mas como nós temos baixo nível espiritual, sempre o usamos de forma negativa. É o que você faz”.
Beltrão indagou: “Eu tenho baixo nível espiritual, Dulcinéia? De onde tirou isto?”. Ela respondeu mais cruel que nunca: “Querido, se não tivesse, você ainda seria deputado?”. Ele não gostou. Mas a verdade era que no fundo ele pensava o seguinte: para que desenvolvimento espiritual elevado se não ia ser padre? E achou melhor acabar com o papo de numerologia, antes que o caldo entornasse duma vez e o pau comesse sem que soubessem a razão.