O amigo Eduardo Santana me recebeu ontem com um sorriso e uma frase para despertar recônditas lembranças: “Meu amigo, estou com uma saudade do churrasco de igreja!” Eu nem sabia que ele ainda pegou a fase desta coisa maravilhosa que era o churrasco de igreja, verdadeira festa de fim de semana na minha infância em Maringá, quando o bispo Jaime Luís Coelho intimava o dono do Frigorífico Central e ele comparecia com carne de primeira para o churrasco no Salão Paroquial, normalmente aos sábados ou domingos, cuja receita financeira era destinada para a construção da nova Catedral, aquela que parece um copo de sorvete emborcado e que está imponente no centro da cidade até hoje.

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Sempre que vou a Maringá eu dou um pulo na catedral. Primeiro porque fica bem perto da casa de minha tia. E, segundo, porque na caminhada eu vou recordando casas e famílias que fizeram parte da história da cidade e que não estão mais por lá – casas e famílias. Tudo muda e muitas vezes nem sempre para melhor. Mas a catedral está firme, imponente, e como presenciei a sua construção, assim como o Grande Hotel – que espero sinceramente não seja demolido por nenhum idiota – e o prédio do Instituto de Educação são poucas edificações importantes dos anos 60 de pé no centro da cidade. Sina que, lamentavelmente, não teve o belo prédio da velha Rodoviária.

De certa forma eu tive parte, diminuta, na construção da nova catedral, porque participei dos muitos churrascos feitos para levantar recursos. Assim como no final de 1963, eu fui campeão de arrecadação de dinheiro de casa em casa para ajudar a construir o novo prédio do Colégio Marista. Ganhamos, eu e minha sala, fim de semana na Chácara do Benjamim, que tinha piscina. Não foi perfeito porque choveu. Mas ainda assim fomos para a piscina. Não recordo a contribuição para construir a catedral como um esforço do qual deva reivindicar reconhecimento. Participar daqueles churrascos foi uma das coisas boas de minha infância.

Os congregados marianos, responsáveis pelo esquema do churrasco, me convidavam para participar da organização vendendo fichas e servindo espetos de churrasco e garrafas de bebidas – cerveja e guaraná, que se não me engano eram obtidas pelo bispo junto à Indústria de Bebidas Ouro Verde, potência então na cidade. As senhoras vendiam saladas de tomate e pães. No aparelho de som, para a coisa não ficar sem um festivo toque sonoro lá estava ele, o grande Johnny Pineaplle and his Islanders, com seu som produzido com base em clássicos da música havaiana. Putz, se aquilo não era felicidade, eu não sei o que era ser feliz. Talvez por isso tenho saudade imensa da velha catedral de madeira, demolida alguns anos depois, do cheiro de incenso e dos rituais nos dias santos de relevância, sempre embalados pela missa celebrada em latim.

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O que me faz recordar este tempo com nostalgia é o fato de que os churrascos na igreja contribuíram para que eu me tornasse uma espécie de celebridade entre meus amigos. Eles não tinham dinheiro e ficavam parecendo presidiários com rostos e mãos grudados nas grades das celas – no caso dos amigos, nas cerquinhas que separavam a multidão que não parava de comprar espetos de churrasco dos vendedores no grande galpão. Eles imploravam como pecadores no purgatório para que eu intercedesse junto aos congregados marianos para fornecer pelo menos um pedaço de carne num prato de papel, para conseguirem acalmar as lombrigas em pé de guerra nas suas barrigas. Eu contei para o Sr. Juvenal o drama de meus amigos e ele permitiu que eu desse um espeto de churrasco para eles, desde que fossem para o fundo do Salão Paroquial, para o esquema não avacalhar. Eu levei o espeto com alguns refrigerantes e o Mauro quando pegou o espeto olhou-o como fosse a Sofia Loren e saiu dançando de felicidade ao som de Kila Kila, Aloha Oe e Naka Pueo. Tudo isto foi há mais de cinquenta anos. Quando leio notícias alarmantes sobre o planeta e a humanidade eu desconfio de que já fui um sujeito feliz.