Até onde um sujeito pode ser esperto?

Eu não tenho o hábito de ler livros de autoajuda. Reconheço que alguns são até bem escritos e podem funcionar com algumas pessoas, mas como este nicho literário se tornou um grande negócio, como em tudo na vida, apareceram muitos autores que falam bobagem e faturam alto. O que não é o caso, parece, de Napoleon Hill, que foi um dos primeiros a rir com esta tendência literária e ao morrer em 1970 deixou de herança frases óbvias, porém antológicas, como: ‘Não devemos ter medo das novas ideias. Elas podem significar a diferença entre o triunfo e o fracasso‘. A grande verdade é que Hill foi um sucesso pessoal. Um dos primeiros autores de autoajuda. Só um de seus livros ‘Pense e enriqueça‘ vendeu mais de 100 milhões de exemplares. É muita coisa. 

Eu andei lendo um livro dele: ‘Mais esperto que o diabo‘. Que me foi presenteado por um amigo. Achei que no mínimo devia ser respeitoso e ver de que se tratava. Este livro tem uma ‘entrevista exclusiva com o diabo‘ durante a qual, segundo os editores, o autor ‘quebrou o código mental do diabo e o forçou a confessar seus segredos‘. Um dos segredos do diabo, segundo Hill, é plantar as sementes do pensamento negativo nas mentes das pessoas e dessa forma conseguir ocupar e controlar o espaço do cérebro humano que não é usado. Só de imaginar um troço desse eu fico assustado. O livro vai ser lançado no Shopping Palladium nesta terça-feira, dia 16, às 19h30. Todo livro sempre faz a gente pensar.

No caso deste livro, achei que Hill usa o Diabo como metáfora para pensamentos negativos e intimidadores nos negócios e na vida pessoal. Ou seja, uma espécie de trava que impede o sujeito de ousar, de ser esperto. Depois que fechei o livro fiquei pensando: tudo bem, mas até onde um sujeito pode ser esperto? E a pergunta tinha relação com angustia recente com um amigo que é muito esperto. Angustia porque é um cara bacana e acho que ele está exagerando na ‘esperteza‘. Ele andou se dando bem ao se associar num empreendimento imobiliário numa área de uma cidade do interior em crescimento e em pouco tempo amealhou patrimônio de dez terrenos. É a velha história, ele e dois sócios compraram chácaras, fizeram loteamento para condomínio fechado, recuperaram o investimento, ainda sobraram lucro e terrenos. Ele achou a coisa fácil e começou a vender os terrenos para arriscar em outras áreas. Não deu certo e agora ele está vendendo os terrenos remanescentes para um golpe decisivo. Que pode dar certo. E pode não dar certo. Se não der certo, ele está ferrado. E duro.

Eu falei para ele ir com um pouco de prudência. Há limite para tudo. Até para o risco. Arriscar é uma coisa, mas jogar tudo numa cartada decisiva pode ser complicado. A vida não é um cassino. Ele não ouve ninguém e vai arriscar tudo num lance. E promete recomeçar do zero caso quebre a cara. Eu disse que ele não sabe o que é recomeçar do zero depois que quebrar a cara. Recomeçar do zero com desconfiança ao redor, com a cara quebrada e sem financiamento. Ele não ouviu. Fiquei preocupado. Foi aí que Napoleon Hill entrou de novo na jogada. Primeiro, eu fiquei pensando se desse o livro de Hill, que é de autoajuda, para este amigo ler, não ia adiantar, porque ele não quer saber de nada que contrarie o que já decidiu. Ele está obcecado. Segundo, eu me lembrei de outra frase de Hill que contraria a do primeiro parágrafo e que também é verdadeira: ‘A maioria das pessoas só aprende as lições da vida, depois que a mão dura do destino lhe toca no ombro‘.

É verdade. Quantas pessoas quebram a cara depois de amigos ou familiares próximos aconselharem a ter um pouco de cautela? Cautela não é covardia ou medo de arriscar, cautela é se jogar sabendo onde vai cair e não se lançar no abismo. Isto é suicídio. De qualquer forma, achei as duas frases de Hill contraditórias, embora ambas façam sentido. Talvez este seja o segredo dele. Ter respostas para tudo, embora elas em algum ponto se contradigam. De qualquer forma, ele soube fazer sucesso. Mas sabia por andava. Este o grande segredo.