Os amigos de Cláudio Seto decidiram fazer uma festa surpresa de aniversário. Para ser bem surpresa e pegar o cara no pulo, armaram a festa na casa de Seto. Ele estava no trabalho, chegava depois das 19 horas e então armaram tudo para a coisa ficar engatilhada por volta das 20 horas. E ficou. Eles também esperaram Cláudio Seto, que não aparecia. Eles conferiam o relógio com ansiedade a cada cinco minutos. Esperavam Seto, mas quem apareceu foi uma senhora japonesa de vestido longo, cabelos negros, meio arcada e com o rosto muito maquiado. A senhora perguntou: “Aqui é o aniversário de Cláudio Seto?”. Os amigos de Seto, desconfiados e desconcertados, disseram que sim.

continua após a publicidade

A senhora disse que era amiga de Cláudio Seto. Todo mundo desconfiou. Japonês já é desconfiado por natureza. E quando aparece surpresa a tendência é ficar ainda mais desconfiado. Eles ficaram. A senhora disse que seu nome era Ranko Fujisawa e cantava tango. Chamar Ranko Fujisawa e cantar tango era demais. Os amigos de Seto não engoliram. Acharam que era mentira. E não sabiam quem era a velha. Então ela se postou no centro da sala e começou a cantar: “Adios, Pampa mia. Me voy, me voy a tierras extrañas. Adios, caminos que he recorrido, rios, montes y quebradas. Tapera donde he nacido. Se no volvemos a vernos, tierra querida. Quiero que sepas que al irme dejo la vida. Adios! Al dejarte, Pampa mia”. Se uma tropa de fantasmas aparecesse ali os amigos de Seto não teriam ficado mais assustados. Era uma senhora japonesa cantando tango argentino.

Aquilo não tinha explicação racional, nem irracional. Quando Ranko Fujisawa terminou de cantar, ela perguntou: “Vocês querem que eu cante Yira, Yira?”. Se os amigos de Seto ensaiassem não teriam resposta tão afinada. Eles gritaram: “Não. Nós acreditamos que a senhora canta tango. E que é amiga de Cláudio Seto”. Eles não tinham resistência emocional para ouvir a mulher cantar mais um número de música argentina. Principalmente se cantasse tão bem quanto a que terminou de entoar. A senhora sem cerimônia foi direto à mesa, pegou uma taça, encheu de saquê e bebeu. Depois comeu três pedaços de manju. Ela tentou entabular conversa amigável com os amigos de Cláudio Seto. O diacho era que toda vez que chegava perto, os caras se afastavam assustados.

A senhora então começou a azucrinar os amigos de Seto. Eles se preocupavam com um problema: as horas passavam e Seto não chegava. Na realidade, eles já não estavam se preocupando com a surpresa. Eles se preocupavam, agora, com o que diriam ao amigo quando chegasse e encontrasse a senhora cantante de tango em sua casa enchendo a cara de saquê. Uma coisa era certa: o mais otimista dos amigos de Seto concordava que a festa surpresa para o aniversário tinha se transformado num enorme fracasso. E só por solidariedade, ninguém foi embora. Todos deviam uma explicação a Cláudio Seto. Eles sentaram pelos cantos, ficaram de cabeças baixas, quando, como na história da Bela Adormecida, as doze badaladas da meia-noite bateram na sala da casa de Cláudio Seto.

continua após a publicidade

E quando elas terminaram de bater, a senhora deu pulo no centro da sala e começou a tirar a roupa para evidente pânico dos amigos do aniversariante. Eles nunca viram um strip-tease de uma senhora nipônica que cantava tango. No entanto, quando ela terminou, eles observaram boquiabertos que por baixo do vestido a mulher usava calças masculinas e que ela era ninguém mais, nem menos que o próprio Cláudio Seto, que tirou onda em cima dos amigos. Ele explicou que se aproximava de casa e um vizinho o informou da armadilha (foi assim que chamou a festa surpresa) e então ele decidiu criar outra surpresa para surpreender os amigos que queriam surpreendê-lo. Vestiu-se de mulher, entrou na festa e azucrinou todo mundo. Esta foi a história que Cláudio Seto me contou. Na versão original não havia tango. Mas aproveitei a história do velho amigo para homenagear a maior cantora japonesa deste gênero musical.