Enquanto esperava na fila para ser atendido no banco, eu ouvi a história de Maria Hortência e seu filho Vinicius que tocava trompete. Agora não é mais fila, é anfiteatro improvisado para os clientes apreciarem placa eletrônica apitando números das senhas. As filas estão cada vez mais lentas e acho que seria boa ideia os bancos colocarem televisão e apresentarem curtas-metragens de jovens cineastas brasileiros, que fazem coisas boas, mas não divulgadas. É uma forma de incentivar o cinema nacional, dar um troco para os cineastas, aumentar a cultura do povaréu unido que jamais será vencido e com isso os bancos não vão ficar mais pobres. A ideia veio depois de ouvir a história de Maria Hortência. Se no áudio foi interessante, no audiovisual presumo seria melhor.

continua após a publicidade

A história de Vinicius, caçula de cinco irmãos, é a seguinte. Era bom rapaz, ia ao mercado com a mãe para voltar com sacolas pesadas, claro! Moço sensível: ele tocava trompete na banda da igreja. Entre todos, era nele que Maria Hortência apostava as fichas de mãe que sonha com família perfeita. Ele ia encontrar moça boa, religiosa, temente a Deus e de boas maneiras. Mas isto não aconteceu. Vinicius apareceu com Larissa. Ela até gostou do nome da moça. Mas não da moça. Primeiro achou que era mania de sogra invocar com nora. Mas quando contou o drama para Adelaide, a vizinha, a outra levou mão à boca e exclamou, perguntando: “Meu Deus do céu, Dona Hortência! O que o Vinicius tem na cabeça?”.

O que o Vinicius tinha na cabeça ela descobriu um ano depois. Um par de chifres maiores que os de um nelore. Aos quais Vinicius não dava importância, porque eram chifres honestos. Verdade seja dita, antes de se enroscar com ele, Larissa confessou: “Olha amor, tudo bem que você quer ficar comigo! Mas eu não dou exclusividade para ninguém”. E assim tiveram um filho que Hortência não duvidou que fosse seu neto porque era a cara de Vinicius. Para não sofrer muito ela achou melhor não dar palpite na vida dos dois. Afinal, o filho dizia que era feliz. Mas quando soube de uma novidade, para não dar nó na cabeça, Hortência procurou Adelaide de novo. Só para esclarecer um problema e não cometer injustiça.

Adelaide disse: “Pode perguntar!”. Hortência perguntou: “Se uma mulher casada sai com outra mulher, é adultério?”. Adelaide desconfiou ser coisa entre Vinicius e Larissa. Mas o diacho era que ela não tinha certeza: ela achava que adultério era mulher sair com outro homem que não fosse o marido e vice-versa. Mas, no caso de mulher sair com mulher, se ela estivesse rejeitando o marido, seria adultério. Por isso perguntou: “Ela rejeitou o marido?”. Hortência disse que não e Adelaide disse que não sabia responder. E o caso ficou assim. Hortência fechou o bico e Adelaide ficou curiosa. Passaram semanas, dois meses, e ela perguntou para Hortência como estavam Vinicius e Larissa. Hortência respondeu que tudo bem. Adelaide não acreditou.

continua após a publicidade

Depois soube pelo pastor que Hortência não se preocupava mais com as estripulias sexuais de Larissa, porque apareceu algo pior. “Pior do que aquela orgia? Não acredito! O que foi pastor?”, indagou. Ele disse que Larissa entrou para o tráfico e virou drogada – ou vice-versa. Enquanto isso, Vinicius tocava trompete na igreja. Ninguém entendia nada. Adelaide estava ficando maluca. Queria saber como aquilo ia terminar. E terminou de forma trágica, claro! Larissa arrumou um sujeito chamado Capataz que tentou botar ordem na história. A primeira coisa que ele fez foi matar Vinicius. Larissa não gostou, o abandonou e ainda o denunciou por homicídio. Capataz foi preso. E agora Larissa está sozinha. Hortência tenta ser bacana com Larissa, porque gosta do neto e tem medo que ela o afaste da avó. No fundo, ela torce para Larissa ser atropelada e assim ela ficar com o neto e cuidar dele até ficar grande, porque ele é a cara de seu filho Vinicius. Eu não soube mais porque a placa eletrônica do caixa chamou o número 278. Que era o meu.