Vitória conservadora

Nas últimas eleições congressuais na Europa, havia uma sinalização de guinada para a esquerda. É uma tendência que vem desde a derrota de John Major para Tony Blair na Inglaterra. A vitória de José Luís Zapatero na Espanha confirmava a tese. Mas os três últimos pleitos europeus mostram que a onda agora é o conservadorismo.

Começou com a volta de Silvio Berlusconi ao poder na Itália. Talvez um caso extremo, pois ele passa inclusive dos limites dos conservadores com um estilo exagerado, controlador e desastrado (vide as insólitas incursões com prostitutas na costa mediterrânea), o hoje primeiro-ministro abriu o caminho para outros colegas, certamente mais cautelosos, mas ao mesmo tempo de direita.

O segundo foi Nicolas Sarkozy, na França. Ele sucedeu outro conservador, Jacques Chirac, e mantém o seu país em alinhamento com uma política econômica ortodoxa e uma gestão diplomática sem maiores brilhos. O presidente francês também é mais famoso pela vida pessoal, principalmente pelo seu casamento com a modelo e cantora Carla Bruni – um desses casos em que a primeira-dama brilha mais que o chefe de Estado.

Depois, foi a ascensão da chanceler Angela Merkel na Alemanha. Vitoriosa nas eleições de domingo, ela é o símbolo de uma nova ordem conservadora. Mais discreta que Sarkozy e Berlusconi (bem, com este não tem comparação), ela não teve um resultado brilhante. Pelo contrário, foi o segundo pior resultado da União Democrática Cristã desde o pós-guerra. Mas venceu, na composição com o Partido Liberal, que deverá ter maior papel dentro do novo governo de coalizão.

E aí é que surge esta “nova ordem conservadora”. Sendo de esquerda ou de direita, qualquer governo precisa se preocupar com o bem comum. Até pouco tempo atrás, os chamados políticos de esquerda imaginavam que o mundo girava em torno do poder central, que era gestor e estimulador da economia e da distribuição de renda. Ao mesmo tempo, os chamados políticos de direita pregavam o liberalismo econômico e a mínima intervenção do Estado.

Neste “pós-modernismo político”, tais convenções viraram assuntos de arqueologia. Hoje, a sociedade quer saber de proteção, e esta vem necessariamente do poder público. Ao mesmo tempo, cansou-se de soluções estrambólicas e caras. Em resumo, não há mais esquerda e direita. Há visões diferentes para os mesmos problemas na economia, na saúde, na educação e na política.

Um exemplo claro é o Brasil. Luiz Inácio Lula da Silva abandonou a retórica agressiva de suas candidaturas anteriores para vencer a eleição de 2002. Assumiu e não mudou uma vírgula na política econômica implantada por Itamar Franco e incrementada por Fernando Henrique Cardoso. Alterou, sim, a relação com a sociedade, adotando programas de distribuição de renda (o Bolsa Família) e injetando dinheiro no setor produtivo para acelerar o crescimento. Mas a chave do cofre continua com um ex-tucano e ex-executivo de banco norte-americano, o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles.

Na Europa, também é assim, e será mais assim a partir deste segundo governo de Angela Merkel. Claro que não haverá intervencionismo econômico, mas é o poder central quem vai cuidar para que os efeitos da crise financeira internacional não afetem o poder de compra dos cidadãos alemães. E, como pediram os liberais após a eleição de domingo, serão necessários um “sistema fiscal mais justo”, “melhores oportunidades na educação” e “mais direitos civis”. São pedidos que, na década de 60, não partiriam nunca de um partido liberal. E que seriam descartados por uma chanceler conservadora. Mas hoje, em uma nova ordem, parecem muito naturais. Daí o surgimento deste novo estilo no conservadorismo europeu.