Existe a história que se conta nos livros de história e os detalhes omitidos porque a grande história prescinde dos detalhes. Não de todos, claro, mas da maioria deles. No entanto, enquanto a história se desenvolve, os detalhes são importantes. Um dos motivos alegados para a resistência ao deputado estadual Valdir Rossoni (PSDB) na condução da presidência da Assembleia seria o seu interesse em tentar desmontar a estrutura que se armou nos subterrâneos do Legislativo do Paraná, um verdadeiro poder paralelo que resiste às carreiras dos mais velhos parlamentares. A face visível deste poder apareceu no ano passado, personificado por um homem de aparência bondosa, quase gentil, chamado Abib Miguel, mas sobre quem pesava a acusação de desviar milhões de reais e de ser o verdadeiro soberano do parlamento paranaense.
Quem mandava – ou ainda manda – nos subterrâneos da Assembleia era a esfinge, que Abib Miguel herdou de outros tempos e que devorava quem não a decifrava – e decifrar significava desenvolver uma promíscua troca de interesses. Se Rossoni for eleito hoje, como tudo indica, para a presidência do parlamento do Estado, ele terá uma dura tarefa se realmente decidir enfrentar e derrotar os interesses escusos escondidos nos subterrâneos. Se ele não enfrentar, será mais um a ser devorado pela esfinge ou entrar para os anais como mais um conivente com os desmandos.
A tarefa que espera o próximo presidente da Assembleia não é das mais fáceis. Mas decifrado o mistério, e adquirida a autoridade que as ações éticas conferem, o novo presidente terá musculatura para oferecer transparência para a sociedade, divulgar as contas na internet, assim como divulgar os atos oficiais. E isto não será nenhum favor. A Assembleia Legislativa tem muitos desafios e dívidas com a sociedade paranaense, mas nenhuma dessas questões é tão importante quanto quebrar a inércia, romper a estrutura viciada e a situação de comodidade de quem está lá, seja pelo voto do povo, seja por uma canetada, ou até por um remoto concurso público.
Caberá ao novo presidente passar um corretivo moral em todo o funcionamento do Legislativo, e a tarefa não é fácil. Será marcada por resistência e conflito, tanto com parlamentares que montaram ou usufruem dessa estrutura há décadas, como com os funcionários da Casa – uma bomba prestes a explodir.
A realização de concurso público, questão de honra para a próxima Mesa Executiva, para substituir os atuais cargos em comissão por funcionários de carreira, pode gerar uma crise interna do tamanho do escândalo dos “Diários Secretos”. A sabotagem interna, o corpo mole e a pressão podem ameaçar qualquer boa intenção do novo comando da Assembleia, que precisará de respaldo dos demais parlamentares, independentemente se aliados ou de oposição, e, principalmente, da opinião pública, que também deve uma resposta à altura, já que, nas urnas, mostrou-se não estar assim tão descontente com os atuais deputados, já que reconduziu a maioria, inclusive os investigados, a um novo mandato.
Se Rossoni, segundo secretário da última gestão da Mesa, é a pessoa mais indicada para conduzir essa transformação, não sabemos, mas ele terá a grande oportunidade de mostrar que é este Napoleão que o Legislativo necessita. Ele poderá derrotar a esfinge, entrar para a história e transformar o resto em meros detalhes que serão esquecidos, porque feitos por gente insignificante e sem escrúpulos.