O silêncio e a palavra certa

Até agora nenhum palavrão. Nenhuma piada. Nenhuma basofia. Nenhuma jactância. Nenhuma frase descuidada revelando pretensão, soberba ou vaidade intelectual. Nenhuma cena constrangedora no sambódromo, embora o Carnaval não tenha chegado. Discrição total, recato e sobriedade, em todos os sentidos. A primeira grande obra da presidente Dilma Rousseff em suas poucas semanas no Palácio do Planalto é mostrar ao País e principalmente aos políticos que a rodeiam que é possível governar sem pirotecnias retóricas e malabarismos populistas. E, ainda assim, ou talvez por isso, ser respeitada da mesma forma.

Claro que é muito cedo para qualquer consideração a respeito do governo Dilma Rousseff e nem é esta a pretensão destas considerações. Nem seria precipitação, seria estupidez avaliar algo que apenas engatinha. Até porque, de acordo com as tradições republicanas, a própria oposição baixa guarda e poupa o mandatário de críticas ou estratégia mais agressiva antes de findar os primeiros cem dias de mandato. Mas que houve uma mudança salutar no comportamento do inquilino do Palácio Alvorada, morando temporariamente na Granja do Torto, não resta dúvida.

Ser governante não é a mesma coisa que comandar um programa de auditório em que o resto da nação é plateia. É algo mais parecido a comandar um navio, sempre atento às turbulências e não deixar que ele afunde, para conduzir a tripulação e tudo e todos que estiverem no barco a porto seguro. A princípio, isto parece óbvio. E se assim fosse, este tema, ora abordado, não passaria de redundante e supérfluo.

Mas vejamos o comportamento dos presidentes anteriores. Lula achava sensacional o seu senso de humor, sua capacidade infinita de fazer trocadilhos, alguns de mau gosto e seu vasto conhecimento para estabelecer comparações da política com o futebol e o sexo. Alguns gostavam, outros fingiam gostar e muita gente achava abominável. FHC não cultivava este estilo popular, talvez por isso tenha terminado seu governo tão impopular. Mas FHC não perdia oportunidade para deixar a nação inteira, e alguns correspondentes estrangeiros, conhecedores de quanto culto e intelectual ele ainda é. Inclusive emitindo frases que o populacho demorava um dia para entender.

Em seu curto reinado, Itamar Franco foi hilário, sempre ostentando uma expressão séria que mais o aproximava de Buster Keaton e o distanciava de Winston Churchill. Resgatar o Fusca foi uma decisão emotiva, mas ser fotografado num palanque do sambódromo ao lado de uma dama sem a parte inferior da lingerie, foi realmente espantoso. No entanto, estes três não passam de aprendizes em diatribes se comparados a Fernando Collor de Mello, que em dois anos e alguns meses de governo falou e fez de tudo. Uma de suas últimas frases, “não me deixem só”, foi tão mal interpretada que ele ficou só durante muitos anos.

Não é preciso chegar a José Sarney que não foi eleito presidente, embora tenha sido presidente por cinco anos. Sequer, como Itamar Franco, foi eleito vice-presidente pelo povo, para se sentir legitimado. E também não é preciso falar do estranho João Figueiredo, que disse: “Prefiro cheiro de cavalo a cheiro de povo”. O que todos demonstraram foi algo elementar. Mesmo um presidente, quando não tem coisa séria a dizer, o melhor é ficar de boca fechada. Dilma às vezes exagera em seu mutismo. Mas não é um exagero incômodo, desde que saiba falar – e tem feito – as coisas certas nas horas certas.

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