O mundo comemora nesta semana o vigésimo aniversário da queda do Muro de Berlim, último símbolo do comunismo que controlou a Europa Oriental desde o final da II Guerra Mundial. Era o ato decisivo dentro de uma revolução que varria o mundo, comandada pelas ações liberalizantes do então líder da União Soviética (que hoje sequer existe), Mikhail Gorbachev. Derrubar o muro que separava a Berlim Ocidental da Berlim Oriental também significou o primeiro passo para a reunificação da Alemanha, para a vitória da democracia e o final de uma era de indignidade.

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A chamada “cortina de ferro”, expressão criada pelo mítico político inglês Winston Churchill, transformava os países da Europa Oriental em verdadeiras caixas de surpresa. A imprensa estrangeira não tinha acesso livre a Tchecoslováquia, Romênia, Hungria, Polônia e ao bloco da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), por exemplo – e quando entrava lá, só ia onde era permitido, e onde o regime comunista poderia se jactar de seus avanços. É certo que lá a pobreza não grassava, que a educação era de boa qualidade e a saúde idem, mas faltava algo fundamental: a dignidade humana.

Era impossível manifestar opinião sobre qualquer assunto sem correr o risco de ser alvo de censura, prisão ou mesmo o desterro. A tragédia dos campos de trabalho forçado na URSS foi contada com brilhantismo por Alexander Soljenítsin em seu Arquipélago Gulag. Uma tímida tentativa de abrandamento do regime comunista, liderada por Alexander Dubcek, virou a Primavera de Praga e acabou reprimida com força pelos soviéticos, na mão forte de Leonid Brejnev. E sem falar na tirania de Nicolae Ceaucescu na Romênia.

Além disso, criou-se uma casta de burocratas que enriqueceram às custas do controle total da economia. Justamente o que se dizia das economias capitalistas pelos próprios comunistas – ou por apoiadores da causa que viviam no Ocidente. Cuba vivia a mesma situação. Quando se podia entrar lá, só se mostrava o lado bom. E, para piorar, em Havana havia (e há) pobreza explícita, mas os escritores fiéis a Fidel Castro sempre deixaram este assunto de lado.

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Quando se rompeu a barreira e se derrubou o muro de Berlim, percebeu-se claramente a mudança de foco. Como apontou a Agência Estado em despacho enviado no domingo: “Naquela noite, em 1989, anos de separação e ansiedade evaporaram diante da inacreditável realidade de liberdade e um futuro sem guardas de fronteira, polícia secreta, informantes e um rígido controle comunista. Os alemães orientais cruzaram a fronteira em suas motos, bicicletas ou nos tradicionais carros Trabants. Milhares de pessoas cruzaram a fronteira nos dias seguintes. As lojas em Berlim Ocidental ficaram abertas até tarde”.

Em resumo, era uma lufada de liberdade que se procurava pelos alemães orientais. Por mais que se diga que o capitalismo engoliu a população, que eles foram atrás de produtos industrializados e por isso foram “abduzidos” pela filosofia capitalista, o que havia de mais importante na Europa Ocidental era a democracia. Conviviam socialistas, democratas, cristãos, liberais, radicais, verdes e até os comunistas.

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Era possível ter um lado sem correr o risco de acabar preso ou degredado. Era possível crescer na vida através do trabalho, sem ter que se explicar a todo momento. Era possível conviver com o contraditório, vindo da imprensa, da sociedade civil ou mesmo dentro da política. Era a dignidade humana que se restabelecia dentro da alma dos alemães orientais. E não foi à toa que, rapidamente, todas as outras nações do império comunista foram se amoldando a uma nova realidade. Que certamente não é perfeita, mas que dá muito mais oportunidades para os cidadãos.