O interesse próprio

Aqui, neste mesmo espaço, já tratamos da gloriosa Escola de Governo, o encontro semanal do governador Roberto Requião (PMDB) com os secretários e assessores de segundo e terceiro escalões, transmitido pelas emissoras públicas da Rádio e Televisão Educativa do Paraná. Lá se fala de um Estado que nós, paranaenses, não conhecemos. Um Estado onde tudo corre bem, onde não há pobreza e violência, onde a saúde e a educação vão de vento em popa, onde só há investimentos bem feitos. Uma espécie de “Ilha da Fantasia”, com o governador sendo uma espécie de Ricardo Montalban do Palácio das Araucárias.

Se bem que, na série de televisão acima citada, o famoso ator não tinha um perfil tão agressivo quanto o de Requião. Tinha charme, estilo e até uma autoironia que não passam nem perto dos trejeitos belicosos do por hora mandatário do Executivo paranaense. Ao contrário, ele destila seu ódio contra aqueles que não concordam com seus desmandos, e usa da fúria para esconder os seus problemas e os de suas gestões.

Pois bem. A “Ilha da Fantasia” não deve conhecer os dados divulgados pelo Ministério da Justiça e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Se não recebeu do secretário da Segurança, Luiz Fernando Delazari, assíduo visitante da “ilha requiônica”, pode ler na imprensa – como na matéria da repórter Luciana Cristo, publicada na edição de ontem de O Estado: “Foz do Iguaçu, na fronteira do Brasil com o Paraguai e a Argentina, é a terceira cidade do País considerada com maior grau de vulnerabilidade à violência entre jovens de 12 a 29 anos. O ranking nacional foi apontado com base no Índice de Vulnerabilidade Juvenil à Violência (IVJ-Violência), pesquisa sobre a exposição de jovens à violência. Foram analisadas as 266 cidades brasileiras com mais de 100 mil habitantes, das quais dez municípios têm vulnerabilidade elevada. Junto com Foz, aparecem as cidades de Itabuna (BA); Marabá (PA); Camaçari (BA); Governador Valadares (MG); Cabo de Santo Agostinho (PE); Jaboatão dos Guararapes (PE); Teixeira de Freitas (BA); Linhares (ES) e Serra (ES). Conforme ressaltado pelo Ministério, muitas dessas cidades são de regiões metropolitanas, embora nenhuma capital apareça na lista. Entre as cidades paranaenses que fazem parte da pesquisa, as que aparecem nas primeiras posições são da região oeste, seguidas por cidades da região metropolitana de Curitiba”.

Esta é uma informação que nunca está na Escola de Governo – e vejam a importância da mesma. Temos uma cidade importante de nosso Estado com alto grau de vulnerabilidade para a exposição de jovens à violência. É uma tragédia urbana em Foz do Iguaçu. Mas caso o assunto surja numa terça-feira de “escolinha”, nem que mais tarde, no momento em que os jornalistas conseguem se aproximar do governador, será rebatida com impropérios. Como se tudo que acontecesse de errado no Paraná fosse culpa da imprensa e dos inimigos políticos de Requião.

O governador não consegue entender – ou não quer entender – que a vida é feita de vitórias e derrotas. Não somos perfeitos, não acertamos sempre. Quando acertamos, recebemos elogios – e as boas iniciativas do poder público são alvo da imprensa. Agora, quando se erra, todos criticam, não é? Se a imprensa desliza em algum instante, Requião é o primeiro a bradar aos quatro ventos. Mas quando acontece o contrário, é a “imprensa canalha”, como ele não se cansa de falar. Como se todos os jornalistas do Paraná se reunissem para decidir como falariam mal do governador, e não tivessem outra coisa a fazer senão achincalhar uma autoridade.

Fica evidente que não interessa ao chefe do Executivo estadual o que é de interesse público. O que importa é o interesse próprio, o que lhe convém – e os que os outros acham que convém ao governador. O resto, no que podemos incluir os assuntos que dizem respeito a todos nós, paranaenses, não entram na conta de Roberto Requião. E, por isso, nunca aparecem nas reuniões da “Ilha da Fantasia” às terças.