Mobilidade social

Uma das grandes vantagens de uma economia estabilizada é a promoção das classes sociais, mesmo que lenta. Isto ocorre pela possibilidade de economia, pelos investimentos, pela inflação baixa e pelo crescimento constante. Assim, quem ganha um salário razoável tem condições de vê-lo crescer na mesma proporção em que se sobe um posto de trabalho – ou, no mínimo, continuar no lugar. Só cai neste movimento quem perde o emprego ou quem sofre um choque brusco (morte na família ou acidentes com o patrimônio não segurado, por exemplo).

O Brasil vive quinze anos de estabilidade. Tivemos algumas chuvas e trovoadas, e nos últimos anos (com a exceção da crise financeira que começou em outubro do ano passado) estamos em curva ascendente. É um momento virtuoso semelhante ao dos primeiros anos do Plano Real, quando muita gente conquistou vitórias particulares – comprando a primeira casa, o primeiro carro ou fazendo a primeira viagem ao exterior.

Esta sensação positiva foi transformada em números pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). A avaliação do instituto foi destaque na edição de ontem de O Estado: “Sete milhões de pessoas ingressaram na faixa de renda média, que considera uma renda mensal per capita de R$ 188 a R$ 465, entre 2004 e 2008. Outros 11,6 milhões de indivíduos chegaram ao estrato superior de renda (renda per capita maior que R$ 465 por mês) no mesmo período. Considerando o ingresso nas faixas média e superior, o aumento de renda per capita atingiu 18,6 milhões de pessoas. Em contrapartida, a faixa de renda baixa, inferior a R$ 188 por indivíduo, perdeu 11,7 milhões de pessoas. No período, o aumento da população brasileira foi de 6,9 milhões de pessoas. “Há sinais da volta da mobilidade social no País, o que não se via até a década de 90’, afirmou o presidente do Ipea, Marcio Pochmann”.

E o que é a mobilidade social citada por Pochmann? É simplesmente a transição de classes possibilitada pela economia. Ela pode ser ascendente, como se nota hoje e como se notou com clareza no período do “Milagre Brasileiro” do início da década de 1970 (durante o regime militar). Mas também pode ser descendente, como claramente aconteceu na década de 1990, quando os desastrados planos econômicos dos governos de José Sarney e Fernando Collor de Mello cobraram um preço alto da população.

A representação indireta desta mobilidade social está nas ruas das grandes cidades, está no comércio e na indústria. Apesar dos resquícios da crise financeira, o ano de 2009 será positivo, com reaquecimento industrial, recorde pontual na venda de automóveis e eletrodomésticos e possibilidade de crescimento real da economia. Quem economizou também aproveita, adquirindo bens imóveis e literalmente “subindo na vida”.

Esta é uma grande vitória brasileira. Somos até traumatizados com a série de fracassos econômicos que passamos nos últimos 60 anos – como se fosse o resumo de nossa história. Inflação, descontrole público, erros de previsão e aventuras heterodoxas foram normais em vários governos, levando nossa crise a patamares inimagináveis. É só recordar que, quando entregou o cargo a Collor, Sarney deixou o Brasil com uma inflação de 81%. Ao mês.

Em vez de comentarmos o aumento galopante dos valores de produtos de todas as espécies, ouvindo aquele barulhinho irritante das máquinas remarcadoras de preços, podemos falar com alegria que há pessoas crescendo e melhorando de vida graças à estabilidade da economia. A manutenção dos números positivos deve ser o objetivo principal do governo federal, e terá que ser assim com quem passar a comandar o País a partir de janeiro de 2011. Que se discuta tudo durante o período eleitoral. Mas que ninguém se atreva a sugerir novas aventuras na nossa economia.