O debate sucessório ganhou novíssimos contornos com a entrada em cena da senadora acreana Marina Silva, que está de malas prontas para entrar no PV e anunciar a candidatura à presidência da República. Ainda ontem escrevíamos nesse espaço que a decisão de Marina deixou um tanto desarvorados os dirigentes do PT e, por tabela, o próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva que exalava por todos os poros a impressão de ter a seu talante o domínio absoluto da situação. A direção do vento parece ter mudado obrigando o chefe a rever os planos, e a solicitar da assessoria a feitura de rascunhos alternativos de engenharia política.

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Sua excelência acreditava, sabemos todos, que os fados o levariam a assistir de camarote uma eleição que daria oportunidade a um julgamento plebiscitário entre os oito anos de sua administração e o mesmo período em que Fernando Henrique Cardoso esteve no Palácio do Planalto. Por óbvio, os candidatos destinados a polarizar as atenções do eleitorado em 2010 seriam José Serra (ou Aécio Neves), correndo pela oposição e a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, na cabeça da chapa aclamada pela coligação partidária forjada por Lula.

Um dos ensaios propostos pelo presidente para possibilitar a Dilma a ascensão necessária de seu potencial eleitoral, para muitos analistas políticos, uma realização que exigirá esforço demasiadamente oneroso e cansativo, foi a sugestão de deslocar o deputado Ciro Gomes (PSB-CE) para a disputa do governo do estado de São Paulo, logicamente com o apoio indispensável (embora prenhe de ressalvas) do PT.

O dado curioso é que o deputado cearense aparece em segundo lugar na maioria das pesquisas sobre intenções de voto realizadas até o presente momento, sentindo-se o próprio seduzido a interpretar um papel que não estava em seus planos, mesmo com os inebriantes afagos ao ego sussurrados pela eventual probabilidade de disputar a cadeira de governador do maior estado da Federação.

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O aparecimento triunfal de Marina Silva fez a lógica da sucessão sofrer uma guinada brusca, com o surgimento de um terceiro nome egresso da base governista para ombrear-se com Dilma e Ciro Gomes. Este teria cutucado o presidente Lula, no jantar compartilhado pelos principais líderes do PT e PSB, na última quarta-feira, ao classificar como uma atitude temerária a aposta de todas as fichas numa candidatura única da base.

Para não perder o embalo, Ciro reafirmou que sua prioridade pessoal apoiada inteiramente pelo PSB é concorrer à presidência da República, considerando descartada a disputa pelo governo de São Paulo. Lula ainda acredita nessa aventura, mas já pensa no lançamento do deputado federal Antonio Palocci, ex-prefeito de Ribeirão Preto e ex-ministro da Fazenda que aguarda julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF), pela quebra do sigilo bancário do caseiro Francenildo Costa.

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Sobre o tal plebiscito alimentado pelo presidente Lula, Ciro declarou ver nele um sério risco de derrota do projeto governista, caso se insista na polarização entre tucanos e petistas. A argumentação incisiva do deputado confere realismo à percepção cada dia mais presente nas rodas políticas de Brasília: a favorita do presidente Lula para a disputa presidencial, a ministra Dilma Rousseff, ao que tudo indica não conseguiu convencer alguns setores importantes da base, tanto que o PV jogou sobre a mesa uma carta extremamente valiosa, propondo a alternativa eleitoral centrada na conduta ética e responsável da senadora Marina Silva. Há também rumores sobre um virtual desgaste da liderança exercida pelo presidente Lula, que teria alguma dificuldade para impor suas palavras de ordem sobre o heterogêneo conglomerado de partidos sob sua tutela.

O maior temor do presidente e seus operadores políticos é o esfacelamento da base aliada, aliás, ocorrência não improvável à luz dos nossos usos e costumes políticos que contribuiria para minar a aparente resistência do grupo reunido em torno de Lula. Fala-se também das pressões dos arranjos políticos locais e regionais. “Onde passa um boi passa uma boiada”.