Escalaram o presidente

O que menos um presidente da República precisa é de escândalos. Ou de amigos escandalosos. Pior, só mesmo os ex-amigos que viram inimigos escandalosos. Após a rumorosa investigação do caso do mensalão, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva percebeu que estava cercado por cidadãos escandalosos. A começar pelo próprio ex-ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, que não conseguiu ser o articulador político do governo e passou a ser um administrador do próprio poder e do poder alheio.

Uniu-se com todos aqueles que o PT tanto criticou desde a sua fundação, em 1980. Os fisiologistas, os reacionários, os carreiristas e os “filhotes da ditadura” correram para o governo Lula, esquecendo todo o passado – ao mesmo tempo que os petistas faziam a mesma coisa. Não daria certo. E realmente não deu.

Quando o então presidente nacional do PTB, ex-deputado federal Roberto Jefferson, iniciou a artilharia sobre José Dirceu (e em Lula por tabela), estava claro que a história não terminaria sem feridos. Alguns, de forma tão brutal que nada mais tinham a fazer senão fugir da vida pública, nem que fosse temporariamente. Foi o que aconteceu com os dois protagonistas do caso do mensalão. Dirceu e Jefferson, que ainda trocam impropérios pela imprensa e pela internet, foram punidos politicamente, e estão ainda na mira da justiça. Outros personagens da história, como o empresário Marcos Valério Fernandes de Souza, apontado como o operador do esquema de pagamento de propina à base aliada do governo federal no Congresso Nacional, e o ex-deputados federais do Paraná José Janene (PP) e José Borba (PMDB), também estão enrolados.

E aí entra o presidente Lula de novo na história. Ele foi “escalado” para ser testemunha no caso do mensalão, como contou a edição de quinta-feira de O Estado: “O ex-deputado federal paranaense José Janene, líder do PP na Câmara na época do escândalo do mensalão, arrolou ninguém menos que o presidente da República como sua testemunha nos processos que responde no Supremo Tribunal Federal (STF) por envolvimento no esquema de compra de apoio político denunciado em 2005. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi notificado pelo relator do processo no STF, ministro Joaquim Barbosa de que terá de ser ouvido como testemunha de defesa de Janene, que, por liderar um dos partidos envolvidos no escândalo, responde por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha. Outro réu no processo, o presidente nacional do PTB, Roberto Jefferson, também indicou o presidente Lula como uma de suas testemunhas. (…) Lula ainda não se manifestou a respeito”.

É uma tremenda saia-justa em que se coloca o presidente da República. Ele fica entre duas situações constrangedoras: ou entra em um caso que não o agrada, ou posterga ao máximo que puder o depoimento e passa como alguém que não quer falar sobre o assunto – daí é um passo para dizerem que ele está escondendo alguma coisa. Para quem o arrolou como testemunha, caso de Janene e Jefferson, é uma manobra e tanto, pois recoloca o assunto na linha de frente da política e dá visibilidade maior ao processo na mídia, permitindo que eles voltem a aparecer a pouco mais de um ano das eleições – e se eles ainda não podem se lançar candidatos, certamente terão seus “ungidos” para o pleito de outubro de 2010.

Ao presidente restam poucas opções. Informado do assunto pelo STF, terá que tomar uma decisão. Sabe que ela será mal-recebida. De qualquer forma. Mesmo assim, vai decidir. Certamente fará num movimento estratégico, agindo com rapidez, sem deixar margem para interpretações. Enquanto não chega essa hora, Lula deve estar pensando porque permitiu que José Dirceu comandasse toda a articulação política do seu governo. Também agradecendo que surgiu o “furacão” Dilma Rousseff para substituí-lo. E imaginando que, não fosse o mensalão, hoje ele teria um superministro com uma supervontade de ser um superpresidente.

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