Do próprio veneno

Nos últimos anos, mantendo sua perseverante meta de destruir todos os seus “inimigos”, o governador Roberto Requião (PMDB) criou um novo instrumento – o programa transmitido pela Rádio e Televisão Educativa do Paraná chamado Escola de Governo. Sob o pretexto de apresentar os feitos do Executivo, e de ser um canal aberto para o encontro das autoridades com a sociedade civil, a famosa “escolinha” serviu, em seus primeiros tempos, como um palanque para as grosserias verbais de Requião contra aqueles que julga estarem atrapalhando seu caminho, sejam políticos rivais, sejam profissionais de comunicação que simplesmente fazem seu trabalho, sejam empresários dos mais variados ramos, sejam membros do Poder Judiciário.

Só depois da ação judicial, que impediu o governador de fazer ataques pessoais durante a Escola de Governo, é que o mecanismo do encontro (transmitido ao vivo pelos meios estatais de comunicação “da Patagônia ao Canadá”, como se gaba Requião) se aproximou do que deveria ser. Mas, mesmo assim, sempre que possível o político dá um jeito de colocar críticas e ironias contra seus desafetos em veículos que não têm “outro lado”, só se preocupam em defender os feitos do líder – que aproveita, inclusive, para cacifar sua campanha ao Senado Federal na eleição de 2010.

Ontem, foi realizada mais uma Escola de Governo. Com os funcionários públicos de sempre no auditório do Museu Oscar Niemeyer, Roberto Requião fez sua apresentação de costume. Entre os destaques do encontro, o anúncio de anistia para municípios com dívidas junto ao Fundo de Desenvolvimento do Estado. O governador explicou que as dívidas impedem que as cidades obtenham empréstimos externos, e por isso a tomada de decisão do governo estadual.

Faltou, certamente, uma palavra do secretário da Segurança Pública, Luiz Fernando Delazari, (e do próprio chefe do Executivo estadual) sobre a tragédia acontecida em Curitiba no final de semana passado. A “chacina do Uberaba” convida os cidadãos à reflexão, pois um fato que já conhecido pelas autoridades de segurança não foi coibido, e a omissão oficial gerou a morte de oito pessoas inocentes. Mas como o secretário está fora do País, ficamos esperando esta manifestação.

Mas a “escolinha” de ontem não ficaria marcada nem pelo anúncio do perdão das dívidas. Nem pela ausência de Delazari. E sim por mais uma atitude grosseira do governador, que usou de termos chulos e racistas contra um pesquisador do Instituto Agronômico do Paraná (Iapar). Chamado ao microfone pelo próprio Requião, o pesquisador fez o que muitos na administração estadual gostariam, mas poucos têm coragem (ou ousadia): criticou a falta de incentivo à pesquisa.

A resposta? Uma série de brincadeiras (idiotas) com a etnia do funcionário, de origem oriental. “Japonês” foi o mais simpático dos adjetivos que Roberto Requião deu ao profissional, que virou “gafanhoto” e “kung fu”. Querendo, talvez, arrancar gargalhadas de seus áulicos, o governador atirou constantemente, tentando diminuir o pesquisador e chegando a anunciar uma ridícula demissão: “Tá demitido o japonês”, disse o mandatário.

Animado com as risadas e com os aplausos, ele começou a atacar o corpo funcional do Iapar, dizendo que não gostam de trabalhar. No final do discurso, pareceu retomar o bom senso, fazendo elogios aos que trabalham, mas terminou chutando o balde mais uma vez: “Kung fu, eles acharam que você dava conta de tudo. (…) Japonês fica então sem macarrão por quinze dias”.

Certamente, quando terminou a “escolinha”, Requião deve ter dado risadas do episódio com seus assessores, aqueles que acham que tudo que o governador faz é perfeito. Quando souber da repercussão negativa de seus atos racistas e mal-educados, vai dizer que a culpa é dos jornalistas, que só querem criar crises na administração pública. Já o pesquisador do Iapar vai poder colocar a cabeça no travesseiro e dormir sossegado. O que muitos não podem fazer.