Grande parcela dos integrantes da bancada do PMDB no Congresso Nacional faz parte de uma frente poderosa em ambas as instituições, a bancada ruralista, que se colocou em alerta máximo desde que o governo sinalizou estar prestes a assinar a portaria que atualiza os índices de produtividade da terra, uma das principais reivindicações dos movimentos sociais ligados à reforma agrária. Os índices definem o nível da produção que uma propriedade está obrigada a atingir para não se tornar passível de desapropriação para efeitos de reforma agrária.

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Estava marcada para ontem uma reunião dos dirigentes nacionais do PMDB com o ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, indicado pelo partido para a função. Segundo se apurou dos comentários correntes na capital da República o partido usaria todos os argumentos possíveis para convencer o ministro a não assinar a portaria, embora a atitude ponha o colaborador direto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em posição desconfortável diante do chefe do governo.

A posição do PMDB, que reflete a posição da bancada ruralista no Congresso é clara quanto ao repúdio pela assinatura da portaria que modifica os índices de produtividade da terra, está firmada no fato de que os ministros anteriores da pasta também se negaram a subscrever qualquer documento nesse sentido. O líder do partido na Câmara, deputado Henrique Eduardo Alves (RN), tem reiterado que o governo conduziu a questão de forma “inadequada”.

O argumento do líder tem alguma razão, porquanto a mudança de critérios sobre a produtividade agrícola tem sido procrastinada desde o primeiro mandato de Lula, quando o ruralista Roberto Rodrigues ocupou o cargo de ministro da Agricultura: “Se ministros anteriores de outros partidos não assinaram, por que um ministro do PMDB vai assinar?”, indaga Alves, reafirmando que Stephanes foi indicado para o cargo pela bancada e, por esse motivo, deve ouvir o partido antes de tomar qualquer decisão. O também ativo integrante da bancada ruralista, deputado Moacir Micheletto (PMDB-PR), assegurou não ver a menor necessidade de aumentar os índices de produtividade da terra, insinuando de forma até certo ponto açodada que o presidente Lula talvez tenha de decidir “se fica com a base de sustentação (do governo), ou com o Movimento dos Sem Terra”.

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Para o governo ficaria de bom tamanho resolver o imbróglio até a próxima semana, com a publicação da portaria no Diário Oficial da União (DOU), embora saiba das dificuldades para cumprir o prazo. A assinatura do documento está na dependência da convocação do Conselho de Política Agrícola, incumbência atribuída ao Ministério da Agricultura. De acordo com a assessoria da pasta, a convocação ainda não foi realizada pelo simples fato que os membros do referido conselho sequer foram escolhidos. Por sua vez, o ministro Reinhold Stephanes assinala a pretensão de fazer exatamente o que o governo determinar, ressalvando, porém, que o tema ainda tem algum tempo para ser analisado.

Em discurso durante a Bienal de Negócios da Agricultura, em Cuiabá (MT), no final da semana passada, a senadora Kátia Abreu (DEM-TO), presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), argumentou que aumentar os índices de produtividade é contraproducente para a agricultura brasileira, sobretudo, diante da crise que a atividade está atravessando. “Aumentar os índices de produtividade é punir a eficiência”, afiançou. A senadora disse, ainda, que as dificuldades da economia não estão sendo consideradas, pois a necessidade de aumentar os índices de produtividade será imposta mesmo que o setor se veja obrigado a pagar para produzir.

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Trata-se de uma lógica maniqueísta, pois o produtor que não conseguir alcançar a produtividade mínima exigida correrá o risco de ter a terra desapropriada. A portaria reajusta índices fixados em 1980 com base no censo agropecuário de 1975, mas os movimentos sociais pleiteiam a correção desde o II Plano Nacional de Reforma Agrária, em 2003, quando Lula se comprometeu a atualizar os referenciais. A discussão vai longe.