Balões de ensaio

Semana passada, o mundo parou em frente à televisão por pelo menos duas horas. Aqui mesmo, na redação de O Estado, o aparelho de televisão ficou ligado na CNN e na Globo News. Prostrados, jornalistas, advogados, bilheteiros, casais e desocupados acompanharam o trabalho desesperado em busca de uma informação: onde está o menino do balão?
Acompanhávamos o voo sem destino de um balão de hélio, que teria sido desprendido de um quintal por um garoto de seis anos. O menino estaria dentro do balão, que seguia pelo céu do estado do Colorado, nos Estados Unidos. Após um bom tempo, o artefato caiu em um descampado. Ao ser aberto, a surpresa: não havia ninguém lá dentro. As emissoras de televisão norte-americanas já bradavam que a criança poderia ter caído do balão em pleno voo.

E como ficariam os pais? Deveriam estar em estado de choque, mas todos comemoraram o fato de o garoto estar escondido dentro de uma caixa, no sótão da casa, no condado de Larimer. Foi um alívio no mundo inteiro. E uma romaria de repórteres de vários países até a casa do jovem, tentando ouvi-lo e a seus pais também.

Quando a CNN conseguiu uma entrevista exclusiva com a família, o menino Falcon Heene, o “protagonista” da história, falou que se escondeu “para o show”. Era o primeiro indício da armação, confirmada no domingo, como apontou a agência de notícias do jornal O Estado de S. Paulo: “O xerife do condado de Larimer, no Colorado, Jim Alderden, afirmou que o relato do casal Richard e Mayumi Heene de que seu filho de seis anos estava dentro de um balão que voava sem controle foi um truque publicitário. Alberden espera recomendar contra o casal acusações de conspiração, contribuição para a delinquência de um menor, falso relato a autoridades e tentativa de influenciar um servidor público”.

O motivo da aparição da família Heene? O desejo em aparecer em um reality-show, um destes programas em que se revela a intimidade dos participantes em casas com dezenas de câmeras. Como queriam estar na mídia, os pais de Falcon promoveram este circo, que foi acompanhado por sofreguidão pela mídia.

E quem está errado, além do casal Heene? Provavelmente a mídia, que foi enganada de maneira brilhante por dois interioranos dos Estados Unidos. Claro que houve todo o “protocolo” do anúncio de um artefato voando com uma criança dentro, e isto partiu das autoridades de segurança do estado do Colorado. Mesmo assim, caímos (nós, membros da mídia) como patos em uma história que não tinha um quê de verdade.

Ansiosos pela repercussão de um caso extraordinário, apressamo-nos em publicar manchetes sensacionais sobre o caso, sabendo que o público se interessa cada vez mais por dramas reais – justamente os pratos principais dos reality-shows. O “menino do balão” tomou conta dos sites de notícias, das rádios e da televisão por bom tempo, mostrando que somos reféns não só da luta desenfreada pelo fato, mas também do interesse da maioria do público.

É só pesquisar quais são as notícias mais lidas em portais como o G1 (da Rede Globo) e R7 (da Rede Record). São sempre assuntos bizarros, notícias estranhas e fatos corriqueiros de celebridades – ou nem tão célebres, como “Nana samba de minissaia na festa de bloco do Rio”. Um assunto como o do menino Falcon Heene é uma festa para a internet.

E não se pode dizer que os leitores, ouvintes e telespectadores são mais culpados que a mídia. Sim, porque eles só passaram a se interessar por este tipo de situação por conta das “descobertas” midiáticas. Somos responsáveis pela queda na qualidade da informação, e em uma notada despolitização do cidadão comum. Corremos o risco de ficarmos tal como o balão do Colorado: sem destino, movidos pelo desejo de aparecer e podendo cair a qualquer momento.