É comum na área da saúde o prolongamento da vida a qualquer custo e a cultura dominante da sociedade considera a cura da doença o principal objetivo. Por outro lado, ninguém parece perceber – ou querer tomar consciência – que uma grande parcela da população sofre de doenças que estão fora de possibilidade de curabilidade. Lenta e progressivamente, as patologias vão seguindo seu curso e evoluindo até a fase final da vida.

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Quantos sofrem de hipertensão, diabetes, cardiopatias e outras doenças crônicas com as quais temos de conviver? Nem por isso, estamos em fase terminal, mas necessitamos de cuidados contínuos, precisamos controlar a doença. Esse é o intuito dos cuidados paliativos ao propor um modelo de atenção à saúde que respeita a vida e, principalmente, a dignidade humana.

Aprender a lidar com as perdas em um ambiente no qual predomina o caráter premente da cura ou prevenção da doença é um desafio que poucos se propõem a discutir – e muito menos a enfrentar. Ajudar pessoas com doenças avançadas e potencialmente fatais e seus familiares em um dos momentos mais cruciais de suas vidas é o trabalho dos paliativistas, que envolvem não apenas médicos, mas enfermeiros, psicólogos, assistentes sociais e nutricionistas.

O termo paliativo deriva do latim pallium, manto usado pelos peregrinos durante suas viagens em direção aos santuários para protegê-los das intempéries. Em analogia, o cuidado paliativo tem o objetivo de proteger a pessoa doente durante seu último período de vida. No uso corrente, o termo paliativo tem uma conotação de inutilidade, ineficácia. Ao contrário, os cuidados paliativos são os únicos verdadeiramente úteis ao paciente que está morrendo, uma vez que o protegemos do sofrimento evitável, salvaguardando sua dignidade como pessoa até seus últimos momentos.

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Considerando o aumento de expectativa de vida da população é natural que, vivendo mais, tenhamos, em algum momento da vida, doenças que necessitem do controle da dor e dos sintomas. Dessa forma, a sociedade, as faculdades de medicina e os especialistas precisam voltar os olhos para a medicina colocada a serviço da dignidade humana. Nenhum paciente deve mais aceitar o prognóstico de que “não há mais nada a fazer”. Os cuidados paliativos devem ser oferecidos o mais cedo possível no curso de qualquer doença crônica potencialmente fatal, desde seu diagnóstico, para que não se torne difícil e nem traumatizante cuidar de seus dias de vida que ainda restam e que, em muitos casos, se prolongam muito além dos prognósticos dos céticos.

Trago comigo o testemunho de meus pacientes oncológicos que obtêm aumento da sobrevida apenas com o controle da dor e dos sintomas. Eles se tornam o exemplo de que é possível viver mais, com maior qualidade de vida e desfrutando ao máximo do convívio de familiares e amigos até o momento da morte. E quem sabe qual será esse momento?

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