As motivações sociais dos oftalmologistas brasileiros

Esperamos que um oftalmologista exerça competentemente aquilo para o qual foi preparado e que, além disso, seja um elemento integrado nas regras de convivência da sociedade na qual ele vive, um bom cidadão. Em nações organizadas e bem desenvolvidas, em que cada um já tem seu lugar e função, isso pode bastar. Mas num País como o nosso, em que ainda são patentes as desigualdades, espera-se dos que mais receberam em educação e bens materiais que ajudem os menos favorecidos pelas condições socioculturais.

E isso pode ser feito de vários modos, de acordo às aptidões peculiares de cada um. Quem souber planejar, que planeje. Os que tenham capacidade de organizar e liderar, que organizem e liderem. Quem prefira ações preventivas e curativas de saúde visual e ocular, que as exerça, engajado nesses programas ou projetos, ou em ações isoladas e individuais. Os que souberem se comunicar, que ensinem, divulguem.

Várias dessas participações de oftalmologistas, solidárias com os estratos menos favorecidos de nossa sociedade, são conclamadas por clubes de serviço, organizações não governamentais, ou mesmo pelo Estado em seus vários níveis em que a maior retribuição pelas atividades prestadas vem da própria noção do dever (social) cumprido e do correspondente aumento do prestígio da classe. Aliás, em busca desse reconhecimento social é que, vez por outra, surgem propostas "optométricas" para ações junto a escolas, bairros periféricos, comunidades isoladas e carentes, que exigem, entretanto, não apenas a pretensamente simples prescrição de óculos, mas cuidados oculares variados.

A indiferença com que se possa reagir a essa condição é, provavelmente, a pior das respostas. Representa omissão para com o "dever" adicional da cidadania superior e, simultaneamente, aceitação de que outros possam exercer seus atributos profissionais, por isso está fora de cogitações.

Não são necessários optometristas, pois oftalmologistas garantiriam atendimentos mais eficientes. Optometristas não são necessários, mas os interessados em que eles se tornem numerosos tentarão convencer políticos sobre que isso é conveniente.

Portanto, seja então por motivação altruísta, a do cidadão mais bem formado que se dispõe a ajudar o desvalido, seja a da motivação egoísta, do oftalmologista temeroso de que outra classe profissional possa vir a se mostrar interessante, tomando-lhe prerrogativas, faz-se conveniente a adesão do médico oftalmologista às campanhas e movimentos, ações organizadas ou isoladas, para a melhoria da saúde ocular e visual de nossas populações.    

No Brasil, existem aproximadamente doze mil oftalmologistas, espalhados por todas as regiões do País, detentores dos meios adequados e suficientes para fornecerem atendimento de alto padrão para a população. Somos os maiores interessados em encontrar formas de levar nosso conhecimento e o atendimento oftalmológico de qualidade para toda a população brasileira e estamos permanentemente abertos ao diálogo para discutir as propostas que tenham esse objetivo. O que não podemos concordar, entretanto, é na transformação de um ato médico em atividade mercantil. E com isso não concordaremos.

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