Parece que foi ontem que eu estava aqui rendendo o Edilson Pereira enquanto ele curtia merecidas férias. E cá estou novamente. Como me sinto com esta responsabilidade? Como aquele jogador de futebol que é chamado do banco para substituir o craque do time. Vou me esforçar para levar o time para frente e pelo menos não fazer feio diante do adversário, mas sei que não poderei protagonizar as mesmas jogadas geniais do craque. Porque craque é craque, por isso são sempre escalados como titulares.
Quem sai do banco na dura missão de substituí-los tem que torcer por um lance incrível, aquela jogada que pode definir uma partida e até um campeonato. É o tal negócio: tem que estar no lance na hora certa e no lugar certo para a bola bater e entrar no gol. Não importa se for na canela, na barriga, no papo, não interessa. O que importa é estufar a rede. E daí é só correr para o abraço e agradecer a Deus. Se bem que esta parte pode pular porque eu acredito que Deus não vê futebol. E vou explicar por que.
Dias desses o Edilson Pereira estava contando aqui na redação os bastidores das suas entrevistas com os Lendas Vivas, uma série que traça o perfil dos craques do passado, que atuaram no futebol paranaense. Se o amigo leitor gosta da história do futebol, com certeza deve conferir este material de primeira que a Tribuna publica semanalmente. Pois bem, segundo o Edilson, durante uma animada entrevista com um destes grandes atletas do passado, em determinado momento o boleiro fez uma revelação: para evitar que o juiz desse pênalti contra o seu time, arrastaram o jogador do time adversário para fora da grande área, se aproveitando de um momento de distração do homem do apito.
Depois forçaram a barra em cima do árbitro dizendo que a falta foi fora da área. Confusão, muito empurra-empurra, mas eles conseguiram o intento. A falta foi batida, não foi gol e eles saíram com a taça. Abismado com a ousadia, Edilson exclamou: “Mas isso é contra Deus”. E o boleiro respondeu de bate-pronto: “Deus não vê futebol, rapaz! Pare com isso”.
Tem muita malandragem no futebol dentro e fora de campo, mas nesse caso concordo com o veterano jogador, cujo nome Edilson teve o cuidado de não nos revelar. Deus não deve ver futebol não pelo fato de lhe faltar tempo, porque sendo o Senhor Supremo de todas as coisas, num mínimo gesto congelaria os relógios para ver tranquilo a partida de futebol e ao final do jogo aquilo significaria apenas um átimo de segundo na eternidade. Interesse também não iria lhe faltar se formos levar em conta que Ele está em todas as coisas e em todos os lugares, portanto tudo lhe diz respeito.
Mas o que falta é lógica. Imaginem um jogador pronto para bater o pênalti. Mentalmente ele está pedindo ajuda do Senhor para marcar o gol e ajudar seu time, certo? E adivinhem o que goleiro está pedindo? Evidente que ele reza para defender ou que no mínimo o outro chute para fora. Deus não tem como atender os dois. Não tem jeito: um vai festejar e outro vai chorar com toda certeza.
E outra coisa: existe uma coisa mais chata do que assistir a um jogo sem torcer? Deus não teria como torcer, posto que não há como os dois times saírem vitoriosos. Quando eu vejo técnicos e jogadores se benzendo e fazendo olhares de súplicas para os céus eu imagino que eles estão pedindo boa saúde, que a arbitragem seja justa, que as torcidas não se enfrentem como hordas medievais nas arquibancadas e fora delas, que ninguém se machuque em campo, enfim que o espetáculo seja bonito.
Só isso já dá um trabalhão para Deus. Alguns jogadores ainda tem que pedir para que sejam julgados pelas torcidas por sua habilidade em campo e não pela cor da pele. Tempos difíceis! Outros ainda duelam com adversários dentro e fora de campo. Quando termina o jogo, precisam driblar os credores porque não recebem os salários, uma situação que desestabiliza qualquer um. É o jogo da vida e nada como uma ajudazinha divina para suavizar a jornada. Bola pra frente!