Em que pese o fato de a letra da lei ser clara, não raro os credores pretendem que, ocorrendo o pagamento parcial do débito, a multa a que se refere o art. 475-J deve ser estabelecida sobre o montante total devido, ou seja, incluindo, inclusive, a quantia parcialmente paga.
Ocorre que, a nosso ver, o raciocínio é equivocado, seja pelo que dispõe a norma em sua literalidade, bem como pela sua essência e finalidade: desestimular a inadimplência.
PROPOSIÇÃO: Efetuado deposito em montante inferior ao da condenação, a multa do Art. 475-J do Código de Processo Civil incide apenas sobre o saldo remanescente.
JUSTIFICATIVA: O pagamento parcial do valor devido implica na aplicação do disposto no art. 475-J, §4º, do Código de Processo Civil, com a incidência da respectiva multa apenas sobre o valor remanescente. Veja-se que tal dispositivo leva à risca e escorreitamente os princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Não sendo observado, implica no enriquecimento ilícito do credor, bem como, de certa forma, no desestímulo ao pagamento da dívida, ainda que parcialmente.
(TJPR: Ag. de Inst. 713.052-3)
DECISÃO EM DESTAQUE
Exemplificando a situação acima transcrita, a Décima Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná julgou o Agravo de Instrumento n.º 713.052-3, publicado em 12/01/2011:
AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 713.052-3 – 17ª VARA CÍVEL DO FORO CENTRAL DA COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA.
AGRAVANTE: BRASIL TELECOM S/A.
AGRAVADA: M. T. D.
RELATOR: Des. MENDONÇA DE ANUNCIAÇÃO.
AGRAVO DE INSTRUMENTO – PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO – CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – DECISÃO QUE APLICOU MULTA DE 10% SOBRE O VALOR INTEGRAL DA CONDENAÇÃO – DEPÓSITO EM MONTANTE INFERIOR OCORRIDO ANTES DA DECISÃO VERGASTADA – PENALIDADE QUE DEVE INCIDIR APENAS SOBRE A DIFERENÇA – ART. 475-J, §4º, DO CPC – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
VISTOS, relatados e discutidos estes autos de AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 713.052-3, interposto contra decisão exarada pelo d. Juízo da 17ª Vara Cível desta Capital, em que é agravante BRASIL TELECOM S/A e agravada M. T. D..
Trata-se de AGRAVO DE INSTRUMENTO, com pedido de efeito suspensivo, interposto por BRASIL TELECOM S/A contra a r. decisão de fls.107 proferida na Ação de Indenização nº 1.704/2008 (118-TJ), movida por M. T. D. em face da agravante, que manteve a multa de 10% aplicada sobre o valor total devido, ante à inércia do devedor.
Relata a agravante, em suma, que, condenada ao pagamento de R$ 7.000,00 a título de danos morais, foi intimada a efetuar o pagamento do débito sob pena de multa de 10% sobre o valor total da condenação, sendo que um mês antes da referida publicação já havia depositado os valores.
Aduz que a decisão que delineou prazo para pagamento da condenação, sem a incidência da multa, foi publicada no dia 18/03/2010, sendo que o débito já havia sido quitado em 04/02/2010, conforme comprovante que afirma ter anexado.
Alega que não houve qualquer descumprimento que justifique a incidência da multa de 10% prevista no art. 475-J, do Código de Processo Civil, pelo que o processo deve ser extinto, com resolução do mérito, nos termos do art. 794, I, do mesmo Diploma Legal.
O pedido de efeito suspensivo foi deferido parcialmente para restringir a aplicação da multa à diferença não paga (fls. 133/134).
Requisitadas as informações, o Meritíssimo Juiz, às fls. 143, registrou que o agravante não deu cumprimento ao disposto no artigo 526 do Código de Processo Civil.
A agravada apresentou resposta às fls. 145/148, pugnando pelo não conhecimento do recurso, por ser ele intempestivo. No mérito, requereu o seu desprovimento.
VOTO
A agravada afirma que o recurso é intempestivo, ao argumento de que nele estaria sendo discutida questão coberta pela preclusão, porquanto em despacho anterior, datado de 17 de fevereiro de 2010, o magistrado singular havia consignado que a multa prevista no artigo 475-J do Código de Processo Civil deveria ser acrescida à condenação.
Ocorre que antes dessa decisão, dia 04 de fevereiro, a agravante já havia depositado o valor da condenação (pelo menos a maior parte dele), consoante se verifica pelo documento acostado às fls. 113-TJ.
Em momento posterior, não observando o dito depósito, o juiz “a quo” impôs à recorrente a multa contestada sobre o montante integral do débito, havendo insurgência tempestiva por parte da devedora, já que o prazo recursal, em face da decisão que efetivamente lhe causou gravame, iniciou-se em 19 de agosto de 2008 (fls. 127-TJ) e o recurso foi interposto no dia 27 seguinte (fls. 02-TJ).
O artigo 475-J, do Código de Processo Civil, dispõe:
“Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não o efetue no prazo de quinze dias, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de dez por cento e, a requerimento do credor e observado o disposto no art. 614, inciso II, desta Lei, expedir-se-á mandado de penhora e avaliação.”
Inicialmente é importante registrar que, inobstante ter havido certa divergência no passado, consolidou-se o entendimento de que para a contagem do prazo de incidência da multa pelo não-cumprimento voluntário da sentença, é necessária a intimação do advogado do devedor, no caso, a agravante.
Neste sentido:
“A Corte Especial deste Superior Tribunal, no julgamento do REsp n. 940.274/MS (Relator para o acórdão Ministro João Otávio de Noronha, maioria, DJe 31.05.2010) pacificou o entendimento segundo o qual a multa de 10% (dez por cento) prevista no art. 475-J do CPC depende do trânsito em julgado da sentença e da intimação da parte, por seu advogado, após a baixa dos autos à origem e aposição do “cumpra-se” pelo juízo processante” (STJ, Quarta Turma, AgRg no Ag 1286609/RS, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, DJe 01/10/2010).
Como dito, antes mesmo de ser intimada a pagar, a recorrente efetuou o depósito em favor da agravada, todavia num montante inferior ao efetivamente devido, haja vista que a Memória de Cálculo anexada às fls. 109v-TJ aponta que o valor do débito é um pouco superior ao depositado, havendo uma diferença de R$ 323,32.
O parágrafo 4º, do já citado artigo 475-J, preceitua que: “Efetuado o pagamento parcial no prazo previsto no `caput’ deste artigo, a multa de dez por cento incidirá sobre o restante.” Assim, a decisão vergastada deve ser reformada, acolhendo-se parcialmente a pretensão recursal, para que a multa em discussão incida somente sobre a diferença referida.
Em face do exposto, ACORDAM os Desembargadores da Décima Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná, por unanimidade de votos, em DAR PROVIMENTO PARCIAL ao recurso, nos termos do voto.
Participaram do Julgamento os Desembargadores FERNANDO WOLFF BODZIAK, Presidente, e VILMA RÉGIA RAMOS DE REZENDE.
Curitiba, 15 de dezembro de 2010
Des. MENDONÇA DE ANUNCIAÇÃO Relator