A imposição de avisos sobre os riscos dos alimentos e as restrições à publicidade

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Oscar Ivan Prux

Começou uma nova polêmica desde que foi divulgada a notícia de que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária está estudando impor a obrigatoriedade de avisos quando determinados produtos alimentícios apresentam potencial de aumentar o risco de doenças para os consumidores. Há, igualmente, imensa preocupação com a obesidade (que só entre os jovens já atinge mais de 6 milhões de pessoas no Brasil) e os males que a ela estão associados, sendo que o consumo de certos produtos contribui em muito para esse quadro. Por conta disto, existe até a proposta de, tal como ocorre com os remédios, criar-se uma categoria de alimentos que ostentaria tarja preta como forma de informar quais os que quando ingeridos em maior quantidade, se tornam perigosos para a saúde do consumidor. Se implementadas essas medidas, portanto, além da tarja, poderão ser obrigatórios, por exemplo, avisos do tipo: “este produto contém elevada quantidade de gorduras trans. O consumo a partir de ‘x quantidade’ aumenta o risco de doenças do coração”.

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De parte de certas empresas produtoras (e das que comercializam, pois também têm interesses em jogo), surgiram algumas reclamações embasadas no fato de que, em se tratando de produtos que não apresentam alto grau de nocividade ou periculosidade, bem como, a produção e comercialização são legalmente permitidas, não se justificaria tal tipo de providência. Argumentam haver diferenças substanciais entre os produtos alimentícios que fornecem e, por exemplo, produtos como bebidas alcoólicas e tabaco (fumo), que estão sujeitos a numerosas limitações quanto a sua publicidade e venda. Por derradeiro, alegam as dificuldades com os custos que terão e até a impossibilidade de adaptar a rotulagem para colocar tantos avisos. Essas manifestações localizadas, porém, não têm sido maioria no segmento. Nota-se que o setor das indústrias que fabricam alimentos vem demonstrando preferir adequar-se a ficar contestando. É indubitável haver um esforço em desenvolver alimentos mais saudáveis, embora ainda não se observe o descarte da comercialização daqueles que apresentam alto teor de sal, sódio, açúcar ou gorduras trans/saturadas. Por evidente, as empresas compreendem que este é o prenúncio de uma senda inexorável, pois cresce a cada dia o nicho de mercado composto pelos consumidores que fazem suas escolhas observando e dando preferência aos produtos mais saudáveis.

Assim, sabem que se preparar melhor e primeiro, pode assegurar a certeza de levar vantagem no futuro. Na verdade, então, quem tem se insurgido contra estas medidas é o segmento integrado por aqueles que trabalham com publicidade e alguns veículos da mídia. E isto porque os estudos também incluem restrições à publicidade destes produtos (exemplo: limitação de horário em que poderão ser veiculadas). Em especial quanto aos produtos destinados para crianças, o sentido é seguir o implantado em vários países, que não só impuseram restrições quanto aos horários em que as publicidades podem ser veiculadas, como vedaram que elas sejam ligadas a personagens famosos para o público infantil. É fundamental considerar que a comunicação da empresa com o público consumidor de seus produtos, acontece não apenas com a rotulagem, mas principalmente através das diversas formas de publicidade, dos anúncios na internet, rádios e televisões, até panfletos que são distribuídos nos pontos de venda e nas ruas. Nesse contexto, setores direta ou indiretamente ligados com o marketing em geral e a publicidade em específico, incluindo de profissionais envolvidos e as empresas que atuam neste mercado (rádios, revistas, redes de televisão, jornais, etc.), sempre querem desfrutar de liberdade total. Conforme a mídia eletrônica tem divulgado, argumentam que o governo quer tutelar as pessoas, escolhendo o que elas podem ou não fazer, o que na ótica deles seria errado. Pintam um quadro teatralmente catastrófico, insistindo que as limitações à publicidade atentarão contra a liberdade de expressão e da imprensa e que os veículos de comunicação não terão como se manter, já que sustentados basicamente pela publicidade, sendo que sem imprensa livre não existirá democracia. Referem que, atualmente, 340 mil pessoas trabalham na “indústria” da comunicação e que, anualmente, formam-se mais de 35 mil profissionais, sendo que há que se garantir empregabilidade para todo esse contingente. Não comentam, porém, as razões pelas quais muitos outros países (85% dos 73 pesquisados pela Organização Mundial de Saúde) já tomaram essas medidas e nem quais os motivos para se permitir que empresas se comportem de uma maneira naqueles países e de outra no Brasil. E mais, nada mencionam quanto ao fato de que nos últimos 30 anos, houve um aumento de 4% para 18% no número de crianças e adolescentes do sexo masculino acima do peso (para as meninas foi de 7,5% para 5,5%), tendo com conseqüência um incremento significativo nas doenças associadas (fonte: Folha de São Paulo).

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A questão parece simples, o Código de Defesa do Consumidor prevê como direito básico do consumidor, a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos, incluindo quanto aos riscos que apresentem (art. 6.º, inc. III). No mesmo sentido, além de prescrever o direito a proteção da saúde, também inclui a educação sobre o consumo adequado dos produtos (art. 6.º, incs. I e II). Isto resume que regular essa questão, além de lícito, é adequado neste caso e mais não se precisaria dizer. Conclua-se, entretanto, refletindo que não se pode querer resolver os problemas financeiros de empresas e nem de emprego de profissionais a custa de riscos contra a preservação da saúde dos consumidores. O direito à vida supera qualquer outro.

Oscar Ivan Prux é advogado, economista, professor, especialista em Teoria Econômica, mestre e doutor em Direito. Coordenador do curso de Direito da Unopar em Arapongas-PR. Diretor do Brasilcon para o Paraná.