Panfletagem: a regulamentação desta forma de divulgação publicitária

Amparada pelo princípio da livre iniciativa, inscrito na ordem econômica constitucional (art. 170), a divulgação publicitária surge do interesse dos fornecedores no sentido de divulgar seus produtos e serviços. É de ser reconhecido, igualmente, que essa divulgação também interessa aos consumidores, que assim ficam mais informados sobre as opções existentes no mercado, podendo escolher a mais adequada ao seu interesse e capacidade financeira. Nesse objetivo, inclusive, esse processo colabora indiretamente para ajudar no implemento da livre concorrência, outro dos princípios da ordem econômica constitucional.

A publicidade, portanto, tem uma função social para cumprir e não cabe questionar sua existência, já que conta com permissivo legal e, em princípio, mostra-se contributiva para a estrutura do mercado consumidor. Entretanto, alguns métodos utilizados para a divulgação publicitária é que podem ser questionados. Um deles, a que vamos nos referir em específico, é o processo conhecido como panfletagem, tão do agrado dos fornecedores, principalmente nas grandes cidades. Este método de utilizar panfletos para divulgação de produtos e serviços costuma ocorrer por várias formas, sendo às principais: – a) o envio de mala direta através de correio (via postal); – b) a entrega domiciliar; – c) a distribuição em espaços públicos (cruzamentos em estradas, ruas, avenidas, praças, etc.) mediante a entrega de mão em mão para as pessoas que transitam por estes lugares.

Nesta conjuntura, independente do conteúdo do material publicitário que normalmente é entregue ao consumidor, ou seja, a consideração sobre aspectos como licitude, enganosidade ou abusividade da publicidade, cabe questionar o método em si pela qual ela é realizada. Consoante o que prescreve o Direito do Consumidor, os fornecedores precisam ter consciência de que são responsáveis pelo contexto inteiro que provocam nos processos que vão da produção até o consumo pelos destinatários finais (consumidores), incluindo todos os métodos, técnicas e fórmulas que utilizam no sentido de efetivar o fornecimento e isto durante toda a trajetória dos produtos e serviços no mercado. E, neste contexto, é que se revela inadequado o processo de panfletagem como forma de divulgação publicitária, e isto por vários motivos.

O primeiro deles, é que a panfletagem atinge de forma indiscriminada, tanto a consumidores, como a pessoas que não estão interessadas no produto ou serviço. Estes últimos – e que são maioria – acabam importunados por entregadores que em razão de receberem pela quantidade de panfletos que entregam, praticamente constrangem os transeuntes a pegar material que não lhes interessa. É comum ver-se pessoas que passam várias vezes no mesmo lugar, ao serem repetidamente assediadas, sujeitarem-se a acolher o panfleto, mesmo que para se livrar dele em seguida. Aliás, é habitual ver-se ambos – quem entrega e quem recebe – querendo se livrar do material. O entregador para fazer jus ao recebimento por seu trabalho e o recebedor porque o material não lhe interessa.

O segundo, diz respeito aos locais em que acontece a panfletagem. É freqüente observar-se entrega de panfletos em cruzamentos de rodovias, ruas ou avenidas movimentadas, colocando em risco (de acidente) não só quem entrega os panfletos, como aqueles que o recebem. Inclusive, quando acontece o emprego de menores que arriscam a vida em meio a tráfego intenso, isto representa claro atentado contra a dignidade humana, seja pela exposição ao sol (e, às vezes ao frio ou a chuva) a que são submetidos durante longas horas, seja pelo perigo que os acompanha permanentemente nesta tarefa de entregar panfletos em via pública. Reitere-se quanto a isto, que o fornecedor sempre é responsável por todos os processos que enceta desde a produção até o consumo, incluindo as técnicas e métodos que utiliza como processos para divulgação e fornecimento. E, em terceiro lugar, cabe referir a questão ambiental.

Desde sua confecção até a entrega, o panfleto tem capacidade imensa de gerar poluição. Inicia quando é feito o papel, produto que contribui para redução do número de árvores benéficas a qualidade ambiental e, ao final do processo, prossegue quando o panfleto transforma-se em lixo, capaz de incomodar aqueles que por ele não se interessam e acabam ficando com um papel na mão (ou solto no interior de seu carro), tudo sem contar que este material quando espalhado nas ruas prejudica o visual, entope bueiros, demanda mais lixeiras e serviços de coleta de lixo, todas conseqüências indesejáveis. Por fatores como estes, pode-se entender como isenta de problemas a panfletagem dentro do estabelecimento comercial do fornecedor e até a que acontece por mala direta, mesmo que importunando em parte os recebedores que não se interessam em receber tanto volume de material publicitário. Contudo, as demais externalidades perniciosas autorizam a reprovar a panfletagem em locais públicos. Tal como já está acontecendo com a recriminação da poluição visual provocada pelo excesso de outdoors em locais inadequados, a panfletagem, quando destinada a acontecer em locais públicos, precisa receber legislação específica que venha a coibi-la ou, ao menos, estabelecer uma regulamentação suficiente para que seja adequada a cumprir a função social que lhe é estabelecida. Este propósito não deve obscurecer a importância da publicidade para a coletividade e para a proteção dos interesses dos consumidores.

Note-se que ao disciplinar/regulamentar esta atividade, emergem, igualmente, muitas vantagens para os fornecedores, pois pessoas importunadas pela panfletagem visualizam com pouca ou nenhuma simpatia os produtos ou serviços anunciados e a imagem da empresa que está utilizando este tipo de divulgação publicitária.

Oscar Ivan Prux é advogado, economista, professor, especialista em Teoria Econômica, mestre e doutor em Direito. Diretor do Brasilcon para o Paraná.