“Open bar”: bebida alcoólica à vontade por preço fixo é legal?

Oscar Ivan Prux

A Lei n.º 8.078/90 (Código de Proteção e Defesa do Consumidor) surgiu não apenas para sancionar más práticas, mas também para induzir bons comportamentos no mercado de consumo. Portanto, a racionalidade e os bons hábitos devem ser um dos atributos das relações de consumo. Nesse sentido, é importante considerar que não basta o produto ou serviço agradar ao consumidor para que esse objetivo se cumpra. Situações há em que aquilo que o consumidor quer e o mercado incentiva para viabilizar sua atividade econômica, em verdade prejudicam o contexto social e ao próprio consumidor. Principalmente, quando a relação de consumo afeta a qualidade de vida do adquirente (consumidor) ou é prejudicial às demais pessoas, há que se impor regras restritivas ou proibitivas para disciplinar essa questão. Esse é o caso de bares, boates e outros tipos de locais de lazer ou casas de espetáculo que vendem ingressos que dão direito ao consumo de um determinado número de doses de bebidas alcoólicas. E em situação mais gravosa, dos chamados “open bar” ou nome que tenta conferir grife a desaconselhável prática que consiste em cobrar a entrada, permitindo quem ingressa beber à vontade. Esse sistema não está sendo preferido somente por uma quantidade enorme de estabelecimentos comerciais, mas tem tido a preferência inclusive em festas abertas ao público (organizadas como forma de diversão, arrecadar recursos para entidades, dinheiro para formaturas ou outros objetivos). Há quem aprecie com moderação o fornecimento da bebida em quantidade livre, mas esses sabem que estão pagando mais do que consomem para compensar o exagero dos demais (é a lesão econômica). De outro modo, o preço único englobando qualquer quantidade de bebida alcoólica incentiva que o consumidor se exceda e até possa chegar à embriaguez, seja para desfrutar o mais amplamente possível do dinheiro que gastou para participar do ambiente, seja para alimentar sua cultura de transgressão ou saciar seu vício já instalado (alcoolismo). Nesse contexto, principalmente os jovens são atraídos para ambientes onde esse excesso no consumo se torna comum, provocando confusões, problemas com a chamada “Lei Seca” e, em especial, danos à saúde e segurança do consumidor, bem como enormes prejuízos à saúde pública que tem de atender pacientes com conseqüências imediatas das bebedeiras, as doenças dos alcoólatras e as vítimas de atos de violência fruto da embriaguez ou acidentes provocados por motoristas embriagados. Tudo sem contar os gastos impostos aos contribuintes com a segurança pública, pois atualmente basta que exista um evento desses com a participação de mais de uma dúzia de pessoas para ser necessário haver segurança privada e/ou pública, pois comportamento civilizado nem sempre é uma característica de significativa quantidade de pessoas que freqüentam esses locais. Se até para comida e refrigerantes não é recomendável que a pessoa exagere simplesmente por conseguir quantidade livre por um preço único, que dirá em relação à bebida alcoólica. Não se trata apenas de um discurso moral, mas de uma análise com base em normas legais. As bebidas alcoólicas integram o rol das chamadas drogas lícitas que têm sido permitidas/toleradas pela sociedade, mas existem vários dispositivos no CDC que abominam essas práticas. A começar pela publicidade que é considerada abusiva sempre que seja capaz de induzir o consumidor a se comportar de maneira prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança (parágrafo 2.º, art. 37, do CDC). E é exatamente o que acontece quando é alardeada a possibilidade de, pagando a consumação para entrar, poder beber à vontade. Também é prática abusiva, pois se trata de venda casada, já que são incluídos conjuntamente e sem possibilidade de separação no preço fixo, tanto a entrada e o entretenimento (normalmente, música ou show), quanto à bebida paga pela média estipulada para os presentes e não pela quantidade efetiva,mente consumida pelo participante (CDC, art. 39, inc. I). A Política Nacional de Relações de Consumo, dentre outros objetivos, visa o atendimento das necessidades dos consumidores, com respeito a sua dignidade, saúde, segurança, proteção de seus interesses econômicos e melhoria da qualidade de vida (CDC, art. 4.º). Ora, havendo incentivo ao consumo excessivo de bebidas alcoólicas corre risco a dignidade desse consumidor, sua saúde e segurança, bem como, a segurança daqueles que mesmo se comportando bem e tendo apenas a lesão econômica de pagarem uma quantidade de bebida que não consomem, pelo simples fato de estarem nesse ambiente ou por terem a infelicidade de cruzar com alguém que saiu de algum desses locais após exagerar no consumo de bebida alcoólica, podem ser atingidos por atos danosos praticados pelo embriagado.

Portanto, é indubitável que se trata de prática abusiva que devem ser coibida. E sob o ponto de vista das sanções administrativas, dentre outras penalidades, essas infrações estão sujeitas da aplicação de multa até a cassação de licença do estabelecimento ou atividade.

Simplesmente por alguns defenderem estar na esfera da liberdade pertinente a cada um, nossa sociedade tem sido excessivamente permissiva com abusos em relações de consumo. Todavia, para tudo deve haver limites e a legislação estabeleceu esses parâmetros. Independente do aspecto moral que não se pode olvidar por merecer a maior relevância, é comprovado que a tolerância a más práticas, em especial quando há infração de normas legais em matéria de consumo, não produz bons resultados, seja para os consumidores envolvidos, seja neste caso, para inocentes que acabem sendo vítimas de atos de quem esteja embriagado.

Oscar Ivan Prux é advogado, economista, professor, especialista em Teoria Econômica, mestre e doutor em direito. Coordenador do curso de Direito da Unopar em Arapongas-PR. Diretor do Brasilcon para o Paraná.

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