Considerado o contexto do Código de Defesa do Consumidor (Lei n.º 8.078/90), falar-se do ?princípio do equilíbrio? é laborar com importante matéria-prima da própria concepção do Código, idealizado no sentido de que o universo das relações de consumo apresente elementos contributivos para a justiça em prol de seus partícipes e da sociedade como um todo. Na ciência do Direito existe um certo consenso em torno do significado dos princípios, mas a expressão ?equilíbrio? possui inúmeras acepções. Sem mencionar um sentido especificamente jurídico, diz o Dicionário Aurélio que ?equilíbrio?, dentre inúmeros significados, representa ?igualdade absoluta ou aproximada, entre forças opostas?. É possível compreender esta proposição, mas, naturalmente, ela não representa a mais apropriada no contexto fático das relações de consumo. Nem mesmo é compatível com a mens legis (considerando-se que exista um espírito da lei) instituída no campo jurídico pelo CDC. Em primeiro lugar, não é adequado entender que o fornecedor e o consumidor sejam forças opostas a se confrontar no mercado. O fato de possuírem interesses diferentes não os torna antagônicos (nem os objetivos precisam ser opostos, nem as pessoas do fornecedor e do consumidor necessitam se digladiar para consegui-los). Na verdade, os interesses podem ser diversos, mas são complementares, sendo que fornecedores e consumidores bem-intencionados (impregnados em suas condutas da mais pura boa-fé nas vertentes subjetiva e objetiva) comungam interesses coincidentes devido a sua complementariedade. Os propósitos de um não podem se realizar sem a consecução dos interesses do outro. Não se concretiza a figura do consumidor sem que exista o fornecimento no mercado, assim como, sem ao menos um consumidor, o fornecedor não se viabiliza para assumir esta condição. Em resumo: os interesses de ambos os partícipes das relações de consumo (consumidor e fornecedor) são compatíveis e complementares, restando haver equilíbrio nas ações para uma materialização profícua para todos. E neste ponto, quando se pretende o cumprimento do princípio do equilíbrio nas relações de consumo, cabe não descurar da realidade de como acontecem estas relações. Existe uma notória desproporção de forças entre fornecedor e consumidor nas relações efetivadas cotidianamente no mercado. Esta a razão do CDC (estabelecido como norma de ordem pública e interesse social) ter sido estruturado levando em consideração a vulnerabilidade (às vezes, elevada ao grau de hipossuficiência) do consumidor, traço indelével a impregnar todo este contexto. O sentido estampado no CDC nunca foi o de norma opressora contra o fornecedor, mas sim de caracterizar-se como instrumento para alcançar a igualdade isonômica entre as partes, conforme prevista na Constituição Federal e isto só é possível com medidas que capazes de impor um equilíbrio real e não meramente teórico ou formal, sob pena de chancelar-se a injustiça nas relações de consumo. Essas relações são por demais importantes para que se possa aceitá-las com distorções intrínsecas, de forma que o respeito ao princípio do equilíbrio entre os partícipes da relação de consumo, liga-se fundamentalmente à correção das distorções à igualdade real provocadas pela vulnerabilidade ou hipossuficiência do consumidor frente ao fornecedor. Nesta conjuntura, a aplicação prática deste princípio permeia o conteúdo do CDC, tanto no que refere a esfera extracontratual, quanto na contratual (importantíssima por conta de que os contratos são os instrumentos de circulação de riquezas e forma de fazer a produção e a comercialização suprirem as necessidades das pessoas). Exemplos de disposições para concretizar o princípio do equilíbrio não faltam no texto do CDC como podemos citar, dentre outros: a) os direitos à liberdade de escolha e de igualdade nas contratações, previstos para a proteção dos interesses do consumidor (art. 6.º, II); b) o direito básico do consumidor à modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas (art. 6o, V); c) a facilitação dos direitos do consumidor, inclusive com inversão do ônus da prova à seu favor no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiência (art. 6.º VIII); d) a vedação de que o fornecedor prevaleça-se da fraqueza ou ignorância do consumidor, tendo em vista sua idade, saúde, conhecimento ou condição social, bem como, em qualquer condição, exija dele (consumidor) vantagem manifestamente excessiva (art. 39, incisos IV e V); e) a determinação de que as cláusulas contratuais sejam interpretadas da maneira mais favorável ao consumidor (art. 47); f) a previsão de que não pode o fornecedor estabelecer em detrimento do consumidor, obrigações que sejam iníquas, abusivas que coloquem a este último em desvantagem exagerada ou, ainda, que sejam incompatíveis com a boa-fé ou eqüidade, sendo considerada exagerada a vantagem que restringe direitos ou obrigações fundamentais à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou o equilíbrio contratual (art. 51, IV e § 1.º, II).
É, portanto, indispensável o reconhecimento e a aplicação do princípio do equilíbrio nas relações de consumo, pois ele permite que, para o consumidor a satisfação das suas necessidades se efetive de forma adequada e justa e, para o fornecedor, exista o benefício de estabilizar o mercado e contribuir para que o contexto destas relações aconteça de forma profícua, produtiva e serena em prol de todos os envolvidos melhorando sua qualidade de vida.
Oscar Ivan Prux é advogado, economista, professor, especialista em Teoria Econômica, mestre e doutor em Direito. Coordenador do curso de Direito da Unopar em Arapongas-PR. Diretor do Brasilcon para o Paraná.