O novo rol de procedimentos que devem ser obrigatoriamente cobertos pelos planos de saúde

Oscar Ivan Prux

A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) alterou recentemente, o rol de procedimentos que as operadoras de planos de saúde têm obrigação de cobrir nos contratos regulamentados (ou seja, de contrato firmado após 02/01/1999 ou de contrato anterior, mas que o consumidor optou pela migração para um regulamentado). Aproximadamente, cerca de 70 novos procedimentos que antes as operadoras se negavam a conceder aos usuários, impositivamente, a partir de junho passarão a integrar a cobertura mínima que deverá ser garantida em qualquer plano de saúde que seja comercializado. Assim, essas empresas terão de cobrir em seus contratos, procedimentos como a internação domiciliar quando necessária, a oxigenoterapia hiperbárica, o transplante de medula, o exame Pet-Scan, a internação psiquiátrica em casos graves, o implante de marca-passo multissítio e mais de duas dezenas de tipos de cirurgias torácicas por vídeo, bem como, várias outras coberturas que antes não constavam do rol. Ela faz uma necessária atualização que acompanha a evolução da técnica da medicina, acrescentando procedimentos que já estão se tornando rotina nos tratamentos médicos e hospitalares. Estima-se em 44 milhões de pessoas, o número de usuários que poderão ser alcançados por essas modificações e, não há dúvida que isso se afigura maneira de trazer determinados benefícios para esses consumidores e eliminar muitos conflitos. Todavia, não creio que essa novidade deva ser saudada com tanta efusividade. Ela repete uma prática que com vistas a contemplar o objetivo de beneficiar consumidores e operadoras (sem prejudicar a coletividade), na realidade não representa a formatação ideal do setor ou a melhor maneira de gerir a regulação. Tenho a concepção de que essa sistemática merece muitas críticas e tem produzido mais conflitos, do que soluções. Sei que esposo opinião minoritária e que entre os consumeristas justificadamente ferrenhos na defesa dos direitos dos consumidores, a maioria entende de forma diferente. Inclusive, existem aqueles que foram contra até mesmo a regulamentação dos planos de saúde, pois entendiam (e ainda entendem) que sem ela, os consumidores sempre tiveram a possibilidade de conseguir maiores benefícios acionando as operadoras através de processos judiciais.

Discordo totalmente desse ponto de vista. A judicialização da saúde é uma evidente demonstração de atraso civilizatório e por vários motivos. Em primeiro lugar, os Magistrados têm dificuldade em lidar com essas questões que envolvem o direito à saúde (e direitos humanos) e, na maioria dos casos, acabam concedendo tudo para quem merece e para quem não merece. Em segundo lugar, o custo decorrente dessas ações judiciais (seja de quem merece, seja de quem não merece) acaba aumentando o valor das mensalidades dos consumidores, afinal, a internalização deles é fenômeno econômico que acontece naturalmente, inclusive por conta de que é permitido pela legislação. Aliás, o setor é regulado, mas não tem mensalidades “congeladas”, de modo que elas podem subir de acordo com o aumento dos custos, superando a inflação do período. E isso, em especial nos planos empresariais, onde aumentos desse tipo já acontecem regularmente, mesmo sem acréscimo de coberturas. E com os aumentos, basta que um consumidor, por dois meses não consiga pagar sua mensalidade para que possa ter seu contrato rescindido, sendo desligado do plano de saúde.

Nesse contexto, entendo que o rol de procedimentos da ANS somente deveria ser atualizado quando, sem aumento de mensalidades, o equilíbrio dos contratos não fosse afetado. Não se trata de utopia, pois exames que no passado custavam fortunas, com o tempo se popularizaram e, atualmente, são realizados por valores bem acessíveis, o que mostra que isso é possível. E mais, propiciar segurança jurídica para esse tipo de contrato e deixar que a concorrência baixe os preços, representa estratégia que tirará esse setor de dentro dos tribunais, beneficiando aos consumidores que hoje arcam nas suas mensalidades, com coberturas asseguradas judicialmente (tanto as devidas, como as indevidas), acrescidas de honorários e custas judiciais que nada se relacionam com o tratamento médico ou hospitalar. E quando não conseguem arcar, por inadimplência perdem seus planos e são alijados desse mercado. Ou seja, perdem acesso ao serviço e não há Juiz que possa amparar com uma sentença aqueles que nem sequer têm um contrato (aqueles que possuem um contrato normalmente ganham seus pleitos na Justiça, mas quem não é contratante, nem mesmo tem direito de ação). Nesse contexto, para a ANS deve ficar reservada a regulação no tocante a coibição de práticas abusivas no mercado, asseguramento da existência de garantias para que as operadoras não caiam em insolvência, acompanhamento dos contratos e do desempenho do mercado e várias outras funções que podem auxiliar em muito para o funcionamento correto do setor.

Nesse mercado não existe ninguém satisfeito, sejam consumidores, sejam operadoras ou prestadores de serviços para estas. Inclusive, observe-se que as pessoas evitam, tanto quanto possível, utilizarem-se do SUS, nitidamente preferindo ter um plano de saúde, mas esse mercado não vem crescendo na proporção do aumento da população e, principalmente, do aumento da renda dos brasileiros. E isso acontece por conta dessa sistemática equivocada que requer uma reforma estrutural. Portanto, receba-se essa recente atualização do rol de procedimentos mínimos obrigatórios a serem cobertos pelos planos de saúde como uma medida paliativa (e aguardem-se as pretensões de aumento das mensalidades), mas que se reforme o setor para que, realmente, os consumidores possam auferir os melhores benefícios de seus contratos.

Oscar Ivan Prux é advogado, economista, professor, especialista em Teoria Econômica, mestre e doutor em direito. Coordenador do curso de direito da Unopar em Arapongas-PR. Diretor do Brasilcon para o Paraná.

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