Para muitos, o lazer resume-se a mero descanso do trabalho, enquanto para outros a mudança da atividade vai além da possibilidade de um merecido descanso do labor cotidiano, é representada por intensa atividade diferente daquela em que a pessoa trabalha. Neste segundo grupo, situa-se um significativo número de pessoas que escolhe descansar praticando esportes radicais. Para eles, é possível ?relaxar? mesmo quando se faz atividade que exige esforço e desgaste físico, desde que a mente seja favorecida pela mudança da rotina. Buscam, então, atividades intensas ou esportes chamados radicais, aqueles que segundo dizem, provocam muita adrenalina e os fazem esquecer dos problemas do dia-a-dia. Com base nesta realidade, nos últimos anos vem acontecendo um autêntico ?boom? de criação de serviços destinados a este tipo de diversão, um nicho de mercado que cresce na exata proporção do aumento do interesse por este tipo de lazer. Fazem parte do repertório que tem sido ofertado, atividades como escaladas de penhascos, travessia de corredeiras, saltos de paraglade e paraquedas, vôos de asa delta, mergulhos, prática de arvorismo, saltos de bungjamp e outras modalidades inventadas para agradar quem gosta deste tipo de aventura. A questão problemática destes divertimentos está em que muitos deles ensejam risco a integridade física dos praticantes, e até mesmo para terceiros que podem ser indevidamente atingidos por qualquer acidente. E, neste aspecto, a Lei 8078/90 (Código de Defesa do Consumidor), porta inúmeros dispositivos que, sob o aspecto geral, induzem para a proteção dos consumidores natos e/ou equiparados (quem adquire ou utiliza o serviço e quem pode ser vítima de acidente de consumo). Focando na prevenção, por exemplo, diz o art. 8.º: ?Os produtos e serviços colocados no mercado de consumo não acarretarão riscos à saúde ou segurança dos consumidores, exceto os considerados normais e previsíveis em decorrência de sua natureza e fruição, obrigando-se os fornecedores, em qualquer hipótese, a dar as informações necessárias e adequadas a seu respeito?. No mesmo sentido, os artigos 14 e 20, do mesmo código, prescrevem para o fornecedor, severa responsabilidade civil pela modalidade objetiva sempre que acontecerem acidentes ou incidentes de consumo lesando o consumidor ou o terceiro (bystander). Apesar destas prescrições legais, muitas destas atividades continuam sendo fornecidas sem maior cuidado e mediante uma quase total ausência de fiscalização, como demonstram as inúmeras notícias que a imprensa divulga a respeito de graves acidentes com resultados trágicos (mortos e feridos). Naturalmente, existem fornecedores que pautam seu fornecimento por padrões exemplares de segurança, inclusive reconhecidos internacionalmente, porém, infelizmente, isto não tem sido a regra em nosso país. Na prática, ainda existem numerosos casos em que o amadorismo destaca-se nestes serviços, principalmente porque faltam regulamentos estabelecendo os padrões mínimos de segurança em cada atividade. Quem faz turismo de aventura, já se acostumou a ver serviços desta espécie sendo fornecidos com segurança e profissionalidade, mas também a presenciar situações em que chama atenção a precariedade dos equipamentos e a primária capacitação daqueles que se dedicam a fornecer a atividade. Trata-se de situação em que, pela novidade, carece-se de regulamentação detalhada, com previsão de regras especificas de segurança e demais padrões de qualidade, normas estas que precisam ser de aplicação impositiva e produto de intensa fiscalização, com a respectiva punição de quem não adequar seu fornecimento de serviço ao que determinar a legislação. Note-se que o Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade (INMETRO) ainda não testou e definiu padrões de qualidade para todos os equipamentos que são utilizados e isto representa um problema, principalmente quando ocorrem improvisações (de equipamentos adotados para a prática). Outro detalhe: acresça-se a esta conjuntura, a circunstância de que, na maioria dos casos, não existem escolas para ensinar e orientar os profissionais que irão fornecer o serviço, além da carência de projetos para criar equipamentos com maior tecnologia em prol do conforto e segurança do consumidor que pratica a atividade. É de conhecimento comum que quem escolhe este tipo de lazer sabe que a atividade importa em riscos. Todavia, o importante está em entender-se que, o simples fato do consumidor querer o serviço e, ao firmar o contrato, manifestar sua concordância com o risco (mesmo havendo completa informação), tais circunstâncias não eliminam ou sequer diminuem os deveres dos fornecedores quanto à segurança que precisam assegurar para todos os envolvidos com o serviço. O argumento de que o risco faz parte da aventura buscada pelo consumidor e que sua eliminação poderia torná-la desinteressante não é motivo juridicamente eficiente para afastar destes serviços a incidência das já citadas prescrições do CDC. Por óbvio, divertimentos fornecidos para o lazer de destinatário final (consumidor) caracterizam-se como relações de consumo, sujeitando-se as mesmas regras que a Lei 8078/90 estabelece para os demais fornecimentos de serviços ao consumidor. Desta forma, importante assinalar que para os fornecedores, os deveres de qualidade vão além do simples informar adequadamente e obter a concordância na aquisição do serviço, mas necessitam garantir para o consumidor, os padrões ideais de segurança, sob pena do serviço não poder ser fornecido enquanto a tecnologia disponível e as práticas e equipamentos utilizados, não forem aptos para assegurar esta qualidade imprescindível e legalmente estabelecida.

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Oscar Ivan Prux é advogado, economista, professor, especialista em Teoria Econômica, mestre e doutor em Direito. Coordenador do curso de Direito da Unopar em Arapongas-PR. Diretor do Brasilcon para o Paraná.

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