Oscar Ivan Prux

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Há vários setores regulados na economia nacional. Um deles inclui a atividade da indústria farmacêutica. Contudo, a fiscalização que se centra principalmente na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), não tem sido suficiente para resolver todos os problemas que começam desde o registro dos remédios e chegam até as situações em que alguns deles acabam retirados do mercado por demonstrar que mais prejudicam, do que ajudam aos consumidores.

Essa problemática principia quando as empresas solicitam o registro de um novo medicamento. Por evidente, os registros pressupõem o cumprimento de certos requisitos, dentre eles a apresentação de estudos e pesquisas, mas estas últimas são realizadas pelo próprio laboratório que criou o produto, sendo que o órgão fiscalizador não possui condições efetivas de realizar outras pesquisas autônomas para comprovar a real eficácia do remédio. Aliás, a verdade é que ele nem mesmo está operacionalizado para reproduzir várias vezes as pesquisas que foram apresentadas, principalmente no que refere as que demandam longo prazo de execução e elevado número de pacientes mantidos em observação quanto aos efeitos do remédio.

Portanto, remanescem lacunas neste processo, pois são pesquisas mais profundas e de longo prazo que realmente comprovam a verdadeira eficácia de um remédio. É o que demonstram os sucessivos cancelamentos do direito de comercialização de remédios antes aprovados e muito utilizados, caso do Vioxx, Arcoxia (120mg), Prexige (400mg). Pode-se creditar mérito à Anvisa quando toma essas decisões, mas não se pode esquecer que quando isso acontece, milhares de pacientes já consumiram o remédio.

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É notório o dilema entre a segurança para os consumidores e o desejo da empresa em, o mais rápido possível, lançar o produto no mercado. Os próprios pacientes anseiam pelo surgimento de novas drogas com características mais eficientes. Porém, obter o máximo de segurança sempre demanda exaustivas pesquisas, demora no lançamento do produto e aumento de gastos, fatores que refletem no preço final do remédio e retardam ou dificultam o acesso ao consumo por parte dos doentes, principalmente os de menor poder aquisitivo.

O art. 10, do Código de Defesa do Consumidor, diz que o fornecedor não pode colocar no mercado produto ou serviço que sabe ou deveria saber apresentar alto grau de nocividade ou periculosidade. Quando o fornecedor sabe, trata-se de evidente má-fé e até da possibilidade de crime contra a saúde pública. Já quanto ao “deveria saber”, se está diante da imposição de que o fabricante tenha de realizar as pesquisas que possam garantir a segurança do produto. Quando ele não detectou o problema devido a não ter tomado essas cautelas no nível necessário, se está diante de um descumprimento da lei. Diferentemente da periculosidade inerente (normal e previsível) que é tolerada pelo direito, a periculosidade adquirida no processo de fabricação ou comercialização e a periculosidade exagerada resultante da fórmula lesiva à saúde do consumidore, devem gerar indenização, e isto independente de outras conseqüências (dever de retirar o produto do mercado, cessação do fornecimento e outras providências e sanções). Note-se que nos casos de periculosidade exagerada, os benefícios do produto não compensam os riscos ou danos que ele produz e quando tal acontece com remédios, é importante que a constatação dessa circunstância ocorra o quanto antes possível. Se, entretanto, a descoberta vier a posteriori, ou seja, depois que o produto já esteja sendo comercializado, existem deveres específicos para a indústria que o produz. A ela pertine a obrigação de atender ao estabelecido pelo CDC, art. 10, que assim expressa:

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“Parágrafo Primeiro – O fornecedor de produtos e serviços que, posteriormente à sua introdução no mercado de consumo, tiver conhecimento da periculosidade que apresentem, deverá comunicar o fato imediatamente às autoridades competentes e aos consumidores, mediante anúncios publicitários.

Parágrafo Segundo Os anúncios publicitários a que se refere o parágrafo anterior serão veiculados na imprensa, rádio e televisão, às expensas do fornecedor do produto ou serviço”.

Essas prescrições demonstram que não basta cancelar o registro do remédio, retirá-lo de comercialização e cessar qualquer tipo de fornecimento. Além da recomendação para não mais consumir o produto, os consumidores têm direito a serem informados das razões que provocaram sua retirada do mercado, assim como, das conseqüências para aqueles que o tenham consumido.

Incluem-se nesse contexto, desde recomendações como a do consumidor ir consultar um médico e fazer exames que sejam indicados, até quais as providências que o fabricante irá tomar para amparar os consumidores prejudicados pelo fornecimento danoso.

Ocorre que a indústria farmacêutica não está cumprindo este dever. Os consumidores têm sido informados apenas por notícias veiculadas na imprensa, quando esta descobre que determinado produto teve seu registro cancelado pela Anvisa, mas não através desses anúncios obrigatórios para o fabricante. Há uma diferença substancial entre uma notícia e um comunicado que cumpre o previsto no CDC. Independente desse tipo de comunicado assemelhar-se à contrapropaganda, com repercussões negativas para a imagem da empresa, as indústrias farmacêuticas não podem se eximir de respeitar a legislação, cabendo a Anvisa atuar com mais rigor nessa fiscalização. A par disso, que o consumidor evite produtos daqueles laboratórios que se omitem de assumir publicamente a periculosidade de um produto seu e de informar devidamente ao consumidor, conforme prevê a legislação.

Oscar Ivan Prux é advogado, economista, professor, especialista em Teoria Econômica, mestre e doutor em Direito. Coordenador do curso de Direito da Unopar em Arapongas-PR. Diretor do Brasilcon para o Paraná.