Quando o consumidor está comprando um seguro sem ser informado
Oscar Ivan Prux
O Código é de Proteção e Defesa do Consumidor (Lei n.º 8.078/90) e nele, conforme se percebe pelo contido no artigo 50, basicamente, estão prescritos dois tipos de garantia: a) a legal, dividida entre a que é estabelecida por lei e a que é fruto da teoria da qualidade. Quando a norma legal prescreve um prazo de garantia, ela é inafastável pelas partes, cabendo ao fornecedor simplesmente cumprir, vedada, inclusive, qualquer cláusula contratual para isenção do dever de indenizar. Eventuais discussões surgem quando a lei não prevê a garantia, mas é indubitável que produtos e serviços colocados no mercado devem apresentar características de segurança, durabilidade, desempenho e adequação (teoria da qualidade), e isso independente de qualquer documento nesse sentido entregue pelo fornecedor. Trata-se de uma espécie de implied warranty do Direito Inglês, ou seja, uma garantia implícita que os fornecedores devem assegurar ao consumidor no fornecimento de seus produtos e serviços. Aliás, fornecer o termo de garantia é impositivo para o fornecedor e tal prática só não está devidamente arraigada em nossos hábitos e costumes, por conta de que é comum os consumidores se esquecerem de fazer esse tipo de exigência. Mas por qual prazo deve vigorar a garantia não estabelecida por norma legal e quando não existe termo escrito? A doutrina diz que todo produto ou serviço tem um tempo de conservação seguido de um tempo de degradação. Com base nessa concepção, tratando-se de caso de garantia implícita, essa deve durar o tempo médio de vida útil do bem (conforme o estágio da técnica de produção/fabricação permite na média, antes da fase de degradação); b) o segundo tipo de garantia é de natureza comercial, também chamada de contratual. Através dela, valendo-se de recurso de marketing para atrair o consumidor para a aquisição do produto ou serviço, o fornecedor promete à esse uma garantia específica, ou seja, um período pelo qual assegura a qualidade do produto ou serviço, sendo que em caso de algum problema consertará ou trocará o bem.
Nesse contexto, pelo qual a garantia contratual é complementar a legal, ou seja, devem somar-se, surgiu a chamada garantia estendida. Por ela, a garantia comercial é prorrogada por mais algum prazo após o encerramento da garantia inicialmente estabelecida contratualmente. Ela é opcional e sempre importa em pagamento de uma nova quantia por parte do consumidor. E nessa circunstância de mercado é que se tem observado inúmeros problemas. Exemplo: desde o começo do processo existe uma falta de informação, explicando que, na verdade, não se trata propriamente de uma prorrogação da garantia original assegurada pelo fornecedor, mas sim de uma contratação de um seguro, que é pago de forma específica pelo consumidor. Segundo pesquisa da Fundação PROCON SP, um total de 71,26% dos consumidores (ou seja, a maioria) não são informados de que se trata da contratação de um seguro e não propriamente da prorrogação do prazo de garantia. E mais, a mesma pesquisa apurou que 31,03% não receberam sua via do contrato e entre aqueles que tiveram acesso a ela, 96,67% deles só a viu na hora da assinatura, sem poder ter conhecimento prévio das cláusulas e condições para poder analisá-las e refletir sobre elas. Na prática, então, é comum não existir esclarecimento prévio sobre as coberturas e as exclusões previstas nesse tipo de seguro, exatamente pelo fato da apólice não ser entregue oportunamente para o consumidor contratante. A pesquisa do ProconSP revelou, também, que dentre os consumidores que contrataram esse tipo de seguro, aproximadamente apenas a metade o utilizou, sendo que destes, um total de 56,25% tiveram seus pedidos rejeitados sob a alegação de mau uso do bem (e 25% sob a alegação da seguradora de que o consumidor não trocou o produto conforme estava previsto no contrato). E, por derradeiro, é importante notar que dentre as pessoas pesquisadas, nenhuma daquelas que tentou rescindir o contrato obteve a concordância da seguradora. Ou seja, mesmo quando não sirva para o consumidor, rescindir esse seguro inapropriadamente denominado de garantia estendida, é tarefa que só se consegue realizar pela via judicial.
Objetivamente, então, tem-se que os consumidores devem ser esclarecidos de que o contrato que os vendedores chamam de garantia estendida é, na verdade, um contrato de seguro, o qual deve ser previamente examinado e analisado em todas as suas cláusulas (principalmente coberturas e exclusões). Trata-se de um contrato idêntico a qualquer outro de seguro, tal como os de automóveis, de vida, etc. Por sua vez, o consumidor contratante deve exigir a respectiva apólice para ficar com um documento hábil para exigir seus direitos. E para concluir, um conselho para os consumidores: antes de decidir por aceitar qualquer oferta e contratar esse tipo de seguro, verifique se já não possui garantia legal que lhe assegure direitos suficientes para deixá-lo tranquilo caso o produto ou serviço apresente problemas.
Oscar Ivan Prux é advogado, economista, professor, especialista em Teoria Econômica, mestre e doutor em Direito. Coordenador do curso de Direito da Unopar em Arapongas-PR. Diretor do Brasilcon para o Paraná.