Oscar Ivan Prux
O mercado de seguros possui regras da regulação estabelecida pela SUSEP (Superintendência de Seguros Privado), um dos melhores exemplos de agente regulador que segue em muito as influências daquelas empresas as quais deve fiscalizar. Os interesses das seguradoras falam alto quando se trata de estabelecer regras nessa seara. E entre esses agentes, sempre acontecem tentativas de menosprezar e até ignorar o Código de Proteção de Defesa do Consumidor (Lei n.º 8.078/90), priorizando a legislação de hierarquia inferior editada exatamente pela SUSEP. Punições por abusos no mercado, mesmo que evidentes, são uma raridade digna de nota.
Pois bem, nesse cenário estão acontecendo generalizações e discriminações inconcebíveis para com determinados consumidores. A empresa que se habilita no mercado fornecedor, salvo razões permitidas textualmente na legislação (falta de estoque, impropriedade para o consumidor, etc.), não pode se negar a fornecer para quem se disponha a adquirir o produto ou serviço. Entretanto, esta ilicitude está sendo comum quando se trata de seguros de veículos para pessoas com idade entre 18 e 25 anos. Embora não digam expressamente, as companhias seguradoras estão se negando a fazer esse tipo de seguro para consumidores nessa faixa etária. E nem sequer apresentam o motivo explicitamente, apenas informando que a contratação foi recusada. Seguro envolve risco e a companhia pode e deve tomar suas precauções. Entretanto, não pode generalizar consumidores, rotulando-os previamente como desonestos. Existem jovens responsáveis e jovens irresponsáveis, sendo que é o histórico individual nos seguros que contratou que vai dizer da índole daquele determinado consumidor. E o cadastro das seguradoras é muito preciso e atualizado nesse sentido. O problema está na discriminação antecipada que considera a pessoa como de má conduta com base apenas em sua idade.
Note-se que até a prática de negar fazer seguro para quem está inscrito em bancos de dados de maus pagadores (como o Serasa), é questionável, pois o fato da pessoa ter deixado de pagar alguma conta não significa que se trata de um fraudador de contratos de seguro. Afinal, normalmente, o seguro é pago primeiro para ser usufruído depois. Aceite-se que quem, por sua culpa, teve dois sinistros no ano veja recusada a renovação de seu seguro, mas nunca que esse serviço seja negado para todos de determinada faixa etária ou para aqueles que apresentem detalhes desligados do mérito envolvido no contrato de seguro. Tratando-se de relação de consumo, é ilegal o fornecedor fazer indevidas generalizações negativas para os consumidores ou imputar prévias discriminações para negar a contratação de quem queira adquirir o serviço.
Certamente, a SUSEP não é a única que nunca consegue perceber ou saber em tempo dessas práticas abusivas no mercado de seguros, realidade que todos os que militam nesse mercado conhecem. Não há dúvida que o número de fraudes no mercado de seguros é elevado demais e que isso aumenta preços dos contratos e prejudica as companhias e seus clientes honestos. Todavia, o que se espera é rigor policial para essas situações criminosas e não que esse tipo de mazela decorrente da falta de idoneidade de algumas pessoas determinadas, seja justificativa para as companhias seguradoras adotarem práticas abusivas generalizadas, desrespeitando o Código de Proteção e Defesa do Consumidor. Muito menos que a SUSEP faça “vistas grossas” para esse tipo de procedimento irregular e não tome providências. Afinal, junto com a regulação do setor, também lhe cabe zelar pela proteção dos interesses legítimos dos consumidores. Para o consumidor que tem a contratação negada, é difícil fazer a prova da discriminação prévia, pois as companhias seguradoras atuam por corretores e não enviam justificativa escrita de suas práticas. Logo, se nada se modificar nessa conjuntura, necessário (e se almeja) que atuem as associações de defesa dos interesses dos consumidores, ou até que o Ministério Público investigue e constatando a prática abusiva (o que não será tão difícil), instaure inquérito civil para coibir essa irregularidade. Se as companhias seguradoras tivessem uma visão empresarial mais evoluída, por certo atacariam as fraudes de forma mais técnica e objetiva, sem, contudo, agir em contrário ao que prevê a legislação que regula esse tipo de relação de consumo; e isso mesmo que a SUSEP seja exemplo de beneplácito para com qualquer tipo de conduta que elas adotem. Afinal, ter práticas corretas e lícitas não deve depender de imposições da regulação, mas sim de um conceito que deve permear a empresa em todos os seus setores.
Oscar Ivan Prux é advogado, economista, professor, especialista em Teoria Econômica, mestre e doutor em direito. Coordenador do curso de direito da Unopar em Arapongas-PR. Diretor do Brasilcon para o Paraná.