Oscar Ivan Prux

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A privacidade das pessoas está acabando. E esta é uma circunstância que vai além das questões envolvendo as câmeras de monitoramento, atualmente muito freqüentes em ambientes fechados, bem como postadas em locais públicos por motivos de segurança. Há um interesse enorme das empresas em conhecer e utilizar as informações sobre hábitos e preferências das pessoas a fim de tentar aumentar a comercialização de seus produtos. Em nível mundial, há uma significativa preocupação com essa capacidade que elas têm de rastrear a vida dos consumidores, armazenando dados sobre eles e os utilizando para fins comerciais. Os computadores têm sido espécie de janelas e portas abertas para adentrar a intimidade das pessoas, em especial o consumidor. E, em países mais avançados, por exemplo, tendo em vista que o GPS existente no celular é obrigatório por motivo de segurança para localização da pessoa em caso de emergência há também outras formas de acompanhamento do consumidor, formas essas que logo estarão sendo praticadas em nosso país (se já não estão de forma sigilosa).

Aproveitando-se desse fato, então, certas empresas conseguem monitorar o consumidor e saber quando ele está passando próximo à sua loja, enviando-lhe via celular, mensagens sobre suas promoções, sinal de que aquela pessoa está sendo vigiada em seu trajeto. Nesse contexto, os cadastros valem muito dinheiro em um mercado nebuloso, no qual, às vezes, os dados acabam em mãos de quadrilhas pertencentes ao crime organizado. Esse perigo é real e merece cuidados especiais. Todavia, mesmo que ele não existisse, o simples fato do consumidor perder sua privacidade e poder ser importunado pelas empresas que desejam lhe vender produtos ou serviços é realidade que desde logo precisa ser planejada para adequado equacionamento.

O futuro chega rápido e precisa ser pensado e planejado com considerável antecipação. Vale referir, por exemplo, que conforme noticiou a imprensa, o Ministério Público intentou ação no sentido de que o GPS não venha a ser item obrigatório nos veículos novos, forma de preservar incólume a privacidade do consumidor. O mesmo tipo de questionamento judicial aconteceu na União Européia por parte de associações de proteção aos direitos dos consumidores, quando as montadoras de automóveis manifestaram o interesse de incluir nos veículos novos, um chip que lhes permitiria saber as condições de funcionamento do veículo e entrar em contato com o consumidor para ele efetuar eventual reparo na concessionária mais próxima. O problema detectado foi que esse dispositivo permitiria a montadora vigiar os destinos dos veículos e através de seus avisos, condicionar a troca de peças e venda de serviços, naturalmente atendendo primordialmente ao interesse da empresa fornecedora. Entretanto, a par dessas iniciativas pontuais, precisamos de legislação mais específica e contundente, estabelecendo como ilícito civil, a comercialização e/ou apropriação de cadastro que não seja autorizada pelo próprio consumidor (real ou potencial), bem como o monitoramento deste ou de seus hábitos, inclusive criminalizando as condutas mais agressivas e graves.

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As pessoas devem ter liberdade para fornecer seus dados para um ou vários fornecedores, mas isso não deve significar que esses dados possam ser transferidos para terceiros. Igualmente, determinadas pessoas podem aceitar serem monitoradas e até exteriorizar seu desejo de receber avisos publicitários, sujeitando-se voluntariamente a forma de agir dessas empresas. Portanto, salvo quando exista essa expressa manifestação escrita da pessoa, qualquer iniciativa dessa espécie deve ser considerada ilícita. Essa invasão da privacidade não pode acontecer impunemente, como se fosse uma espécie de externalidade inocente, fruto da natural atividade do comércio.

Que nossos legisladores (em sentido amplo, incluindo as Agências Reguladoras dentro de suas competências) e autoridades do Poder Executivo, se antecipem aos problemas que logo surgirão. É fundamental garantir efetivamente o direito à intimidade, estabelecido em nossa Constituição Federal e, em especial, que considerando as relações de consumo e suas implicações, os consumidores não sejam vítimas de qualquer prática abusiva dessa espécie.

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Oscar Ivan Prux é advogado, economista, professor, especialista em Teoria Econômica, mestre e doutor em Direito. Coordenador do Curso de Direito da Unopar em Arapongas-PR. Diretor do Brasilcon para o Paraná.