Oscar Ivan Prux
Publicitários e profissionais de marketing carentes de educação para o consumo e culturalmente pouco preocupados em dar importância para princípios éticos, tem a visão de que a publicidade existe apenas para que o produto ou serviço seja vendido, sob qualquer método. Esses profissionais praticamente passam ao largo do fato de que a publicidade tem a função primordial de dar conhecimento para o consumidor quanto a existência do fornecedor, da marca e principalmente do produto ou serviço cujo desejo é expor e divulgar para comercialização. A par disso, é através dela que as informações básicas a respeito do fornecimento chegam ao conhecimento dos consumidores, para que eles possam se decidir sobre realizar ou não a relação de consumo.
Entretanto, lamentavelmente, há um número expressivo desses profissionais cuja formação não contou com o ensino e aprendizado de princípios fundamentais da ética empresarial e da boa-fé objetiva, de modo que eles restringem sua atuação à tentativa de criação de necessidades (mesmo artificiais) ou, simplesmente, a busca de obter a venda utilizando de qualquer artifício malicioso, inclusive sob métodos que representam burla à legislação.
Pois bem, não têm sido poucas as situações nas quais o Judiciário atua para banir práticas abusivas ou desleais, assim como, para retirar dos meios de divulgação, publicidades enganosas ou abusivas. Essa realidade, entretanto, encontra dificuldades enormes quando se trata de meios eletrônicos e/ou virtuais. É verdade que quando o descumprimento da legislação protetiva dos direitos dos consumidores acontece em situações individualizadas (por exemplo: envolvendo contratos firmados pela internet), como uma publicidade abusiva que chega via aparelho celular, a existência de identificação da operadora de telefonia tem facilitado a tomada de medidas judiciais eficientes. Todavia, quando tudo ocorre somente na web, sem um contrato vinculando um fornecedora ao consumidor, o mesmo raramente acontece. Principalmente tratando-se da internet, devido a novidade e a forma complicada de controle e suas implicações, nem sempre as ações de marketing e publicidade respeitam o que prevê a legislação e se revela adequado para a sociedade. Parece existir uma impotência dos poderes estatais (e das autoridades) em evitar ilícitos praticados no meio virtual, seja pela concepção de que nesse contexto seria inviável fazer restrições, seja pela idéia equivocada de que impor limites feriria a liberdade que deve ser assegurada nessa área para o bem da sociedade.
Mesmo que se respeite essa forma de pensamento, tal não justifica que se ignore quando estão acontecendo infrações à normas de ordem pública e interesse social como o CDC. O fato é que as empresas compreenderam que através da internet, principalmente pela via dos canais de relacionamento como YouTube, Twitter, Facebook, Orkut, Flickr, Blip.fm, Drimio e Last.fm, conseguem se relacionar com os consumidores de seus produtos ou serviços. Por conta disso, muitas delas criaram departamentos de marketing e contrataram profissionais dedicados em tempo integral, a monitorar e atuar na internet em favor da marca ou da imagem dos produtos ou serviços da empresa. A respeito dessa estratégia de mercado, uma pesquisa da Universidade de Duke, nos Estados Unidos, largamente divulgada na imprensa (exemplo: Revista Veja n.º 2158, de 31/3/2010), revelou que um número enorme de empresas gasta em torno de 10% de sua verba de marketing apenas em ações na internet. Tudo seria normal se todas essas empresas utilizassem esse canal como uma espécie de serviço de atendimento ao consumidor (SAC, ouvidoria ou “fale conosco”), pela qual recebessem as reclamações e sugestões dos consumidores e após tomadas as providências, retornassem o contato com a resposta. Ou mesmo se utilizassem esse meio para comunicar mensagens que não transgridem o previsto na legislação. O problema é que, sabedores o quanto as pessoas são influenciáveis em suas decisões de consumo, esse sistema de relacionamento está sendo usado de forma anti-ética e ilegal: – a) seja através da inserção de falsos comentários positivos postados pelos profissionais de marketing da própria empresa, forma de tentar a manipulação do pensamento das pessoas que acessam esses conteúdos, as quai são levadas a acreditar que o produto ou serviço tem realmente um ótimo reconhecimento popular; – b) seja, considerando que a internet que funciona 24 horas e aceita de tudo, como maneira estratégica de burlar as restrições legais de horário para a veiculação das publicidades de tabaco, bebidas alcoólicas, medicamentos e outros produtos.
Não há dúvida, então que esse tipo de descumprimento à legislação, por evidente, não pode ser permitido ou tolerado. Quando se trata de publicidade na internet, mesmo não se podendo saber o autor, por certo se pode identificar quem é beneficiário e leva vantagem com aquilo que está postado. Note-se que quando existe algum conteúdo pornográfico, mediante ordem judicial, é possível impor-se ao provedor retirá-lo da página. Assim também deve ser com relação a esse material publicitário que se revele falso (no caso das opiniões positivas criadas pelos profissionais da própria empresa), bem como, tudo aquilo que se configure em publicidade enganosa ou abusiva e desrespeitadora do previsto na legislação. Nesses casos a responsabilização do fornecedor deve ser inexorável, podendo alcançar o provedor caso ele colabore para que o ilícito aconteça. Não pode haver território real ou virtual que a lei não alcance ou não exista dever de respeito e cumprimento a ela.
Oscar Ivan Prux é advogado, economista, professor, especialista em teoria econômica, mestre e doutor em direito. Diretor do Brasilcon para o Paraná.